segunda-feira, junho 04, 2007

Um Dia

(Porque a Vida é uma Criança)
Música: Paulo de Sá (1891-1952)
Letra: Maria Luísa de Carvalho Campos
Incipit: Manhã cedo, madrugada
Origem Porto
Data: 1944-1945

Manhã cedo, madrugada
Nevoeiro muito fino
Está toda a terra alarmada
Que acordou o meu menino.

Luz forte, rumor e vida
Meio dia, sol a pino
Está toda a terra entretida
No brincar do meu menino.

Meia noite, luz velada
Segue a vida o seu destino
E fica a terra calada
Porque dorme o meu menino.

Canta-se cada estrofe seguida, apenas se repetindo os dois últimos versos.
Informação complementar:
Composição musical estrófica concebida por Paulo de Sá em meados da década de 1940, premeditadamente pensada para substituir o clássico de Alexandre Rezende. Paulo de Sá (Santa Maria da Feira, 05/03/1891; Porto, 26/04/1952) aproveitou o nascimento de um filho de Maria Luísa Carvalho de Campos, irmã do seu cantor habitual, José Archer de Carvalho, para alinhavar um embalo muito sentimental e romântico, estreado na circunstância pelo próprio José Archer de Carvalho.
Apesar de radicado profissional e familiarmente no Porto, Paulo de Sá não perdia o ensejo de se encontrar com o seu dilecto “padrinho de guitarra” dos anos juvenis de Coimbra, o Juiz Desembargador da Relação de Lisboa Francisco Paulo Menano, a quem ensinou esta sua nova composição.
Ao longo da segunda metade da década de 1950 o médico e cantor Augusto Camacho Vieira conviveu em Lisboa com o velho e recatado guitarrista Francisco Menano. Este possuía diversas guitarras, tocava pianola e era um distinto 2º tenor com tirocínio feito no mítico Orfeon de Joyce (1909-1912). Em 1961 Augusto Camacho Vieira frequentou assiduamente a casa de Francisco Menano em Lisboa e com ele aprendeu a melodia de UM DIA, embora a tenha interpretado com outro título e letra. Na sequência destes convívios viria a ser ensaiado e gravado um disco vinil de 45 rotações com interpretação vocal de Augusto Camacho Vieira, guitarras de António Pinho de Brojo/Francisco Paulo Menano e viola nylon por Fernando Alvim.
Eis a versão gravada por Camacho Vieira:

O MEU MENINO
Música: Paulo de Sá
Letra: 1ª quadra popular; 2ª quadra de autor não identificado
Incipit: O meu menino é d’oiro


O meu menino é d’oiro
D’oiro é o meu menino
Hei-de levá-lo aos anjos
Enquanto for pequenino.

No mundo, quem se julgar
Pobre demais, tendo mãe
É pobre por não contar
Com a riqueza que tem.

Canta-se cada copla seguida e bisam-se os dois últimos dísticos.

Informação complementar:
Embalo gravado por Augusto Camacho Vieira, acompanhado por António Pinho de Brojo/Francisco Paulo Menano (gg) e Fernando Alvim (v), no EP “Fados de Coimbra”, Lisboa, Columbia, SLEM 2094, ano de 1961, com o título modificado para “O Meu Menino” (O meu menino é d’oiro) e letra distinta da original. A 1ª quadra é popular, constando da já então clássica composição de Alexandre Rezende. Quanto à 2ª copla, julgamos que possa ser da autoria de Francisco Menano. O arranjo guitarrístico proposto por António Brojo é pouco feliz, pois tanto a introdução como o separador constituem explícito plágio ao arranjo de Artur Paredes para o tema “Senhora do Almotão e Senhora da Póvoa” (matriz fonográfica Edmundo Bettencourt).
No Museu Académico existe em depósito uma solfa manuscrita desta composição, cujo cabeçalho refere expressamente o nome de Paulo de Sá. O título e a única quadra ali grafada correspondem à primeira parte da gravação efectuada por Camacho Vieira. A pauta comporta menção do estabelecimento portuense de Francisco Guimarães, F. & Cª., Rua do Almada, 130. Este estabelecimento dispunha dos serviços de um maestro que por diversas vezes foi solicitado por Paulo de Sá/José Archer para transcrever a notação musical das composições que Paulo de Sá foi alinhavando ao longo das décadas de 1930/1940.
Como base de trabalho utilizámos a referida solfa manuscrita, com a linha superior destinada ao canto e a inferior à harmonização pianística. No início da solfa figura o "compasso binário de capela", que pode ser interpretado em 4/4, com a melodia em Dó Maior.
Escassamente conhecido através do registo sonoro de Augusto Camacho, e não gozando da popularidade do embalo de Rezende, pode dizer-se que Paulo de Sá ganhou a aposta: a sua cantiga de embalar perfilha-se entre as mais belas do génere conimbricense. Haverá pois que redescobrir a singularidade desta e de outras canções de infância de fábrica masculina, porquanto feitas num século XX em que as demonstrações de afecto ainda não eram consideradas componentes integrantes da imagem convencional da masculinidade.

Adaptação: Octávio Sérgio (2007)
Recolha e textos: José Anjos de Carvalho e António Manuel Nunes
Agradecimentos: Dr. Augusto Camacho Vieira, Sr. José Archer de Carvalho, Dr. Artur Ribeiro (Museu Académico)

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