quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Cancioneiro "César das Neves" (III)
Do volume III, editado em 1898, constam mais de trinta espécimes, nem sempre reportados a Coimbra de forma explícita. Conforme já se referiu, César das Neves não é suficientemente claro quanto à origem das recolhas. Nalguns casos não saberia da proveniência, noutros os colaboradores ter-lhe-ão omitido as informações complementares. Um dado muito notório neste cancioneiro publicado em plena efervescência do nacionalismo é a frouxa afirmação/reinvindicação da territorialidade dos espécimes. Muitos dos fados no estilo de Lisboa, supostamente apenas conhecidos em Lisboa e em Coimbra à época da feitura do cancioneiro, estavam sobejamente popularizados no tecido regional. As legendas são assaz elucidativas, referindo expressamente Cascais, Évora, Avanca, Porto ou Cinfães. Apesar de o cancioneiro mencionar composições de origem territorializada, as anotações predominantes enfatizam a trans-territorialidade das recolhas.
Em bom rigor, o cariz de fronteiras movediças da música popular ou popularizada já havia sido posto em destaque na década de 1850 por João António Ribas. Nas recolhas de Ribas, o "Manoel Tão Lindas Moças" era referido como moda típica de São Martinho de Dume (Braga). Cerca de 40 anos mais tarde, César das Neves frisa que além do Minho, "Manoel" era uma canção popularizada no Porto. O que César das Neves não sabia era que mais ou menos na mesma altura o "Manoel" era vulgaríssimo em Coimbra, a tal ponto que inspirou uma frase poética a António Nobre na célebre "Carta a Manuel" (Coimbra, 1888 e ss.).
Mais curioso ainda é o exemplo configurado pela "Tricana d'Aldeia". Ribas, na década de 1850 dá-a como cantiga tradicional de Vila Real, quando a sua fábrica era coimbrã. Quanto tempo teria decorrido era a produção conimbricense, a recepção e a tradicionalização vila-realense? Uma a duas gerações, uma década? Terá João Ribas tido o cuidado de formular a sacramental pergunta aos informantes locais, "isto é uma moda antiga ou é uma moda de fora da terra"? Os informantes reponderiam de boamente "o meu avô diz que isso já vinha do tempo do pai dele", ou "foi um almocreve que por aqui passou vai para meia dúzia de anos e trouxe isto..." O antigo estudante de Coimbra, Dr. António Moniz Corte-Real fez esta mesma pergunta na Primavera de 1842 em Angra do Heroísmo e obteve uma resposta consistente no que respeita à distrinça popular entre "modas velhas" e "modas novas". Um recolector desprevenido poderia ser ingenuamente levado a supor que uma moda escutada numa determinada localidade era indígena ou antiga. Tomemos como exemplo Antero da Veiga. Numa das rapsódias de modas tradicionais de Coimbra, adpatada à guitarra por Antero da Veiga entre a década de 1890 e o 1º decénio do século XX, ouve-se distintamente um trecho da Rosa Tyrana. Ora, não obstante Antero da Veiga ter tomada a Rosa Tyrana por cantiga tradicional de Coimbra, a melodia surgira na cidade do Porto pela década de 1880. Não tinha mais de 15 a 20 anos de existência quando Antero da Veiga a escutou em Coimbra e não teria chegado a esta cidade da Beira Litoral há mais de dez anos.
Numa primeira síntese de índole provisória sobre esta matéria importará aprofundar o assunto explanado. A reinvindicação da territorialização folclórica parece ser uma consequência da construção do dircurso nacionalista crescentemente afirmado a partir do Ultimato Britânico.
-A Família dos Carecas
-Oh Querida, Gosto de Ti
-O Adro
-Estou Preso
-Negro Melro
-Serenata à Morena
-Adeus Areal do Rio
-Vira ao Norte
-Fado do Sofrimento
-Marcha dos Cavalinhos
-Remar... Remar
-Fado dos Estudantes
-A Barquinha Feiticeira
-Chegadinho
-O Meneio
-Morena
-Fado da Severa
-Caminhos de Ferro
-Oh Meu Bem
-Despedida
-Canção das Morenas
-As Freiras de Santa Clara
-Fado Posthumo do Hylario
-Moleirinho
-Lundum da Figueira
-Flor da Murta
-Senhor Ladrão
-Piriquito
-Ladrão
-O Trevo
-Oh Lidae
-Todos Bebem
-Fado João de Deus
Fonte: Tomo III digitalizado no site da BNL, http://purl.pt.742.
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