O 1º Ministro da Crise de 1907 (Doc. B)
João Ferreira Franco Pinto Castelo Branco (Fundão, 1855; Lisboa, 1929) cursou Direito na UC de 1869-1870 a 1875. Firmemente convencido de que as manifestações académicas conimbricenses tinham origem directa na propaganda republicana, João Franco procurou neutralizar os protestos com mão firme. A instauração de processos disciplinares aos supostos cabecilhas do movimento, o encerramento temporário das aulas e a recusa em atender as pretensões dos manifestantes, transformaram João Franco num dos políticos mais detestados pelos estudantes de Coimbra. Aquilo que os estudantes implicados na Crise Académica de 1969 pensaram do Ministro da Educação José Hermano Saraiva será sempre muito suave quando comparado com o que os académicos da Crise de 1907 disseram de João Franco.
As duras medidas de controlo disciplinar impostas por Franco à UC não fizeram mais do que atiçar a ira dos académicos e concitar as simpatias de outras escolas superiores e liceais. Em 08 de Abril a greve alastrava ao resto do país.
Após o regicídio de 01 de Fevereiro de 1908, prevaleceria de João Franco a imagem de um político inábil, vilão e tortuoso. Um dos fulminados com pena disciplinar de expulsão, o estudante de Direito Alberto Xavier, traçou de Franco a pior das imagens numa rememoração de 1962 ("História da Greve Académica de 1907"). Odiado pelos republicanos, vilipendiado pelos estudantes de Coimbra, mal amado pelos seus corregelionários monárquicos do Partido Regenerador (que o consideravam um traidor de Hintze Ribeiro), Partido Progressista de José Luciano de Castro, carbonários, anarquistas, dissidentes e cortesãos, Franco foi acusado de ser o único responsável pelo regicídio e desgraça da Monarquia Constitucional.
Para a construção da imagem negra de João Franco contribuiram os escritos de Augusto Fushini ("Liquidações Políticas", 1896), Raul Brandão, António Cabral e o já citado Alberto Xavier. Visando humilhar e denegrir ainda mais o contestado estadista, homens como Fushini seguiram o método lombrosiano da sinalização de supostos sinais criminogénos no rosto e antecedentes supostamente indiciadores de degerescência mental. Franco não era um homem particularmente favorecido pela genética, pelo que logo houve quem movido por preconceitos rácicos o acusasse de ter rosto judaico. Em devassa ao passado familiar e juvenil de Franco, os opositores também procuraram valorizar negativamente certas vivências académicas do estadista, como trupes e caçadas a gatos, facécias de onde lhe adviera a alcunha de "João Mata-Gatos". Segundo alardeavam os inimigos de Franco, um aluno que, além de "medíocre" nos estudos, fizera trupes e estufara gatos caçados à força da moca, não poderia dar bom político! A tudo isto, os preconceituosos e palacianos colegas de actividade de João Franco juntavam em tom de mofa o conhecido sotaque regional do detestado político. Franco nunca perdera a acentuação das sibilantes, sendo alvo de troça o seu vincado "xe-xe" beirão. Nos corredores das Cortes, alguns intriguistas despeitados chamavam-lhe verrinosamente o "Xoão".
Caído em desgraça após o regicídio, Franco exilou-se e retornou a Portugal. À data da Revolução de 1910 residia em Sintra, tendo sido preso. Novamente exilado, viveria muito recatado até ao óbito registado em Abril de 1929. Tendo publicado em 1923 "Cartas d'El-Rei D. Carlos I a João Franco" (5ª edição, 1924) foi alvo de manifestações de hostilidade arremessadas de todos os quadrantes: antigos estudantes de Coimbra ligados à Crise Académica de 1907 que se haviam guindado a posições institucionais de relevo, monárquicos que continuavam a responsabilizá-lo pela queda do regime, republicanos que dele faziam bode expiatório do regicídio.
Afinal quem foi este antigo estudante de Coimbra e político liberal?
João Franco nunca foi alvo de um estudo biográfico académico. O seu espólio, doado pelos familiares à Universidade Católica Portuguesa e guardado em Lisboa na Biblioteca João Paulo II, originou em 2005 um programa de comemorações dos 150 anos do nascimento do estadista.
Enquanto não são dados a lume estudos de fundo sobre a vida e obra de João Franco, a internet disponibiliza alguns traços aproximativos:
AMNunes
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