sábado, maio 13, 2006


As "Mamudas" Posted by Picasa
Maquete de um dos grupos escultóricos evocativos das "artes liberais", da autoria do Mestre da Escola de Belas Artes de Lisboa António Duarte, destinado ao novo edifício da Biblioteca Geral da UC. Documento extraído da obra "15 anos de Obras Públicas. 1932-1947. 1º Volume. Livro de Ouro", Lisboa, Edição do Ministério das Obras Públicas, 1948, pág. 32.
António Duarte segue a estética fascista em voga nos regimes autoritários europeus até finais da Segunda Guerra Mundial, particularmente acutilante nas obras de arte destinadas aos edifícios públicos marcados pelos normativos do "Classicismo Monumental Totalitário". A expressão é do Prof. Doutor António Nuno Rosmaninho Rolo, docente da Universidade de Aveiro, doutorado pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra com uma belíssima tese sobre a Cidade Universitária de Coimbra.
Neste trabalho, António Duarte aproxima-se da estética fascista ensaiada pelo artista Mario Sironi, propondo eugénicos colossos convocados para exprimir a "portucalidade". O resultado é uma espécie de expressionismo violento que toca as raias do primitivismo, hiperbolizando as massas musculares e distorcendo membros que chegam a atingir contornos monstruosos.
As faraónicas esculturas de António Duarte foram instaladas na fachada principal da Biblioteca Geral da UC, um projecto do arquitecto Alberto Pessoa, inaugurado em 29 de Maio de 1956.
Logo se manifestou a graça académica: as Escadas Monumentais foram crismadas de "Avenida da Marmelada"; às gigantescas bolas de pedra que ornam o alto das escadarias chamou-se primeiramente "Os Colhões do Estado Novo", e mais tarde "Os Colhões de D. Dinis" (dada a vizinhança da estátua régia); à Praça da Porta Férrea, embelezada com os vistosos grupos escultóricos de António Duarte, a chacota anónima logo passou a chamar de "Pátio das Mamudas" (Cf. Gonçalo Reis Torgal, "Coimbra. Boémia e saudade", I, pág. 53). Hoje talvez se lhes pudesse atribuir o epíteto de "mamonas assassinas".
O certo é que os opulentos seios de "as mamudas" causaram embaraço ao regime e às autoridades académicas. Instalados os respectivos andaimes do pudor, canteiros contratados desbastaram os seios às estátuas. Na foto da maquete que apresentamos, relativa a 1947, podem ver-se os seios de "as mamudas" ainda por desbastar.
Esta vontade de heroicizar as virtudes do "portuguesismo" por intermédio da estatuária faraónico-monumental parece-nos hoje fruto de uma retórica de Estado tão mais ridícula quanto vamos sabendo pelos relatórios médicos, registos de inspecções militares e dados do registo civil que os portugueses de então eram em geral de estatura baixa e média.
AMNunes

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