MENINA DOS OLHOS TRISTES
(versão fonográfica de José Afonso)
Música: José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos, dito José Afonso (1929-1987)
Letra: Reinaldo Edgar de Azevedo e Silva Ferreira, dito Reinaldo Fereira ((1922-1959)
Incipit: Menina dos Olhos Tristes
Origem: Algarve (Faro)
Data: ca. 1962-1963
(versão fonográfica de José Afonso)
Música: José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos, dito José Afonso (1929-1987)
Letra: Reinaldo Edgar de Azevedo e Silva Ferreira, dito Reinaldo Fereira ((1922-1959)
Incipit: Menina dos Olhos Tristes
Origem: Algarve (Faro)
Data: ca. 1962-1963
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Menina dos Olhos Tristes,
O que tanto a faz chorar?
-O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Senhora de olhos cansados,
Porque a fatiga o tear?
-O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum-Hum; Hum-Hum-Hum-Hum
Hum-Hum-Hum; Hum-Hum-Hum-Hum
Vamos, senhor pensativo,
Olhe o cachimbo a apagar,
-O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Anda bem triste um amigo,
Uma carta o fez chorar.
-O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum, etc.
A Lua que é viajante,
É que nos pode informar
-O soldadinho já volta
Do outro lado do mar.
O soldadinho já volta,
Está quase mesmo a chegar.
Vem numa caixa de pinho.
Desta vez o soldadinho
Nunca mais se faz ao mar.
Hum-Hum, etc.
Cantam-se as quadras duas a duas, como se fossem oitavas, sem qualquer repetição de versos ou de dísticos. Remata-se cada grupo com um trauteio (Hum-Hum) que serve de coro, a duas vozes. Segue-se o mesmo esquema no grupo final, com a 5ª estrofe (quadra) e a 6ª que é uma quintilha.
Canção musical de tipo estrófico, ilustrativa do Movimento da Balada, em compasso 6/8 e tom de Mi Menor, de melodia muito sentimental, como que a ilustrar o choro dos mortos regressados das frentes de combate em Angola, Guiné e Moçambique durante a Guerra Colonial (1961-1974). A 6ª estrofe ("O soldadinho já volta") enforma mesmo de alguma morbidez na vocalização de José Afonso. O coro adquire uma coloração funérea.
José Afonso gravou esta canção pela primeira vez em 1969, com um notável arranjo e acompanhamento de Rui Pato na viola nylon: EP "Menina dos Olhos Tristes", Porto, Orfeu, STAT-803, ano de 1969. Remasterização no CD "José Afonso. De Capa e Batina", Lisboa, Movieplay JA 8000, ano de 1996, Faixa nº 9. O livreto transcreve o poema, mas não exactamente como José Afonso o canta. José Afonso segue uma dicção escorreita, apenas adulterando no 2º verso da 3ª quadra "Olhe" para "Ólhó", proeza notável num cantor que raramente respeitava a traça original dos textos alheios.
Esta canção surge primeiramente fonografada por Adriano Correia de Oliveira, acompanhado na viola nylon por Rui Pato, em 1964. Adriano não respeita a sequência das estrofes, adultera a quintilha final e segue um trauteio diferente do adoptado por José Afonso. Altera a ordem das coplas, cantando a 3ª como se fosse a 2ª. Consultado sobre estas discrepâncias, Rui Pato sugere que a versão Adriano se encontra mais próxima da composição primitiva. Postas as coisas nestes termos, admitimos que José Afonso tenha corrigido e aperfeiçoado a sua composição com vista a uma versão definitiva que é a de 1969, tal qual a transcrevemos. Importa anotar que entre 1960-1964 Adriano gravou diversas obras ainda em fase de elaboração (de José Afonso e de Machado Soares), cujas versões ultimadas divergem das açodadas incursões de Adriano. Exemplificam estas situações peças como Canção Vai e Vem (cf. diferenças com Balada da Esperança), Senhora Partem Tão tristes (cf. registo de Fernando Gomes Alves), ou até mesmo adulterações intencionais de obras de autor como a Canção dos Malmequeres (de António Menano), passada a Balada do Estudante. Como é sabido, José Afonso radicou-se em Moçambique nos finais de Setembro de 1964, e talvez por isso mesmo não tenha então gravado a canção de sua autoria, abrindo assim a porta à versão Adriano.
Transcrevemos seguidamente o texto cantado por Adriano Correia de Oliveira:
Menina dos olhos tristes,
O que tanto a faz chorar?
O soldainho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum-Hum; Hum-.Hum; Hum-Hum
Vamos, senhor pensativo,
Olhe o cachimbo a apagar.
O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum, etc.
Senhora de olhos cansados
Porque a fatiga o tear?
O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum, etc.
Anda bem triste um amigo,
Uma carta o fez chorar.
O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum, etc.
A lua que é viajante,
É que nos pode informar.
O soldadinho "já volta"
"Está quase mesmo a chegar".
Hum-Hum, etc.
"Vem numa caixa de pinho.
Nunca mais se faz ao mar.
Do outro lado do mar.
Desta vez o soldadinho
Nunca mais se faz ao mar".
Hum-Hum, etc.
Coteje-se a letra interpretada por Adriano com a transcrição presente em Mário Correia, "Adriano Correia de Oliveira. Vida e Obra", Coimbra, Centelha, 1987, pág. 103, pois na referida biografia consta apenas o poema integral original. Primeiro registo vinil presente no EP "Menina dos Olhos Tristes", Porto, Orfeu, EP-ATEP 6275, ano de 1964, com arranjo e acompanhamento de Rui Pato na viola de cordas de nylon. Fez-se outra edição no LP "Adriano Correia de Oliveira", LP-SB, ano de 1964; remasterização no duplo Lp vinil "Memória de Adriano Correia de Oliveira", Porto, Orfeu/Riso e Ritmo Discos, ano de 1982, Disco 1, Face B, faixa 5. Na referida reedição constam as autorias correctas mas omitem-se o ano da gravação e o instrumentista. Remasterização compact disc na antologia "Adriano. Obra Completa", Lisboa, Movieplay/Orfeu 35.003, ano de 1994 (CD "A Noite dos Poetas", Orfeu 35.010, 1994, faixa 1), cuja coordenação esteva a cargo de José Niza. Neste caso omite-se a data da primeira gravação, mas identifica-se Rui Pato como instrumentista e arranjista.
Quanto ao autor da letra, Reinaldo Ferreira, ou melhor, Reinaldo Edgar de Azevedo e Silva Ferreira, nasceu em Barcelona pelos idos de 20 de Março de 1922. Veio a falecer de cancro pulmonar em Lourenço Marques, Moçambique, em 30 de Junho de 1959. Era filho do famoso jornalista e romancista policial "Repórter X". Radicou-se em Lourenço Marques (Maputo) em 1941, cidade onde terminou os estudos liceais. Trabalhou como funcionário público e animador de programas radiofónicos na Rádio Clube de Moçambique. Adoeceu em 1958 e após tentativa infrutífera de tratamente na África do Sul, faleceu em 1959. Era de sua autoria o delicioso e muito conservador texto "Uma casa portuguesa", gravado em disco por Amália Rodrigues. Autor de poemas belíssimos, a obra de Ferreira, "Poemas", foi editada em 1960 na cidade de Lourenço Marques, em 1962 na Portugália (com prefácio de José Régio) e em 1998 na Vega. Ignoramos em que data Ferreira compôs a sua linda e triste Menina, sendo de aceitar que tivesse por horizonte a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) mas nunca a Guerra Colonial que não chegou a conhecer. Também não sabemos quando e em que circunstâncias José Afonso acedeu ao poema. Pode ter conhecido uma versão em manuscrito ou de página de jornal nas suas idas a Moçambique em 1949 (Orfeon), 1956 (TAUC), 1958 (TAUC a Angola) e 1960 (Orfeon a Angola). O mais certo é que tenha adquirido a edição lisboeta de 1962, ligada ao nome de José Régio. A Guerra Colonial tinha rebentado no ano anterior em Luanda (04/02/1961) e estava na memória a Operação Dulcineia (assalto ao Santa Maria, 21/01/1961).
Esta canção de José Afonso não mereceu qualquer trabalho de regravação após 1974 junto das vozes juvenis e respectivas formações activas em Coimbra. Eis um José Afonso timidamente recuperado e ternamente "perdoado" pelas alas conservantistas da CC, o mesmo não se podendo afirmar quanto à herança de Adriano. Aí a música é outra...
Para saber mais sobre o poeta Reinaldo Ferreira consulte htt://alfarrabio.um.geira.pt/reinaldo/index.html
Transcrição musical de Octávio Sérgio; pesquisa documental e texto de António M. Nunes
O que tanto a faz chorar?
-O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Senhora de olhos cansados,
Porque a fatiga o tear?
-O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum-Hum; Hum-Hum-Hum-Hum
Hum-Hum-Hum; Hum-Hum-Hum-Hum
Vamos, senhor pensativo,
Olhe o cachimbo a apagar,
-O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Anda bem triste um amigo,
Uma carta o fez chorar.
-O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum, etc.
A Lua que é viajante,
É que nos pode informar
-O soldadinho já volta
Do outro lado do mar.
O soldadinho já volta,
Está quase mesmo a chegar.
Vem numa caixa de pinho.
Desta vez o soldadinho
Nunca mais se faz ao mar.
Hum-Hum, etc.
Cantam-se as quadras duas a duas, como se fossem oitavas, sem qualquer repetição de versos ou de dísticos. Remata-se cada grupo com um trauteio (Hum-Hum) que serve de coro, a duas vozes. Segue-se o mesmo esquema no grupo final, com a 5ª estrofe (quadra) e a 6ª que é uma quintilha.
Canção musical de tipo estrófico, ilustrativa do Movimento da Balada, em compasso 6/8 e tom de Mi Menor, de melodia muito sentimental, como que a ilustrar o choro dos mortos regressados das frentes de combate em Angola, Guiné e Moçambique durante a Guerra Colonial (1961-1974). A 6ª estrofe ("O soldadinho já volta") enforma mesmo de alguma morbidez na vocalização de José Afonso. O coro adquire uma coloração funérea.
José Afonso gravou esta canção pela primeira vez em 1969, com um notável arranjo e acompanhamento de Rui Pato na viola nylon: EP "Menina dos Olhos Tristes", Porto, Orfeu, STAT-803, ano de 1969. Remasterização no CD "José Afonso. De Capa e Batina", Lisboa, Movieplay JA 8000, ano de 1996, Faixa nº 9. O livreto transcreve o poema, mas não exactamente como José Afonso o canta. José Afonso segue uma dicção escorreita, apenas adulterando no 2º verso da 3ª quadra "Olhe" para "Ólhó", proeza notável num cantor que raramente respeitava a traça original dos textos alheios.
Esta canção surge primeiramente fonografada por Adriano Correia de Oliveira, acompanhado na viola nylon por Rui Pato, em 1964. Adriano não respeita a sequência das estrofes, adultera a quintilha final e segue um trauteio diferente do adoptado por José Afonso. Altera a ordem das coplas, cantando a 3ª como se fosse a 2ª. Consultado sobre estas discrepâncias, Rui Pato sugere que a versão Adriano se encontra mais próxima da composição primitiva. Postas as coisas nestes termos, admitimos que José Afonso tenha corrigido e aperfeiçoado a sua composição com vista a uma versão definitiva que é a de 1969, tal qual a transcrevemos. Importa anotar que entre 1960-1964 Adriano gravou diversas obras ainda em fase de elaboração (de José Afonso e de Machado Soares), cujas versões ultimadas divergem das açodadas incursões de Adriano. Exemplificam estas situações peças como Canção Vai e Vem (cf. diferenças com Balada da Esperança), Senhora Partem Tão tristes (cf. registo de Fernando Gomes Alves), ou até mesmo adulterações intencionais de obras de autor como a Canção dos Malmequeres (de António Menano), passada a Balada do Estudante. Como é sabido, José Afonso radicou-se em Moçambique nos finais de Setembro de 1964, e talvez por isso mesmo não tenha então gravado a canção de sua autoria, abrindo assim a porta à versão Adriano.
Transcrevemos seguidamente o texto cantado por Adriano Correia de Oliveira:
Menina dos olhos tristes,
O que tanto a faz chorar?
O soldainho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum-Hum; Hum-.Hum; Hum-Hum
Vamos, senhor pensativo,
Olhe o cachimbo a apagar.
O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum, etc.
Senhora de olhos cansados
Porque a fatiga o tear?
O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum, etc.
Anda bem triste um amigo,
Uma carta o fez chorar.
O soldadinho não volta
Do outro lado do mar.
Hum-Hum, etc.
A lua que é viajante,
É que nos pode informar.
O soldadinho "já volta"
"Está quase mesmo a chegar".
Hum-Hum, etc.
"Vem numa caixa de pinho.
Nunca mais se faz ao mar.
Do outro lado do mar.
Desta vez o soldadinho
Nunca mais se faz ao mar".
Hum-Hum, etc.
Coteje-se a letra interpretada por Adriano com a transcrição presente em Mário Correia, "Adriano Correia de Oliveira. Vida e Obra", Coimbra, Centelha, 1987, pág. 103, pois na referida biografia consta apenas o poema integral original. Primeiro registo vinil presente no EP "Menina dos Olhos Tristes", Porto, Orfeu, EP-ATEP 6275, ano de 1964, com arranjo e acompanhamento de Rui Pato na viola de cordas de nylon. Fez-se outra edição no LP "Adriano Correia de Oliveira", LP-SB, ano de 1964; remasterização no duplo Lp vinil "Memória de Adriano Correia de Oliveira", Porto, Orfeu/Riso e Ritmo Discos, ano de 1982, Disco 1, Face B, faixa 5. Na referida reedição constam as autorias correctas mas omitem-se o ano da gravação e o instrumentista. Remasterização compact disc na antologia "Adriano. Obra Completa", Lisboa, Movieplay/Orfeu 35.003, ano de 1994 (CD "A Noite dos Poetas", Orfeu 35.010, 1994, faixa 1), cuja coordenação esteva a cargo de José Niza. Neste caso omite-se a data da primeira gravação, mas identifica-se Rui Pato como instrumentista e arranjista.
Quanto ao autor da letra, Reinaldo Ferreira, ou melhor, Reinaldo Edgar de Azevedo e Silva Ferreira, nasceu em Barcelona pelos idos de 20 de Março de 1922. Veio a falecer de cancro pulmonar em Lourenço Marques, Moçambique, em 30 de Junho de 1959. Era filho do famoso jornalista e romancista policial "Repórter X". Radicou-se em Lourenço Marques (Maputo) em 1941, cidade onde terminou os estudos liceais. Trabalhou como funcionário público e animador de programas radiofónicos na Rádio Clube de Moçambique. Adoeceu em 1958 e após tentativa infrutífera de tratamente na África do Sul, faleceu em 1959. Era de sua autoria o delicioso e muito conservador texto "Uma casa portuguesa", gravado em disco por Amália Rodrigues. Autor de poemas belíssimos, a obra de Ferreira, "Poemas", foi editada em 1960 na cidade de Lourenço Marques, em 1962 na Portugália (com prefácio de José Régio) e em 1998 na Vega. Ignoramos em que data Ferreira compôs a sua linda e triste Menina, sendo de aceitar que tivesse por horizonte a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) mas nunca a Guerra Colonial que não chegou a conhecer. Também não sabemos quando e em que circunstâncias José Afonso acedeu ao poema. Pode ter conhecido uma versão em manuscrito ou de página de jornal nas suas idas a Moçambique em 1949 (Orfeon), 1956 (TAUC), 1958 (TAUC a Angola) e 1960 (Orfeon a Angola). O mais certo é que tenha adquirido a edição lisboeta de 1962, ligada ao nome de José Régio. A Guerra Colonial tinha rebentado no ano anterior em Luanda (04/02/1961) e estava na memória a Operação Dulcineia (assalto ao Santa Maria, 21/01/1961).
Esta canção de José Afonso não mereceu qualquer trabalho de regravação após 1974 junto das vozes juvenis e respectivas formações activas em Coimbra. Eis um José Afonso timidamente recuperado e ternamente "perdoado" pelas alas conservantistas da CC, o mesmo não se podendo afirmar quanto à herança de Adriano. Aí a música é outra...
Para saber mais sobre o poeta Reinaldo Ferreira consulte htt://alfarrabio.um.geira.pt/reinaldo/index.html
Transcrição musical de Octávio Sérgio; pesquisa documental e texto de António M. Nunes
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