As Grandes Manobras
No meu ano de caloiro coimbrão, das peripécias praxísticas a que fui submetido, sobressai - pela envergadura do número dos envolvidos, e pelo impacto na cidade - a minha participação na prática da praxe de repúblicos, por alturas das Latadas.
Fui mobilizado - para o bom e para o mau - por um elemento da "Real República Baco", cujo hino ainda recordo, tantas vezes o entoei/entoámos, e tão fundo ficou gravado na minha memória! Passo a reproduzir a letra (com música de um Italiano que dedicou uma cançoneta ao Porto, salvo erro o Marino Marini!):
Afonso Henriques
dizia a sua mãe,
na República Baco
é que se bebe bem!
Muito obrigado Porto,
ciao Porto,
muito obrigado!
Relembro ainda uma série de detalhes dessa jornada imorredoira: - à chegada, ao princípio da tarde, fui dirigido, com outros caloiros, para um quarto de um doutor, e à vez, deitados numa das camas, fomos obrigados a embocar um funil por onde era despejada uma apreciável quantidade de tinto! Descarga esta que foi suficiente para nos pôr em alto astral... preparando assim os ânimos para as "Grandes Manobras" que estavam programadas! Explico: na época era muito famoso um filme francês ( com o Gérard Philip) que tinha exactamente este título -"As grandes manobras". O filme foi pois aproveitado para dar o mote e substância às manobras da Baco! Então, albardados como era costume, de casacos às avessas, com estranhos e cómicos barretes e caras mascaradas de carvão; de vassouras ou cabos delas, nas mãos, e pedaços de tábuas de caixotes de sabão a imitar espingardame, fomos para a Praça da República, onde encenámos (já um pouco a cambalear...) uma ardorosa e fragorosa batalha, com tiros simulados à rapazes: - "Pá, pá, estás morto!". Havia gritos, esgares, correrias, sangue derramado (tinto...), ordens e contra-ordens! Uma barafunda napoleónica, acolitada pelas gargalhadas gerais de uns e outros!
Claro que não faltavam os cavalos de papelão, os 'cruzes vermelhas' com os palhinhas respectivos, para aliviar a sede e o sofrimento das hostes em confronto!!! Enfim, uma delícia de garotice, que divertiu a malta e a futricada, com a inesperada maluqueira que livremente presenciava! Tudo sob as ordens de uma equipa competentíssima de 'oficiais', que íam distribuindo a soldadesca, de modo a acabar com o IN...
Havia, evidentemente, a crítica ao regime ditatorial da Salazaresca matilha: tudo isto era feito para acabar com o jugo do general Antonini, que era representado à...Botas. Mas, o certo é que se não registou nenhuma intervenção policial ou pidesca... E no final das movimentações, os exércitos recolheram às instalações da RR Baco, onde terminou o que se tinha começado bem cedo: e a celebração acabou numa bebedeira generalizada, que deu muito que rir e...vomitar!
Do Blog de José Paracana (artenosatos).
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