A Canção de Coimbra no século XIX
(Ele há teorias... e teorias...)
X.2 - Manuais escolares, por António M. Nunes
Outro ângulo de prospecção, revelador da ordem discursiva em que nas últimas décadas tem vindo a assentar as representações construídas em torno da música tradicional da Beira Litoral, pode detectar-se nos manuais escolares. A música tradicional portuguesa, artificialmente cindida por regiões geográficas, costumava ser abordada nos manuais de Educação Musical do 6º ano do ensino básico.
No manual Educação Musical 6, elaborado pela equipa da editora Constância para o ano lectivo de 1997 (António Coelho/Leonel Guerreiro/Maria José Barros, Alfragide, Constância Editores, 1997), a Beira Litoral é tratada nas páginas 20 a 21, conjuntamente com as Beiras Interiores. Relativamente à Beira Litoral, os autores começam por uma breve caracterização geográfica. A única manifestação musical da Região é indicada expressamente como sendo o “Fado de Coimbra”:
“Em Coimbra vamos encontrar um dos géneros musicais de mais significado na Beira Litoral: o fado de Coimbra. Este tipo de fado é geralmente uma balada triste acompanhada pela guitarra portuguesa de Coimbra e pela viola e está profundamente ligado ao meio estudantil da Universidade desta cidade”.
No fundo da página 20 reproduz-se uma vinheta ilustrada, onde um profissional bem posto na vida recorda nostalgicamente “Ai que saudades do meu tempo de estudante”. Ao lado, um estudante dedilha um violão e canta “saudade”, entronizado sobre uma pilha de livros. Na página 21 é reproduzida uma fotografia de uma serenata monumental na Sé Velha, e ao fundo uma viola toeira.
Quanto aos exemplos musicais transcritos, os alunos são convidados a interpretar Arribá Monte, da Beira Alta, e Senhora do Almurtão, da Beira Baixa. Dentre as várias tarefas solicitadas aos alunos, os autores do manual sugerem, entre outras, “identificar timbres e características da música tradicional da Beira Litoral e das Beiras Interiores”. Cumpre observar o quão difícil será para um aluno de 6º ano identificar timbres característicos de instrumentos que o próprio manual não inclui, a exemplo da flauta travessa, do bandolim, do cavaquinho, do violão, da rabeca, da guitarra toeira, da requinta da guitarra toeira. Os únicos instrumentos postos em destaque são justamente a viola toeira, e a guitarra de Coimbra de tipo Artur Paredes. Quanto a exemplos musicais, os autores passam totalmente ao lado das marchas populares, serenatas futricas, modas satíricas, descantes, danças das Fogueiras de São João, cantigas de trabalho e cânticos religiosos, para apenas citar alguns exemplos.
A CC continua a ser apresentada como “um tipo de fado”, onde um subgénero (a balada) é tomado pelo todo. O elemento identitário dominante, segundo os autores, parece ser a “tristeza”. Afim de exemplificar a narrativa, sugere-se ao docente que faça ouvir Desfolhada (peça do repertório Artur Paredes) e Fado da Despedida (Luís Goes).
Num outro manual da editora Constância, também destinado ao ano lectivo de 1997, a música tradicional da Beira Litoral nem sequer é abordada, embora os autores insiram na amostragem uma peça bem característica do folclore coimbrão, Os Olhos da Marianita (José Godinho/José Morais, Era uma vez a música, Alfragide, Constância, 1997).
Em Educação Musical/6º Ano, da autoria de Armando Costa e Jorge Abel, produzido em 1997 pela Texto Editora, Lda., e supervisionado pelo maestro António Victorino d’Almeida, a música tradicional da Beira Litoral é aflorada sumariamente no Capítulo 10, página 96. A pretexto do Fado, escrevem os autores:
“Existem vários tipos de fado, dependendo dos lugares e dos sentimentos que pretendem exprimir como o amor, a desgraça, a alegria, a saudade e o sofrimento. Cantores como a Severa, Cesária, Hilário, Dr. Dória e Alfredo Marceneiro, foram nomes famosos de tempos passados, que continuam a inspirar os fadistas dos nossos dias”.
Uma vez mais, a CC é apresentada como “um tipo de fado”, identificável pelas temáticas e emoções canónicas (amor, saudade, etc.). José Dória, por extrapolação é convertido em fadista, cantor e guitarrista, não faltando a alusão convencional a Augusto Hilário. E se o Fado de Lisboa foi inicialmente acompanhado à viola (sic), tendo adoptado mais tarde a guitarra, o mesmo terá sucedido em Coimbra, “mantendo-se esta combinação instrumental até aos nossos dias”. Simplificar em demasia, generalizar e extrapolar, afirmar veementemente aquilo que não está devidamente investigado, eis o que se nos oferece dizer em modo de comentário. O mau uso da memória, bem presente nos manuais do 6º Ano de escolaridade do Ensino Básico decorre de preconceitos e omissões que olham a Beira Litoral como espaço musical destituído de interesse.
As primeiras gravações de espécimes da música tradicional de Coimbra foram efectuadas nos alvores do século XX (ca. 1904-1906) por actores de teatro e cantores de opereta como António de Almeida Cruz, Avelino Baptista e Jorge Bastos. Novas gravações tiveram lugar na década de 1920, sempre ligadas a s figuras do mundo do teatro de revista. Seguiram-se o Rancho das Tricanas de Coimbra, respectivamente em 1940 (Armando Leça)[1], 1942[2] e 1947[3]. Decorreria um longo hiato, pontuado por dois registos de Raul Simões na viola toeira (Vira de Coimbra e Estalado), parcialmente colmatado desde 1999 pelo Grupo Folclórico de Coimbra[4], e Grupo Folclórico da Universidade de Coimbra/Casa do Pessoal.
O ano de 2001 não trouxe novidades aos manuais escolares do 6º ano do ensino básico. Em Musicando 6, da autoria de Isabel Carneiro, Manuela Encarnação e Mário Relvas (Editorial O Livro, 2001), o tratamento da música tradicional portuguesa começa na página 88, com um mapa de Portugal pontilhado de bonequinhos. Sobre a Beira Litoral foram encaixados um tocador de viola toeira e um grupo de intérpretes da CC. O mesmo mapa, aparece em grande plano, na página 90, agora com uma fotografia do grupo conimbricense Praxis Nova. O CD Áudio anexo ao manual referido não inclui qualquer amostragem musical popular de Coimbra, ou mesmo dos povoados litorâneos, limitando-se à Balada de Outono de José Afonso. A Balada de Outono é utilizada com o intuito de confrontar o “Fado de Coimbra” com o “Fado de Lisboa” (Op. cit., pág. 95). Ilustram esta página um cistro e guitarras de fabrico rudimentar, sendo que a nº 1, proposta como modelo coimbrão, não é uma guitarra de Coimbra. Além deste, ocorrem no texto da página 95 afirmações demasiado catergóricas, nomeadamente a tão criticada origem britânica do instrumento. No fundo da página, pede-se ao docente que oriente os alunos para duas tarefas, “escuta os géneros de música do Fado de Lisboa e do Fado de Coimbra”, e “conversa acerca das músicas e suas características”.
Panorama deveras confrangedor que não melhora no manual Nova Música no Futuro 6, concebido por Isabel Carneiro e Odete Ferreira (Editorial O Livro, 2001). Aqui, a Beira Litoral resume-se à matéria circunscrita nas páginas 18 e 19, onde se vislumbram a partitura da moda Onde Leva a Moça, uma viola toeira e uma serenata académica em banda desenhada. Mais adiante, na página 37, uma Alvorada em compasso binário (Mi Menor+Sol Maior), sugere a Beira Alta. Não ficaria mal esclarecer os alunos que esta Alvorada é uma variante de A Manhã Vai Rindo, tradicionalíssima canção do último quartel do século XIX que os ranchos de São João de Coimbra cantavam de madrugada em direcção às frescas águas da Fonte do Castanheiro, sita na Lomba da Arregaça.
António Coelho (direcção), “Educação Musical. 6º Ano. Livro do Professor”, Carnaxide, Constância Editores, 2001, dedica a página 25 à Beira Litoral, apresentando fotografias da Viola Toeira e da Guitarra de Coimbra. Elabora breve tentativa de caracterização do “fado de Coimbra” como sendo “uma balada triste” (sic). Não apresenta quaisquer outras modas de Coimbra ou dos povoados da Beira Litoral, propondo para audição “Minha Barca”, e para visualização uma fotografia de uma serenata no pórtico da Sé Velha.
Num outro manual de Maria Helena Cabral e Maria Luísa Andrade, “Fábrica dos sons. Educação Musical 7”, Porto, Porto Editora, 2002, destinado a alunos do 7º ano, no Módulo 1, intitulado “Memórias e Tradições” (op. cit, págs. 8-27), as autoras dividem Portugal em regiões musicais. A Beira Litoral, dilui-se na Beira Alta (op. cit., págs. 13-14). Além de erros factuais, confunde-se a Viola Braguesa ou Viola Ramaldeira com a Viola Toeira (pág. 13), não se abordando a música de Coimbra nem da Beira Litoral[5].
No manual colectivo de Madalena Batista, Rosa Nunes, Rui Machado, “Novo SiMaestro! Educação Musical 5º/6º Anos”, Lisboa, Plátano Editora, 2004, é já na página 136, relativa à Estremadura e Ribatejo que os autores procuram fazer correlações entre fado e fandango, enquanto defendem a velha teoria da origem brasileira com circulação unidireccional Lisboa/Coimbra/Porto. Na página 144, dedicada à Beira Litoral, Beira Baixa e Beira Alta, deparamos com um desenho de uma pseudo-serenata de estudantes, na qual cantor e tocadores seguem um figuro virtual “made in casa de fados”. Relativamente a Coimbra fala-se apenas do “Fado de Coimbra, característico pela sua melancolia” (sic). Procurando ilustrar a Viola Toeira, apresenta-se afinal uma Viola da Terra, do tipo Ilha Terceira. Por seu turno, a Viola Toeira aparece erradamente na página 154, como sendo uma viola da terra. Os temas musicais seleccionados para audição de apoio ao aluno são “Coimbra Menina e Moça” e “Balada da Despedida” (sic).
Na obra de Rosa Maria Torres, “As canções tradicionais portuguesas no ensino da música. Contribuição da metodologia de Zoltán Koály”, Lisboa, Caminho, 1998, Coimbra e Beira Litoral não constam do mapa, pese embora a referência ao Manuel Ceguinho, com base nas recolhas de Pedro Fernandes Tomás. Em Maria do Rosário Sousa e Félix Neto, “A educação intercultural através da música. Contributos para a redução do preconceito”, VNGaia, Gailivro, 2003, Portugal é cindido em regiões musicais, nelas figurando a Beira Litoral (págs. 114-115). A música do povo continua a não existir, tendo sido privilegiado o “Fado de Coimbra”, caracterizado como “uma espécie de canção popular, onde normalmente são exaltadas a saudade pela vida académica e pelos amores, pelas belezas naturais, nomeadamente o rio Mondego, o Choupal, entre outras” (sic). Mais adiante os alunos são orientados para a audição de temas extraídos do Lp gravado em 1981 por José Afonso/Octávio Sérgio. Os formadores pedagógicos enfatizaram junto dos alunos o emprego do modo menor nestas canções e fizeram a sua comparação com as mornas. Quanto a cordofones nada se adianta, destacando-se apenas a presença da Viola Ramaldeira (sic), de novo confundida com a a Viola Toeira. O livro resultou de uma tese de mestrado orientada na FPsicologia da UP por Félix Neto, espelhando bem a cultura light que tem rodeado o negócio dos mestrados desde a década de 1980.
Da leitura demorada dos manuais de educação musical do 2º Ciclo do Ensino Básico, breves comentários nos ocorrem:
-a abordagem da música tradicional portuguesa continua a ser feita a partir de autores e de fontes desactualizadas, com manifesto prejuizo dos alunos e desprezo pelos importantes contributos trazidos por investigadores de que é exemplo a sólida e arejada obra de José Alberto Sardinha;
-por analogia com a prática bairrista cultivada por múltiplos grupos folclóricos, persevera-se na apresentação de modas e canções tidas por característicamente localistas. As recolhas de campo aconselham mais prudência, pois demonstram frequentes vezes que de uma mesma matriz podem existir diversas variantes noutros espaços regionais portugueses;
-continua a dividir-se o país em grandes regiões musicais, no prolongamento de uma “tradição” oitocentista herdada do Cancioneiro de Músicas Populares (1893-1898). Torna-se premente problematizar e matizar conceitos positivistas e demasiado espartilhadores. O século XIX foi o século do folclore e da etnografia. Não é por acaso que a maioria dos grupos folclóricos centram os respectivos repertórios musicais, coreográficos e até os trajos populares no século XIX;
-em termos de rigor e de autenticidade desejáveis, não é pedagógico incutir em alunos de 6º ano a ideia de que as versões do Vira de Coimbra protagonizadas por José Afonso ou Fernando Machado Soares substituem satisfatoriamente a interpretação de um espécime onde ficam ausentes as quadras populares, o bater dos sapatos dos dançadores, as palmas e estalidos de dedos, as vozes do mandador, a diversidade de afinações e timbres da tocata tradicional coimbrã. No Vira de Coimbra há uma padrão melo-rítmico em ternário composto e modo maior, mais ancestral, que se rasga na viola toeira em Ré Maior/Lá de 7ª, com ele coexistindo uma variante valseada que se toca nas posições já indicadas no braço da toeira, seja em rasgado, seja em dedilho, não sendo esta variante anterior à década de 1820.
Desaparecidos os suportes materiais-sonoros nos quais poderia assentar a transmissão de informação sobre o passado, e parcialmente esboroados os mecanismos mentais aptos a tal transmissão, a música tradicional de Coimbra como que deixou de existir no discurso produzido pelas elites, e mais grave do que tudo isso, passou a ser confundida com a CC. Foi pura e simplesmente apagada do “mapa folclórico” português.
Ora, recentrando o problema no seu devido lugar, a CC é apenas um segmento ilustrativo da Música Tradicional de Coimbra, que não toda a Música Tradicional de Coimbra, e muito menos da Beira Litoral em geral. A apropriação do processo narrativo pelas elites de esquerda que a partir da década de 1960 investiram na música de intervenção, com base numa visão instrumentalizada de um folclore utilizável em confronto directo com “o mau folclore” proposto pelo Estado Novo, em vez de clarificar, apenas ajudou a omitir e a confundir.
Na prática, o uso da memória apresenta-se condicionado pelo discurso ideológico decorrente do confronto Sociedade Académica/Sociedade Futrica, vazado no triunfo cultural citadino da primeira sobre a segunda. A partir da década de 1950, a memória musical académica torna-se progressivamente mais selectiva, cabendo aos grupos proeminentes e seus líderes dizer o que era digno de ser preservado e aquilo que deveria ser postergado. O discurso radicaliza-se na década seguinte mercê da invenção de uma nova narrativa apostada no trovadorismo, na morte “do clássico”, na recusa de uma certa tradição. Na reescrita do passado, presente em entrevistas, poemas, capas de discos, a música tradicional de Coimbra é votada ao silêncio.
X.3 - Comunicação social
A imprensa periódica portuguesa também exarou relatos escritos e iconográficos sobre a CC, empregando recorrentemente o léxico específico do Fado de Lisboa. Dada a vastidão da imprensa escrita, não podemos aspirar a mais do que uma breve amostragem de elementos significativos e adequados ao esclarecimento da problemática controvertida.
Momentos verdadeiramente determinantes e instauradores das linhas mestras em que passaram a assentar as imagens exógenas da CC, foram a deslocação da Academia de Coimbra a Lisboa, em 10 de Março de 1895, aquando da sessão de homenagem nacional ao antigo estudante, serenateiro e tocador de viola toeira João de Deus Ramos, a presença de Hilário na homenagem promovida ao mesmo João de Deus Ramos pelo Ateneu Comercial de Lisboa, a que se seguiu, em Abril de 1896, o piedoso relato necrológico do passamento de Augusto Hilário.
Estas notícias apresentam um léxico e esquemas narrativos que se afastam dos relatos inscritos entre 1850 e 1890 na imprensa regional (O Conimbricense, O Tribuno Popular, Correspondência de Coimbra).
À primeira vista, a deslocação da Academia a Lisboa não comporta em si nada de especial. Acontece que Augusto Hilário integrou a embaixada cultural, havendo dúvidas se transportou o seu bandolim de cordas de tripa ou uma guitarra de fabrico portuense, com escala de 17 pontos, boca coberta por rosácea e voluta rematada em flor (fotografia de O Notícias Ilustrado, nº 44, de 14/04/1929, pág. 5).
O primeiro grande momento da homenagem decorreu junto ao prédio onde residia João de Deus, estando o poeta alcandorado na janela e os homenageantes na rua. Hilário logo cativou o público, ajoelhado em plena rua, envergando capa e batina, no improviso de quadras e cantando singelíssima melodia, posicionada algures entre o fado corrido e os descantes populares. O segundo grande momento teve lugar no Teatro D. Maria II. Hilário tocou guitarra e cantou em determinando momento do sarau. Aplaudido em frenético delírio, Hilário lançou a sua guitarra em direcção à plateia.
Os relatos jornalísticos indiciam que o público lisboeta amante do Fado viu em Hilário a reencarnação de Maria Severa Onofriana. Fadista exótico, guitarrista “exímio”, compositor revolucionário, fundador do “Fado de Coimbra”, fadista boémio, invejada voz de “tenor” (sic), são epítetos cerzidores de um mito em construção que se desprendem directa ou indirectamente dos relatos estampados em O Primeiro de Janeiro, nº 61, de 12 de Março de 1895, Diário Illustrado nº 7.888, de Março de 1895, O Século, nº 4.717, de Março de 1895.
A mitificação de Hilário foi operada pelos jornalistas e publicistas, imediatamente após o falecimento do guitarrista-cantor, ocorrida no dia 3 de Abril de 1896. O diagnóstico médico estabelecia “ictirícia grave hipertérmica” como causa mortis. À margem da deificação, não tem faltado quem aluda à cirrose crónica ou à sífilis.
A Academia de Coimbra, coadjuvada pela imprensa portuguesa da época, decretou uma espécie de luto simbólico que ainda hoje paira sobre a CC: Gomes Leal (Serenatas de Hilário no céu, 1896), Francisco Pinheiro Torres (Adeus Senhor Doutor, 1898), Cabral de Almeida, “Ao Hilario”, in A Nova Geração, 1896), A. Campos (O último boémio, Viseu, Tipografia Popular, 1896), jornais como O Primeiro de Janeiro, Jornal de Notícias, O Século, Diário de Notícias, Hylário (Semanário, Viseu, 1896), A Liberdade (Viseu, 1896), Jornal dos Estudantes de Coimbra (1896), O Occidente (1896), Branco e Negro, Ano I, nº2, de 12/04/1896, etc..
No final da década de 1920, as grandes empresas discográficas patrocinaram uma campanha publicitária nas páginas de O Notícias Illustrado, nº 44, de 14 de Abril de 1929. Excluindo o caso pontual da Companhia Francesa do Gramophone, estabelecida em Portugal por 1904 (Lisboa, Largo da Rua do Princípe; Porto, Largo de São Domingos), para a qual gravou Manassés de Lacerda, as grandes editoras fonográficas só vieram a implantar-se solidamente em Lisboa e Porto no ano de 1925. Curava-se então de explorar um mercado virgem e apetecido, numa conjuntura económica bastante favorável, enquadrada pela “era da prosperidade” norte-americana e reconstrução da Europa no após-guerra. Aliás, nas gravações efectuadas entre 1902 e circa 1910, seja por cantores formados no estilo coimbrão Belle Époque, seja por cantores e guitarristas mal identificados (uns activos no Porto, outros em Lisboa, outros no Brasil, mas cultivando aquilo a que hoje designaríamos por estilo coimbrão) não é nada evidente que os temas interpretados sejam fados. Ouçam-se Luís Ferreira, António de Almeida Cruz, Avelino Baptista, Luís Eloy Silva, Luiz Macieira, António Ferreira, Reinaldo Varela, Eugénio de Noronha. A tão invocada “cor fadística” é dada, as mais das vezes pela incorporação da guitarra de acompanhamento em afinação natural, bem como pela aposta nalguma sobrecarga plangencial. Facto curioso, quando em 1902-1904 se concretizam as primeiras gravações conhecidas ao estilo da CC, estas ocorrem em Lisboa, Porto e Brasil, maioritariamente em vozes sem qualquer ligação geo-cultural a Coimbra, facto que só vem confirmar a vasta popularidade e consagração da CC antes do advento hilariano. Seria radicalmente impossível aceitar que os hoje bem conhecidos circuitos de divulgação/consumo da CC e respectivos sectores de produção ancorados na edição de discos e de partituras, tivessem surgido abruptamente entre 1902-1904 a partir de uma herança construída unicamente desde a morte de Augusto Hilário em 1896.
O Notícias Illustrado, de 14 de Abril de 1929, não procedia a qualquer distinção entre Fado de Lisboa e CC, amalgamando cantores e instrumentistas nas rubricas “Cantores de todos os fados”, ou “Cantores e tocadores de fados”. Ali se viam Artur Paredes, Ricardo Borges de Sousa, Armando do Carmo Goes, António Paulo Menano, José Paradela de Oliveira, Augusto Hilário, Edmundo Alberto Bettencourt, Armandinho, Maria Vitória e Adelina Fernandes. Algo de muito semelhante viria a acontecer com a revista Ilustração, nº 100, ano 5, de 16 de Fevereiro de 1930, página 24, ao noticiar que o cantor Alexandre Resende acabara de gravar discos.
Nos vários jornais fundados com a missão específica de propagandear o Fado, Coimbra passou totalmente ao lado de O Fadinho (Setúbal, 1910, dirigido por José Rates), O Fado (Lisboa, 1910, dirigido por Carlos Harrington), O Fadário (Lisboa, 1916, dirigido por Joaquim Ferreira), A Canção Nacional (Lisboa, 1927, dirigido por João Mata). No entanto, O Fado, nº 13, de 9 de Julho de 1910, trazia na primeira página um longo artigo funéreo sobre “Hylario”, assinado por “Luiz d’Athayde”, onde se relembrava a vinda de Hilário a Lisboa e as suas actuações numa serenata junto da Patriarcal e numa patuscada no Dafundo.
A Canção de Portugal. O Fado, publicado em Lisboa entre 1916-1917, sob a direcção de Jorge Gonçalves, tenta convocar Coimbra, com referências explícitas nos nº 2, de 9/04/1916, nº 3, de 16/04/1916, nº 6, de 7/05/1916, nº 13, de 25/06/1916, nº 14, de 2/07/1916. José das Neves Elyseu publica composições da sua lavra nas páginas deste periódico, que nada tinham a ver com fados. E na edição de 2 de Julho de 1916, o estudante de Direito, poeta e compositor Tito Bettencourt assinava um editorial afirmando a sua adesão incondicional à causa do Fado, com recurso a palavras de ordem onde Lisboa e Coimbra pareciam confundir-se.
O Fado, publicado em Lisboa no ano de 1923, e dirigido por Manuel Soares, orientou as suas páginas de forma bastante combativa. No nº 8, edição de 10 de Junho de 1923, o director exorta os estudantes portugueses no sentido de ouvirem a cantarem o fado (considerado “canção nacional do povo”): O fado da alma do Hilário (...), dr. Menano (...): onde está uma capa preta está uma guitarra e um amor!”. No nº 12, de 8/07/1923, Júlio dos Santos Diogo verseja combativamente: São os Costas e os Menanos/Com a garganta de cristal/Que te levantam bem alto/Oh! Fado de Portugal. No nº 17, de 12/08/1923, diversos estudantes de Coimbra “saudam o fado” e louvaminham o jornal pelo teor agressivo dos artigos publicados.
De todos os periódicos recenseados, aquele que mais persistentemente convocou Coimbra foi Guitarra de Portugal (editado entre 1922-1947). A análise dos assuntos tratados por este jornal ao longo de 25 anos ficará para momento mais propício.
Já no período do Estado Novo, O Século Ilustrado, Ano IV, nº 182, de 28 de Junho de 1941, produz uma longa reportagem ilustrada com o título “Coimbra legenda eterna”. As ilustrações, legendas e textos, procuram transmitir uma imagem mitificada, artificial e conservantista de uma Academia livre, feliz e asseptizada de quaisquer problemas. O guitarrista António Carvalhal, simpatizante do regime, prestou-se a servir de modelo fotográfico em poses que iam desde a sala de estudo, à trupe de caloiros, serenata de rua e serenata no pórtico da Sé Velha. Anos volvidos, esta reportagem foi integralmente reproduzida na revista Mundo Gráfico, Ano VI, nº 123, de 30 de Novembro de 1945.
O “documentarismo” proposto como “imagem real” entre 1941 e 1945, ocultava problemas sócio-políticos, por um lado, e por outro, silenciava a crise de cantores, compositores e instrumentistas, experimentada pela CC desde a segunda metade da década anterior.
Por seu turno, a Revista Turismo, nº 56, Janeiro/Fevereiro de 1944, dedicou longas páginas a Coimbra. No artigo Rouxinóis do Mondego, João Seabra evocava o passado e o presente da CC. Tudo teria começado cerca de cinquenta anos antes, com Hilário. A moda das serenatas ter-se-ia divulgado pelo país a partir de Coimbra. O tempo presente cinge-se a 1930, com António Menano, Edmundo Bettencourt, Artur Paredes, Paradela de Oliveira, Roseiro Boavida, Lucas Junot, Francisco da Silveira Morais, Armando Goes, Aduzindo da Providência, Jorge Morais Xabregas. Há em João Seabra uma recusa obstinada em aceitar o fluir da temporalidade. O presente da CC, na óptica da Revista Turismo, não chega a 1944, quedando-se 15 anos antes, numa pretensa idade de oiro.
Em sintonia com as imagens ideais de 1941-1945, estreia-se em Coimbra o filme Capas Negras, no dia 19 de Maio de 1947, do realizador Armando de Miranda. Em Lisboa, era cabeça de cartaz no cinema Condes, desde 10 de Maio. A película sugere um enredo fácil e folclorizante, onde uma empregada de tasca, oriunda de Lisboa, dialoga com estudantes de Coimbra. Maria Lisboa (Amália Rodrigues) é uma rapariga simples, cantadeira do Fado de Lisboa, que acaba seduzida por um estudante (Alberto Ribeiro). No final-feliz, a desonra e o filho ilegítimo saldam-se numa patética absolvição judicial e em casamento.
O protagonista incarna uma imagem convencional e passadista do estudante, com base em condimentos mitificados (boémia, noitadas, tocar guitarra, fazer serenatas, ingerir vinho, tricanas de 1900). Grande sucesso de bilheteira em Portugal, o filme seria exibido no Brasil em 1949. A banda sonora do filme, onde colaborou Ângelo de Araújo, sendo devidamente pago pelas composições que então vendeu, era composta por um total de 15 canções, tendo sido catapultado para os cenários internacionais o tema “Coimbr” (Luís Galhardo e Raul Ferrão). Alguns dos quadros do filme atingem as culminâncias do ridículo (a serenata de janela, a audiência), outras escoram-se em imagens virtuais de um passado extinto (arraial e fogueira crepitante pelo São João, a tricana em trajos de 1880-1900). O enredo amoroso revela os padrões culturais e morais da sociedade portuguesa de então e o tipo de relações oficialmente autorizadas entre sexo masculino e sexo feminino.
Capas Negras originou um movimento de contestação académica que teve o condão de mobilizar tradicionalistas e reviralhistas[6]. Nas críticas vindas a lume, o Via Latina, de 9 de Maio de 1949, sublinhava as tentativas de apropriação e de banalização da CC, criticando Amália Rodrigues e as imagens produzidas pelo cantor Alberto Ribeiro (também, o Diário de Coimbra, de 20/04/1947). Do teor dos artigos de contestação estampados na imprensa da época se infere que a prática da CC era entendida como um discurso simbólico sacralizado, signo identitário dos estudantes e da Academia, sendo inaceitável o uso do trajo académico e o canto por agentes posicionados fora da Sociedade Tradicional Académica.
De um confronto ficcional entre Coimbra e Lisboa, congeminado por Armando de Miranda, resultou um discurso combativo e defensivo que, pela primeira vez, recusava liminarmente as tentativas de instrumentalização da CC, e a par da recusa erguia um esforço de delimitação/distanciação entre os dois géneros.
Não obstante o esforço de distanciação interna, construído na sequência da película Capas Negras, as formas exógenas de descodificação da CC encontaram no filme de 1947 um dispositivo cristalizador. O público português em geral que visionou o filme, os fadista de Lisboa, os espectadores brasileiros, os franceses que escutaram Avril au Portugal, não mais deixaram de identificar Coimbra, os estudantes de Coimbra e a CC com as imagens, sons e letras da banda sonora[7].
O SPN/SNI de António Ferro não deixava de lançar olhares à CC, num registo coincidente com o do filme Capas Negras. Em Outubro de 1937, António Ferro tentara levar a Paris um grupo conimbricense, tendo optado por apresentar na exposição portuguesa um grupo de cantores profissionais da confiança do regime. O SNI guardava nos seus arquivos fotografias destinadas a acções de propaganda oficial e divulgação turística, a exemplo daquelas realizadas em 1953 que foram inscritas na obra de Mascarenhas Barreto e Carlos Branco, “Portugal do Fado”, Lisboa, Guimarães Editores, 1960.
A película Capas Negras e a canção “Coimbra” viveriam sob o signo da maldição académica até 1979, ano em que a propósito do ensaio-recuperação da Queima das Fitas, o Dr. Joaquim Teixeira Santos, figura proeminente da Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra, fez projectar o filme a título de “documento”. Na segunda metade da década de 1980, a Estudantina Universitária de Coimbra passaria a incluir no seu repertório a canção “Coimbra”[8], pouco depois integrada no espectro artístico do Coro dos Antigos Orfeonistas de Coimbra e na Orquestra dos Antigos Tunos. Um fragmento de memória maldita que foi convertido em “boa memória”.
Que mudanças, no crepúsculo do século XX, em relação ao longo processo narrativo escalpelizado? Poucas! Da parte das editoras discográficas persiste o alinhamento editorial Fados de Lisboa/Fados de Coimbra, seja amalgamando e confundido num mesmo suporte géneros artísticos distintos, seja convocando o tradicional “Complexo de Jano”. Nas editoras livreiras, as histórias do Fado demoram em fazer-se com recurso ao chamado Fado de Coimbra. Assim aconteceu ainda em 1999 com a monumental história do Fado, lançada pela Ediclube, onde alinham dois volumes reservados à questão do denominado Fado de Coimbra. Porém, em 2004, em “Para uma História do Fado”, Rui Vieira Nery sacralizando ainda uma origem comum, veio pela primeira vez em cem anos reconhecer que a partir da década de 1920 não se justifica continuar a persistir numa história comum para dois géneros artísticos afinal diferentes (op. cit., págs. 116-117).
Ilustra bem a resistência a qualquer mudança de paradigma o projecto fonográfico Biografia do Fado de Coimbra, lançado no mercado em 2001 pela EMI-Valentim de Carvalho, ali se vislumbrando:
-um título ambicioso e de fundamentação profundamente discutível;
-uma tentativa improcedente de individualização de paradigmas ou micro-identidades no interior da CC que o estado actual da investigação não sacraliza passivamente (as décadas de oiro);
-o forjar de uma periodização infundamentada (clássico, canção, balada);
-o nefasto e deturpador anacronismo que imputa a certas épocas estilos vocais e esquemas de dedilhação e harmonização completamente inexistentes;
-a ucronia dos temas seleccionados, fruto de uma ausência de datação, que lhes confere um estatuto mítico de “sem tempo” ou “fora do tempo” da história;
-a persistência de uma narrativa mítica das origens imbricada à figura de Augusto Hilário;
-a incorporação de um livreto de apresentação, de pretensões eruditas, cujo conteúdo é tão somente do domínio literário-turístico;
-ausência de rigor terminológico e conceptual, incapaz de ultrapassar as limitações do poético-descritivo;
-a não indicação das datas em que foram efectuados os registos fonográficos, e a partir dos quais a editora extraiu as matrizes remasterizadas;
-a negação do fluir da temporalidade histórico-cultural, verificado que a antologia fonográfica na sua parte final inflete marcha e fecha em 2001 com um tema de 1958.
Não compete a uma editora fonográfica investigar a história dos multitudinários géneros musicais que comercializa. Embora, registe-se, número crescente de empresas tenham começado a contratar equipas de investigadores para estudar e avaliar questões de impacto ambiental, económico e patrimonial, revelando uma nova atitude perante os espaços humanizados, o ambiente, o equilíbrio dos ecossistemas, a diversidade do património e a natureza. Em bom rigor, “Biografia do Fado de Coimbra” é um simulacro cultural. Remete-nos para uma origem mítica e fecha “até aos nossos dias” com a Balada de Despedida do 6º Ano Médico de 1958. A visão do tempo proposto pela EMI-Valentim de Carvalho em 2001 conduz-nos a um processo auditivo circular, fechado sobre si próprio, que sendo o de certas franjas de antigos estudantes da UC e de algum público desinformado não é o da produção cultural das gerações académicas activas entre 1978 e 2000. Aliás, o período 1978-2000, intencionalmente omitido pela editora, encontra-se sobejamente ilustrado com imagens poéticas e sons presentes nos registos fonográficos “10 anos... uma serenata” (Grupo de Fados e Guitarras de Coimbra, 1988), “Canções d’Aqui” (Grupo Académico de Fados e Canções de Coimbra, 1989), “Baladas de Despedida/Anos 80” (1990), “Coimbra em Canções” (Praxis Nova, 1991), “Coimbra/Baladas, Fados e Guitarradas” (Secção de Fado, 1994), e outros.
Fossilizada no passado, reduzida a uma galáxia fechada, tipo Parque Jurássico ou Disneylandia, a CC corre o risco de cristalizar “nas mais belas melodias” e nos “maravilhosos clássicos de sempre”, empurrada para o gueto do fim do seu próprio etnoestilo, prisioneira do mito do fim da história.
A este processo de implosão interna, autêntica falsificação da história da CC, não será alheia a tarefa de selecção cometida pela empresa editora a um guitarrista do Fado de Lisboa, José Pracana. Foram proscritos da história da CC importantes nomes com obra gravada na década de 1920 (exemplos de Afonso de Sousa, Flávio Rodrigues, Alexandre Resende, Elísio de Matos, Antero da Veiga, Borges de Sousa, Manuel Paredes, Armando Goes, Almeida d’Eça, Francisco Caetano), pelo simples motivo que a empresa entendeu não pagar às editoras concorrentes os direitos de edição comercial. Da década de 1960 se deixaram de fora insubstituíveis registos, aptos a ilustrar a pluralidade de intervenções/produções de Jorge Tuna, António Andias, Armando Marta, José Manuel dos Santos, Nuno Guimarães, os irmãos Eduardo e Ernesto Melo. Mais grave e danoso, foram totalmente apagados da história todos os jovens grupos académicos com obra gravada entre a década de oitenta e 2000.
Cabe perguntar: os funcionários do quadro da editora fonográfica sonegam o policulturalismo da CC impondo ao público o seu gosto pessoal?; os funcionários da editora lançam no mercado apenas aqueles temas que supostamente o público deseja comprar?; daí, “biografia fonográfica” ou falsificação da história?[9] “Biografia do Fado de Coimbra” enuncia uma memória congelada. Não visa prestar um serviço cultural, muito menos de recolha, divulgação e preservação patrimonial. Pretende apenas manter uma memória auditiva artificial, assente em imagens de maravilhoso, onde deambulam fantasmas, e onde o critério económico destrói e esfrangalha tudo o resto. Pretende-se fazer recordar uma certa imagem convencional da CC, imagem essa onde não há presente, nem futuro, nem diversidade.
“Biografia” comporta ainda uma certa ideologia sibilina, a da morte da CC, transfigurada em nostalgia onde se volatilizou a própria realidade histórica. Resta tão somente o simulacro psicossomático e psicopatológico de vozes e de sons criogenizados numa atmosfera artificial. Museificada, a CC oferta-se qual alucinação da verdade a uma violência irreparável que é do extermínio simbólico.
A progressiva desestruturação das bases auto-reguladoras, a desterritorialização, a dessacralização do poder, ritos e cerimónias da Sociedade Tradicional Académica, o fantasma do etnocídio perpetrado nos anos de 1960/1970, a atitude predatória evidenciada por certos agentes, implicam a construção de novas formas de abordagem da CC enquanto Património Cultural.
Nesta óptica não colhem as descrições empiristas, poéticas, turísticas, factualizantes, as autobiografias, como também não colhem as leituras que procuram reduzir a descodificação e prática da CC a mero produto económico-descartável. A instrumentalização da memória da CC em proveito de fins meramente pessoais e grupais não deve confundir-se com o discurso historiográfico, visto postular leituras que são do domínio dos mitos e ideologias.
Biografia do Fado de Coimbra insinua-se na qualidade de dupla face de Jano, rosto outro de um título anteriormente lançado pela mesma editora com o rótulo de “Biografia do Fado de Lisboa”. Como se o Fado de Lisboa, eternamente cioso da “sua” coutada de caça precisasse de sugar o pseudo filho (Canção de Coimbra) todas as vezes que se exterioriza.
NOTAS
[1] Os registos fonográficos de Armando Leça foram realizados em 1940, aquando da deslocação do Rancho das Tricanas de Coimbra às festas do Duplo Centenário da Fundação da Nacionalidade e Restauração da Independência. Na obra Da Música Portuguesa, 2ª edição, Porto, Livraria Educação Nacional, 1942, pág. 110, Leça arrola: Ao som da guitarra, Estalado, Vá de roda, Vira de Coimbra, Sou marinheiro, Dá-me um beijo, Jovens sereias, Nó da gravatinha, Canavial das canas, Fado com variações na guitarra.
[2] Segundo testemunho do Prof. Doutor Nelson Correia Borges, o Rancho das Tricanas de Coimbra registou em bobine de fita de aço os temas Terra de Inês, Timoneira, A madrugada, a Toutinegra, etc..
[3] Segundo testemunho do Prof. Doutor Nelson Correia Borges, o Rancho das Tricanas de Coimbra gravou em bobine Vira beirão, Marcha, Chora a cantar, Vira coimbrão, Canção popular, Quero-te assim, Do Mondego ao Tejo, etc.. Também foram gravados discos de 78 rpm, nesta altura, sendo director artístico do grupo e até autor de algum repertório o maestro César Magliano. Quase todas as canções são acompanhadas com jazes.
[4] Recorde-se que em 1993, o Grupo Folclórico da Casa do Pessoal da Universidade de Coimbra gravou uma cassete com os temas Jovens sereias, Carinhosa, Vira de Coimbra, Farrapeira, Esta calçadinha, Manuel tão lindas moças, Romance do cego, Toutinegra, Folgadinho, Camélias, Estalado, Com a pena, Ao Menino Deus (Coimbra dos futricas e das tricanas, Coimbra, Estúdios Paralelo Dois/EDISCO, CR 885, ano de 1993). A Brigada Víctor Jara gravou em 1979 Vira de Coimbra (LP Tamborileiro), em 1981 Fado Corrido e Quadrilha da Beira Litoral (LP Quem sai aos seus), e em 1982 Quadrilhas 1 e 2 da Beira Litoral (LP Marcha dos foliões).
[5] Nos autores de manuais escolares de música, e de livros ligados à música, naturais do Douro Litoral ou domiciliados profissionalmente no Douro Litoral, parece ter-se tornado sistemático o erro grosseiro de confundir a Viola Braguesa com a Viola Toeira. Esta confusão também ocorre em casas portuenses que se dedicam à venda de instrumentos musicais.
[6] Estudo desenvolvido desta questão em Álvaro Garrido, “Coimbra nas imagens do cinema do Estado Novo”, in O cinema sob o olhar de salazar, Lisboa, Círculo de Leitores, 2000, págs. 274 e ss.
[7] José Moças, da Tradisom, editou em 2004 uma notável antologia sonora das versões portuguesas e internacionais que este tema conheceu ao longo da segunda metade do século XX: “Coimbra. April in Portugal. Avril au Portugal”, Vila Verde, Tradisom, TRAD 038, ano de 2004. Pena é que nos textos de apresentação da professora de música Maria de São José Corte Real, e do então Bastonário da Ordem dos Advogados José Miguel Júdice, tenha sido inteiramente omitida a conflitualidade ideológica e estética que rodeou esta canção ao longo de meio século.
[8] Tema gravado pela Estudantina Universitária de Coimbra no LP Canto da Noite, comercializado em Novembro de 1993. O assunto mereceu violentíssimo protesto da parte do então estudante de Filosofia e cantor José Manuel Correia Beato (Cf. “Canto da Noite. Da simbologia do mito à subcultura académica”, A Cabra/Jornal Universitário de Coimbra, Nº 13, Ano III, Novembro de 1993, pág. 8). Igualmente crispada seria a resposta da Secção de Fado da AAC junto da Secção de Jornalismo.
[9] A pergunta é do historiador Marc Ferro, Comment on raconte l’histoire aux enfants, Paris, Payot, 1981; no mesmo sentido, Suzanne Citron, Ensinar a história hoje. A memória perdida e reencontrada, Lisboa, Livros Horizonte, 1990.
[1] Os registos fonográficos de Armando Leça foram realizados em 1940, aquando da deslocação do Rancho das Tricanas de Coimbra às festas do Duplo Centenário da Fundação da Nacionalidade e Restauração da Independência. Na obra Da Música Portuguesa, 2ª edição, Porto, Livraria Educação Nacional, 1942, pág. 110, Leça arrola: Ao som da guitarra, Estalado, Vá de roda, Vira de Coimbra, Sou marinheiro, Dá-me um beijo, Jovens sereias, Nó da gravatinha, Canavial das canas, Fado com variações na guitarra.
[2] Segundo testemunho do Prof. Doutor Nelson Correia Borges, o Rancho das Tricanas de Coimbra registou em bobine de fita de aço os temas Terra de Inês, Timoneira, A madrugada, a Toutinegra, etc..
[3] Segundo testemunho do Prof. Doutor Nelson Correia Borges, o Rancho das Tricanas de Coimbra gravou em bobine Vira beirão, Marcha, Chora a cantar, Vira coimbrão, Canção popular, Quero-te assim, Do Mondego ao Tejo, etc.. Também foram gravados discos de 78 rpm, nesta altura, sendo director artístico do grupo e até autor de algum repertório o maestro César Magliano. Quase todas as canções são acompanhadas com jazes.
[4] Recorde-se que em 1993, o Grupo Folclórico da Casa do Pessoal da Universidade de Coimbra gravou uma cassete com os temas Jovens sereias, Carinhosa, Vira de Coimbra, Farrapeira, Esta calçadinha, Manuel tão lindas moças, Romance do cego, Toutinegra, Folgadinho, Camélias, Estalado, Com a pena, Ao Menino Deus (Coimbra dos futricas e das tricanas, Coimbra, Estúdios Paralelo Dois/EDISCO, CR 885, ano de 1993). A Brigada Víctor Jara gravou em 1979 Vira de Coimbra (LP Tamborileiro), em 1981 Fado Corrido e Quadrilha da Beira Litoral (LP Quem sai aos seus), e em 1982 Quadrilhas 1 e 2 da Beira Litoral (LP Marcha dos foliões).
[5] Nos autores de manuais escolares de música, e de livros ligados à música, naturais do Douro Litoral ou domiciliados profissionalmente no Douro Litoral, parece ter-se tornado sistemático o erro grosseiro de confundir a Viola Braguesa com a Viola Toeira. Esta confusão também ocorre em casas portuenses que se dedicam à venda de instrumentos musicais.
[6] Estudo desenvolvido desta questão em Álvaro Garrido, “Coimbra nas imagens do cinema do Estado Novo”, in O cinema sob o olhar de salazar, Lisboa, Círculo de Leitores, 2000, págs. 274 e ss.
[7] José Moças, da Tradisom, editou em 2004 uma notável antologia sonora das versões portuguesas e internacionais que este tema conheceu ao longo da segunda metade do século XX: “Coimbra. April in Portugal. Avril au Portugal”, Vila Verde, Tradisom, TRAD 038, ano de 2004. Pena é que nos textos de apresentação da professora de música Maria de São José Corte Real, e do então Bastonário da Ordem dos Advogados José Miguel Júdice, tenha sido inteiramente omitida a conflitualidade ideológica e estética que rodeou esta canção ao longo de meio século.
[8] Tema gravado pela Estudantina Universitária de Coimbra no LP Canto da Noite, comercializado em Novembro de 1993. O assunto mereceu violentíssimo protesto da parte do então estudante de Filosofia e cantor José Manuel Correia Beato (Cf. “Canto da Noite. Da simbologia do mito à subcultura académica”, A Cabra/Jornal Universitário de Coimbra, Nº 13, Ano III, Novembro de 1993, pág. 8). Igualmente crispada seria a resposta da Secção de Fado da AAC junto da Secção de Jornalismo.
[9] A pergunta é do historiador Marc Ferro, Comment on raconte l’histoire aux enfants, Paris, Payot, 1981; no mesmo sentido, Suzanne Citron, Ensinar a história hoje. A memória perdida e reencontrada, Lisboa, Livros Horizonte, 1990.
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