quinta-feira, abril 28, 2005

13-4-2000

António Camões Sobral - "Fado e Lundum"
(Texto extraído da Internet)

São desconhecidas as verdadeiras origens do Fado. A própria designação "Fado de Coimbra" não tem sido nada pacífica. Entre as múltiplas e diferentes opiniões as origens do Fado, muito há a dizer, pois cada autor / historiador faz uma perspectiva não só baseada na recolha de dados, mas também na sua própria opinião, originando uma grande variedade de suposições. A Enciclopédia Luso Brasileira fala-nos do Fado como pertencente à canção popular portuguesa, tardiamente nascido e gerado fora de Portugal, definindo três períodos de aparecimento e evolução musical deste género de música:
- No primeiro período, dá-se o aparecimento do Fado de Lisboa (a partir de 1822). Na transição do Lundum para o Fado, a dança continua a ter maior importância.
- No segundo período (a partir de 1840), o canto supera a dança, sendo associado à valorização da guitarra, em substituição da viola.
- No terceiro período (a partir de 1888), o Fado já é totalmente divulgado, passando a ser aceite pelas classes sociais. A sua divulgação chega a Coimbra através dos estudantes da Universidade. Segundo Pinto de Carvalho no seu livro "A História do Fado", até 1840, apenas existia um tipo de canção entoada pelos marinheiros, a qual era cantada à proa das embarcações. A partir de 1840, começou a aparecer nas ruas de Lisboa.
§ Primeira "origem": "o Lundum trazido para Portugal pelos marinheiros" Alberto Sousa Lamy em "Academia de Coimbra", já pressupõe duas origens para o Fado de Coimbra: Uma delas seria baseada nas melodias importadas pelos estudantes brasileiros que vieram, a partir de 1860, estudar para a Universidade de Coimbra, pelo que, o Fado de Coimbra teria aparecido pela primeira vez nesta cidade, na récita de despedida do ano lectivo de 1900-1901.
§ Segunda "origem": "as melodias trazidas pelos estudantes brasileiros". A outra derivaria da vinda de estudantes portugueses, provenientes de Lisboa, os quais depois de terem convivido com os estudantes brasileiros trouxeram as canções e melodias para Coimbra. Já com os estudantes desta cidade, teve a possibilidade de se individualizar e diferenciar em Coimbra.
§ Terceira "origem": "a canção teria sido trazida por estudantes provenientes de Lisboa, para Coimbra". Existe também uma remota possibilidade de a origem do Fado de Coimbra ter evoluído a partir da "Modinha", género sentimental que teve um grande cultor no Padre José Maurício (1752 / 1815), professor da cadeira de Música da Universidade de Coimbra que, trocando o piano pela guitarra, e os salões pelas ruas em noite de luar, simplificou o género musical virilizando-o na voz masculina.
§ Quarta "origem": "a Modinha e o papel do padre José Maurício". Armando Simões, na sua obra "A Guitarra - Bosquejo Histórico", envereda por outras e diferentes origens, quando afirma que "... na invasão árabe, no século VIII, vê-se uma nova hipótese da génese do Fado na natural dolência dos cantos mouros, na suavidade dos seus romances e na cadência das suas lengas-lengas ..."
§ Quinta "origem": "a influência das melodias Árabes ou Mouras no Fado" Ainda nesta obra encontra-se uma outra influência, a Africana. Junto com os escravos africanos, nomeadamente angolanos, que foram levados para o Brasil, foram também algumas manifestações culturais próprias, e entre elas, o "Batuque" e o "Calundum", integrando-se com muita facilidade no conjunto das danças locais brasileiras. Foi no Brasil que se transformou em "Lundum" e "Fado", sendo já com estes novos vocábulos que surgiu em Portugal, no qual viria a ser conhecido simplesmente por "Fado", vindo a desenvolver-se no nosso país, a partir de meados do século XIX.
§ Sexta "origem": "a influência africana dos escravos enviados para o Brasil". Também um outro autor - Manuel de Sousa Pinto - concorda com esta "sexta origem, confirmando e documentando, na sua obra "O Lundum, avô do Fado", que não só a melodia do Lundum mas a própria designação de Fado, na sua aplicação coreográfica, é de origem brasileira. Este autor ainda acrescenta que um musicólogo brasileiro, Mário de Andrade, provou com factos e datas, a origem brasileira do Fado, na sua obra "Pequena História da Música" (S. Paulo, 1942). Assim, o Lundum chegou a Portugal através de marinheiros, que o teriam introduzido, pouco a pouco, nos bairros típicos da cidade de Lisboa. ( A suportar esta hipótese está o facto de que as primeiras músicas dentro do género estavam de ligadas não só ao mar como às terras para lá daquele, onde habitavam os escravos. Veja-se o exemplo de uma das músicas cantadas pela Amália, chamada "O Barco Negro", da autoria de Caco Velho citado há dias na lista eque fala precisamente de uma sanzala.) O Território português limitar-se-ía assim, a receber o Fado, especialmente nas cidades de Lisboa e Coimbra, chegando em geral por via estudantil (de brasileiros). Em Lisboa, a canção foi-se desenvolvendo pelas vielas e lupanares, e daí conseguiu alcançar fama, ascendendo às casas de família ou salões aristocratas, sendo cada vez mais aceite pelas senhoras e damas, que passaram a dançá-lo e dedilhá-lo, em substituição da "Modinha". Em Coimbra, nas serenatas ou nas reuniões académicas, o Fado adaptou-se nas banzas (violas) estudantis num estilo local e mais romântico, enriquecendo-se em novas variações, sendo a partir daqui espalhado como canto, toques e danças populares. Com o decorrer do tempo, as modificações foram-se dando, levando o Fado, em Coimbra, a ser exclusivamente cantado e tocado pelos estudantes, que lhe deram características próprias de lirismo e romantismo. Alguns investigadores ainda afirmam que as origens do fado estarão ligadas à Idade Média, nas cantigas de amor e na trova provençal.
§ Sétima "origem": "as Cantigas de Amor e a Trova Provençal da Idade Média". Na obra "Fado - História de Portugal", Mascarenhas Barreto concorda com esta última origem, ao afirmar-se que "... De origem provençal, o Fado sofreu a influência melodico-poética árabe e, ao longo dos séculos, ganhou características mais definidas, tornando-se numa maneira de cantar que exprime, genericamente, um estado psíquico de nostalgia. (...) O casamento dos príncipes trazia para Portugal a sua corte de cavaleiros e trovadores. Assim se formou, entre os portugueses, a escola de poesia Provençal que veio fortalecer os primeiros passos de uma Literatura Nacional. (...) A "Chansó" era o mais nobre género de canção, própria de cavaleiros fidalgos; O "Sirvente" era cantado por soldados; Os "Contenses" eram controvérsias travadas entre dois trovadores; O "Plang" era uma canção lamentosa: "Cantiga de Amigo" cantada de mulher para homem, e "Cantiga de Amor", cantada de homem para mulher; e ainda outra forma de poesia, de expressão satírica: "Cantiga de Escárnio ou Mal Dizer". (...) Oito séculos passados, o Fado actual conserva ainda antigas características. O Fado dos Estudantes de Coimbra, como expressão do sentimento masculino, manteve o mesmo espírito das Cantigas de Amor. No Fado de Lisboa, parece predominar a forma das Cantigas de Amigo, expressão feminina, em que a mulher manifesta o seu sentir." Diferenças entre fados Em Lisboa e no Porto encontramos o fado cantado essencialmente na parte mais antiga da cidade, em tabernas ou casas de fado, pequenas, antigas, de paredes frias, decoradas com os símbolos daquela forma de canção nessas duas cidades: o xaile negro e a guitarra portuguesa. O homem que canta o fado fá-lo normalmente de fato escuro. Canta os seus amores, a sua cidade, as misérias da vida, critica a sociedade, os políticos. Fala muitas vezes da toirada, dos cavalos, de tempos passados e pessoas já idas, e fala, quase sempre, de saudade. Mas de onde vem a palavra Fado? Do latim fatum, que significa destino, o destino inexorável e que nada pode mudar. É por isso que o fado é normalmente tão melancólico, tão triste: porque canta a parte do destino que foi contra os desejos do seu dono. A mulher canta sempre de negro, normalmente de xaile aos ombros, com uma voz lamentosa. Canta, tal como o homem, o amor e a morte: a morte que vem da perda do amor, o amor perdido para a morte... Este modo de cantar espelha, de certo modo, o espírito do povo português: a crença no destino como algo que nos subjuga e ao qual não podemos escapar, o domínio da alma e do coração sobre a razão, que levam a actos de paixão e desespero, e que se traduzem naquele lamento tão negro mas tão belo. E em Coimbra? Em Coimbra temos o mesmo estilo triste, mas com uma motivação totalmente diferente. Tal como já se disse, o ex-libris de Coimbra são os estudantes. Aos poucos, jovens que iam de Lisboa e do Porto para ali, foram levando as suas guitarras e aquele estilo novo de tocar, que caiu nas boas graças da população estudantil. O que poderia ser melhor para impressionar as suas amadas, do que cantaram a sua angústia por não as terem, depositando-lhes nas mãos um coração cheio de penas que só elas poderiam aliviar? E que outra música poderia explicar melhor o desgosto de abandonar os melhores anos da mocidade, a vida boémia de um estudante, do que o Fado? Foi assim que ele surgiu como a música oficial das despedidas de cada ano, e dos estudantes em geral. Em Portugal é costume os estudantes universitários trajarem com um fato e uma capa grossa, negros, e é assim que se canta o fado em Coimbra. Pode parecer um pouco soturno, uma multidão de negro ouvindo uma serenata de Fado de Coimbra, mas na verdade é muito belo. No silêncio da noite - pois as serenatas são sempre à noite - ecoam as guitarras e as vozes profundas, num lamento que se estende por sobre a multidão de capas negras, ou que se esgueira pelas esquinas das ruas estreitas e se entranha nas pedras centenárias.

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