Bloco de Notas (13)
1980 ... Estive a observar a guitarra que Jorge Gomes está a fazer-me – está quase pronta. Pôs-lhe cordas para eu a experimentar. Não me parece má. Não se pode exigir muito, pois é feita com pedaços de madeira que a muito custo conseguiu arranjar. Esta habilidade dele deixa-me bastante surpreendido.
Falei na guitarra ao Artur Paredes e este renovou a oferta de madeira para mandar fazer uma. Mas acrescentou logo que não era para a meter nas mãos de qualquer um! No seguimento da conversa disse-lhe que ele ainda acabaria por dar uma ao filho, já que este andava com problemas de guitarra. Nem pensar nisso, disse logo, nem ao meu pai eu a daria! Quando morrer, que façam delas o que quiserem!
Há dias mostrou-me o armário onde tem guardadas as guitarras. É um guarda-fatos, no quarto a seguir à sala onde se ensaia. Contei mais cinco, todas de óptima construção, “marca Grácio”. Nos gavetões em baixo, tem madeiras já sequíssimas, prontas a serem utilizadas no fabrico de novos instrumentos, e apetrechos vários relacionados com estes.
Quando vai ensaiar, leva um monte de unhas, todas enfiadas num cordel com as pontas atadas. Escolhe então uma para o indicador e outra para o anelar. Não tenho aqui indicação, no bloco, de unha para o polegar. Já não estou bem certo, vinte e cinco anos se passaram desde aí, mas parece-me que no polegar não usava mesmo unha postiça.
Actuei em Leiria, no 10 de Junho, dia de homenagem a Luís de Camões. Foram comigo José Miguel Baptista, Nuno de Carvalho e Durval Moreirinhas. O programa foi transmitido em directo pela televisão. Na ceia que se seguiu, Cidália Moreira cantou acompanhada por Armindo Fernandes e Júlio Gomes. O professor Karma disse-me que tinha apreciado muito a minha garra a tocar. Confessei-lhe que precisava de uma guitarra nova e ofereceu-se logo para meter uma cunha ao Gilberto Grácio, que disse conhecer desde miúdo.
Telefonei a Artur Paredes. Continua com os seus problemas; a filha, agora, depois da operação, tem uma pleuresia. Queixou-se do filho que lhe vai levando as unhas e as cordas da guitarra. Qualquer dia quer tocar e não tem cordas nem unhas, diz ele! Prometi fazer-lhe uma de tartaruga.
Ao tocar hoje a minha “Angústia”, novamente a parte final me fez reviver os tempos em que tocava guitarra clássica e as circunstâncias que me fizeram deixar de a tocar. Aquela parte final está assim para me fazer reviver esses tempos de paz com a música.
Não me tenho referido a muitíssimas actuações que vou tendo, por esse país fora, pois seria fastidioso o seu relato. Só vou referir dez dias passados no Kopus-Bar, em Cascais, na chamada “semana”(?) do fado de Coimbra. Fui com Durval Moreirinhas e Rui Gomes Pereira. Gostei das nossas actuações. Demos uma entrevista a uma rádio em onda curta, num programa para emigrantes. Lembro-me de ter referido a Escola do Fado em Coimbra e o papel altamente relevante exercido por Jorge Gomes. Também foi focada a falta de poetas que escrevam para o “Fado de Coimbra”.
Armando Luís de Carvalho Homem vem hoje a Almada, 22 de Julho, para tocar comigo. É um doido por guitarra, segundo me disse. Anda a doutorar-se em História e, semana sim semana não, vem a Lisboa. Cá fico à espera.
Jorge Gomes mandou-me a guitarra que fez para me oferecer. Tem um bom som, bastante bonito, mas já empenou um pouco. Precisa de outro cavalete pois o tampo cedeu ligeiramente.
Comecei a compor uma nova música; será a minha “opus 20”, não contando com as canções. Já tenho perto de minuto e meio.
Ensaiei duas vezes esta semana com Carvalho Homem. Já me acompanha três músicas: “Variações em Lá” e em “Ré maior” e “Capricho em Lá”. Ensinou-me o “Lá menor” e a “Valsa em Lá” do pai. Ficou de me trazer o “Mi menor”, também do pai.
Três dias depois de ter começado o “opus 20” tenho aqui uma nota a dizer que o acabei e que ainda não tem nome. Qual será? Digo lá que é completamente diferente de tudo que fiz até agora! Está sempre a mudar de tom e uso muito o acorde. Ah! Já estou a ver o que possa ser; será uma peça a que, à falta de nome, chamo “círculo das quintas”.
Telefonei a Artur Paredes. Está ansioso por recomeçar os ensaios. Disse que viu a minha fotografia no jornal. Pensa que não fica bem perante os meus alunos! Acho graça a esta ideia!
Fiquei estupefacto com uma afirmação de Armando Luís de Carvalho Homem durante um ensaio em Almada. Disse-me que nos bordões do “Capricho em Lá” tinha ultrapassado Carlos Paredes! Afirmou que estava bem seguro do que dizia e que ele próprio, num telefonema, o tinha dito a Mário Freitas, guitarrista que toca com o pai.
Já me acompanha o “Ensaio nº 1”. Estou satisfeitíssimo com ele. Nunca falta a um ensaio, está sempre a horas e faz uns acompanhamentos espectaculares; saiu-me a sorte grande! Conhece praticamente tudo que se gravou. Toquei o “Movimento Perpétuo” e acompanhou-o na perfeição. Consegue saber como se tocam na guitarra muitas peças de Carlos Paredes e Jorge Tuna. Estão muito bem tiradas. Só lhe falta execução. Fez introduções engraçadas para “Fados”. Ainda o hei-de ver a tocar guitarra a sério!
1980 ... Estive a observar a guitarra que Jorge Gomes está a fazer-me – está quase pronta. Pôs-lhe cordas para eu a experimentar. Não me parece má. Não se pode exigir muito, pois é feita com pedaços de madeira que a muito custo conseguiu arranjar. Esta habilidade dele deixa-me bastante surpreendido.
Falei na guitarra ao Artur Paredes e este renovou a oferta de madeira para mandar fazer uma. Mas acrescentou logo que não era para a meter nas mãos de qualquer um! No seguimento da conversa disse-lhe que ele ainda acabaria por dar uma ao filho, já que este andava com problemas de guitarra. Nem pensar nisso, disse logo, nem ao meu pai eu a daria! Quando morrer, que façam delas o que quiserem!
Há dias mostrou-me o armário onde tem guardadas as guitarras. É um guarda-fatos, no quarto a seguir à sala onde se ensaia. Contei mais cinco, todas de óptima construção, “marca Grácio”. Nos gavetões em baixo, tem madeiras já sequíssimas, prontas a serem utilizadas no fabrico de novos instrumentos, e apetrechos vários relacionados com estes.
Quando vai ensaiar, leva um monte de unhas, todas enfiadas num cordel com as pontas atadas. Escolhe então uma para o indicador e outra para o anelar. Não tenho aqui indicação, no bloco, de unha para o polegar. Já não estou bem certo, vinte e cinco anos se passaram desde aí, mas parece-me que no polegar não usava mesmo unha postiça.
Actuei em Leiria, no 10 de Junho, dia de homenagem a Luís de Camões. Foram comigo José Miguel Baptista, Nuno de Carvalho e Durval Moreirinhas. O programa foi transmitido em directo pela televisão. Na ceia que se seguiu, Cidália Moreira cantou acompanhada por Armindo Fernandes e Júlio Gomes. O professor Karma disse-me que tinha apreciado muito a minha garra a tocar. Confessei-lhe que precisava de uma guitarra nova e ofereceu-se logo para meter uma cunha ao Gilberto Grácio, que disse conhecer desde miúdo.
Telefonei a Artur Paredes. Continua com os seus problemas; a filha, agora, depois da operação, tem uma pleuresia. Queixou-se do filho que lhe vai levando as unhas e as cordas da guitarra. Qualquer dia quer tocar e não tem cordas nem unhas, diz ele! Prometi fazer-lhe uma de tartaruga.
Ao tocar hoje a minha “Angústia”, novamente a parte final me fez reviver os tempos em que tocava guitarra clássica e as circunstâncias que me fizeram deixar de a tocar. Aquela parte final está assim para me fazer reviver esses tempos de paz com a música.
Não me tenho referido a muitíssimas actuações que vou tendo, por esse país fora, pois seria fastidioso o seu relato. Só vou referir dez dias passados no Kopus-Bar, em Cascais, na chamada “semana”(?) do fado de Coimbra. Fui com Durval Moreirinhas e Rui Gomes Pereira. Gostei das nossas actuações. Demos uma entrevista a uma rádio em onda curta, num programa para emigrantes. Lembro-me de ter referido a Escola do Fado em Coimbra e o papel altamente relevante exercido por Jorge Gomes. Também foi focada a falta de poetas que escrevam para o “Fado de Coimbra”.
Armando Luís de Carvalho Homem vem hoje a Almada, 22 de Julho, para tocar comigo. É um doido por guitarra, segundo me disse. Anda a doutorar-se em História e, semana sim semana não, vem a Lisboa. Cá fico à espera.
Jorge Gomes mandou-me a guitarra que fez para me oferecer. Tem um bom som, bastante bonito, mas já empenou um pouco. Precisa de outro cavalete pois o tampo cedeu ligeiramente.
Comecei a compor uma nova música; será a minha “opus 20”, não contando com as canções. Já tenho perto de minuto e meio.
Ensaiei duas vezes esta semana com Carvalho Homem. Já me acompanha três músicas: “Variações em Lá” e em “Ré maior” e “Capricho em Lá”. Ensinou-me o “Lá menor” e a “Valsa em Lá” do pai. Ficou de me trazer o “Mi menor”, também do pai.
Três dias depois de ter começado o “opus 20” tenho aqui uma nota a dizer que o acabei e que ainda não tem nome. Qual será? Digo lá que é completamente diferente de tudo que fiz até agora! Está sempre a mudar de tom e uso muito o acorde. Ah! Já estou a ver o que possa ser; será uma peça a que, à falta de nome, chamo “círculo das quintas”.
Telefonei a Artur Paredes. Está ansioso por recomeçar os ensaios. Disse que viu a minha fotografia no jornal. Pensa que não fica bem perante os meus alunos! Acho graça a esta ideia!
Fiquei estupefacto com uma afirmação de Armando Luís de Carvalho Homem durante um ensaio em Almada. Disse-me que nos bordões do “Capricho em Lá” tinha ultrapassado Carlos Paredes! Afirmou que estava bem seguro do que dizia e que ele próprio, num telefonema, o tinha dito a Mário Freitas, guitarrista que toca com o pai.
Já me acompanha o “Ensaio nº 1”. Estou satisfeitíssimo com ele. Nunca falta a um ensaio, está sempre a horas e faz uns acompanhamentos espectaculares; saiu-me a sorte grande! Conhece praticamente tudo que se gravou. Toquei o “Movimento Perpétuo” e acompanhou-o na perfeição. Consegue saber como se tocam na guitarra muitas peças de Carlos Paredes e Jorge Tuna. Estão muito bem tiradas. Só lhe falta execução. Fez introduções engraçadas para “Fados”. Ainda o hei-de ver a tocar guitarra a sério!
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