FADO DA SAUDADE
Música: Armando do Carmo Goes (1906-1967)
Letra: autor não identificado
Incipit: Saudades, quem as não tem
Origem: Coimbra
Data: ca. 1925-1927
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Saudades, quem as não tem
Dum amor que foi bem seu?
(Ai1) Ter saudades é querer bem
A alguém que a gente perdeu.
Passo em rezas noite e dia
Sem delas me aperceber,
(Ai1) Rezar não é só dizer
Padre-nosso, Avé-Maria.
Canta-se o 1º dístico, repete-se, canta-se o 2º e bisa-se.
Acompanhamento 1º Registo Armando Goes em Si Bemol Maior (1928):
1º Dístico: Si Bemol Maior, 2ª de Dó, Dó Menor /// 2ª Si Bemol, Si Bemol Maior
2º Dístico: Sol Menor, 2ª de Sol /// 2ª Si Bemol, Si Bemol Maior
Informação complementar:
Canção musical estrófico-silábica, em compasso quaternário (4/4) e tom de Si Bemol Maior, gravada pelo barítono Armando Goes em Lisboa, a 19 de Outubro de 1928, acompanhado em 1ª guitarra de Coimbra de 17 trastos por Albano de Noronha e em 2ª guitarra por Afonso de Sousa: disco de 78 rpm His Master’s Voice E.Q. 192, master 7-62231. Pode considerar-se uma composição clássica de boa qualidade artística para a época em que surgiu, contendo modulações a fugir ao trivial. A dicção de Armando Goes é muito cuidada e escorreita, bem como a vocalização poderosa mas comedida. A audição dos fonogramas antigos levanta problemas, sendo disso mesmo exemplo a dificuldade em determinar rigorosamente o tom empregue pelo cantor e também a transcrição dos textos. Seja porque os sulcos estão gastos, seja porque o cantor não tem boa dicção, seja porque o texto não é conhecido, só uma prática continuidada e a reaudição sistemática podem ajudar a colmatar rombos. Por exemplo, na audição do original, AG canta no 1º verso da 1ª quadra "Saudades, quem as não tem". Já na repetição deste mesmo verso, não é claro que entoe "saudades", parecendo antes escutar-se "Saudade, quem as não tem". Por aquilo que sabemos, os cantores da década de 1920 não foram para os estúdios com partituras, nem com letras escritas. Cantaram de memória, atitude que em António Menano originou a multiplicação de coplas iguais em distintas faixas fonográficas.
Quer na etiqueta do fonograma, quer nos arquivos da HMV, o título original registado é FADO DA SAUDADE e não FADO DAS SAUDADES, como ocorre no fonograma protagonizado por Luiz Goes. A nossa transcrição corresponde ao fonograma original, aceitando, no entanto, que o autor preferiria como versão definitiva a que foi gravada em 1969 por seu sobrinho Luiz Goes.
Espécime regravado por Luís Goes em 1969, que interpreta o tema em Sol Maior (tom e meio abaixo do original), com um belo arranjo de guitarra por João Bagão: EP Columbia 8E 016 40135, depois incorporado no LP “Canções do Mar e da Vida”, Lisboa, Columbia, 1969, acompanhado por João Bagão/Aires de Aguilar (gg) e António Toscano/Fernando Neto (vv). Luiz Goes modifica o título para “Fado das Saudades” e substitui a letra original por outra da autoria de Leonel Carlos Duarte Neves. Versão remasterizada no CD “Canções do Mar e da Vida”, Lisboa, EMI-Valentim de Carvalho, 724383348022, ano de 1995, faixa nº 12; idem, CD “Luiz Goes. Homem só Meu Irmão”, EMI-VC/Caravela, 724385309823, ano de 1996; ibidem, “Luiz Goes. Canções para quem vier. Integral (1952-2002)”, Lisboa, EMI-Valentim de Carvalho, 724358029727, ano de 2002, Cd nº 3. Eis a letra registada por Luiz Goes, preferida por Armando Goes para figurar como versão definitiva do presente espécime:
Saudades de alguém ausente
Devem ser tristes, decerto,
Mas são mais tristes se a gente
As tem de alguém que está perto.
Mais triste do que esperar,
Toda a vida, quem não vem,
É toda a vida passar
Sem ter de esperar alguém.
A autoria da presente letra foi confirmada pelo próprio Dr. Leonel Neves, no verão de 1996, na sua casa de Odeáxere, no Algarve, em testemunho a José Anjos de Carvalho. Mais informou que não teria ainda 20 anos quando a fez (ca. 1940) expressamente a pedido de Armando Goes. Um dos raros intérpretes desta canção pela década de 1990 era o Dr. José Manuel Beato, em criativa retoma da versão herdada de Luiz Goes, que a terá interpretado na Serenata Monumental da Queima das Fitas de Maio de 2001, transmitida em diferido pela TVI. Que saibamos, o registo original nunca foi reeditado, à semelhança de toda a obra fonográfica de Armando Goes.
O presente espécime não deve confundir-se com as obras seguintes:
-“Fado da Saudade” (Sumia-se a barca, eu chorava), de alvores do século XX, presente na colecção de solfas cantadas por Manasses de Lacerda, cujo autor desconhecemos, sem gravação discográfica;
-“Fado da Saudade” (Oh São João de Coimbra), com música de Paulo de Sá e letra do cantor Agostinho Fontes, feito no Brasil em 1925, sem gravação discográfica conhecida;
-“Fado da Saudade” (A saudade é queda d’água), música de José Mesquita, letra de Afonso Duarte, gravado pelo próprio Mesquita no LP “Coimbra dos Poetas”, Lisboa, FOTOSSONORO, SPA 83, ano de 1983, de difícil acesso;
-e ainda "Fado da Saudade" (Saudade é como gostar), com música de João Lamego e letra de Agostinho de Matos, gravado pela formação do cantor José Tavares Fortuna, oriunda da Universidade do Porto.
Recomendações: quando possível, um trabalho de recolha e de reconstituição deve considerar a obra original e as diferentes abordagens que foi sofrendo ao longo do tempo. Dito isto, somos de opinião que, quanto ao título, pode manter-se o original (=FADO DA SAUDADE); quanto à letra, é de atender à evolução das preferências do próprio Armando Goes, cantor que adoptou o texto de Leonel Neves e o transmitiu a seu sobrinho Luiz Goes; quanto à tonalidade e arranjo de acompanhamento, a cada voz suas especificidades, a cada tocador de guitarra suas unhas. Como se dizia na Coimbra do Renascimento, em modo de sentença popular, "Palavras sem obras, Cítola sem cordas"!
Transcrição musical: Octávio Sérgio (2005)
Textos e pesquisa: José Anjos de Carvalho e António M. Nunes
Agradecimentos: Dr. Afonso de Sousa, José Moças (Tradisom), Leonel Neves, Eng. Pedro Ramalho
Dum amor que foi bem seu?
(Ai1) Ter saudades é querer bem
A alguém que a gente perdeu.
Passo em rezas noite e dia
Sem delas me aperceber,
(Ai1) Rezar não é só dizer
Padre-nosso, Avé-Maria.
Canta-se o 1º dístico, repete-se, canta-se o 2º e bisa-se.
Acompanhamento 1º Registo Armando Goes em Si Bemol Maior (1928):
1º Dístico: Si Bemol Maior, 2ª de Dó, Dó Menor /// 2ª Si Bemol, Si Bemol Maior
2º Dístico: Sol Menor, 2ª de Sol /// 2ª Si Bemol, Si Bemol Maior
Informação complementar:
Canção musical estrófico-silábica, em compasso quaternário (4/4) e tom de Si Bemol Maior, gravada pelo barítono Armando Goes em Lisboa, a 19 de Outubro de 1928, acompanhado em 1ª guitarra de Coimbra de 17 trastos por Albano de Noronha e em 2ª guitarra por Afonso de Sousa: disco de 78 rpm His Master’s Voice E.Q. 192, master 7-62231. Pode considerar-se uma composição clássica de boa qualidade artística para a época em que surgiu, contendo modulações a fugir ao trivial. A dicção de Armando Goes é muito cuidada e escorreita, bem como a vocalização poderosa mas comedida. A audição dos fonogramas antigos levanta problemas, sendo disso mesmo exemplo a dificuldade em determinar rigorosamente o tom empregue pelo cantor e também a transcrição dos textos. Seja porque os sulcos estão gastos, seja porque o cantor não tem boa dicção, seja porque o texto não é conhecido, só uma prática continuidada e a reaudição sistemática podem ajudar a colmatar rombos. Por exemplo, na audição do original, AG canta no 1º verso da 1ª quadra "Saudades, quem as não tem". Já na repetição deste mesmo verso, não é claro que entoe "saudades", parecendo antes escutar-se "Saudade, quem as não tem". Por aquilo que sabemos, os cantores da década de 1920 não foram para os estúdios com partituras, nem com letras escritas. Cantaram de memória, atitude que em António Menano originou a multiplicação de coplas iguais em distintas faixas fonográficas.
Quer na etiqueta do fonograma, quer nos arquivos da HMV, o título original registado é FADO DA SAUDADE e não FADO DAS SAUDADES, como ocorre no fonograma protagonizado por Luiz Goes. A nossa transcrição corresponde ao fonograma original, aceitando, no entanto, que o autor preferiria como versão definitiva a que foi gravada em 1969 por seu sobrinho Luiz Goes.
Espécime regravado por Luís Goes em 1969, que interpreta o tema em Sol Maior (tom e meio abaixo do original), com um belo arranjo de guitarra por João Bagão: EP Columbia 8E 016 40135, depois incorporado no LP “Canções do Mar e da Vida”, Lisboa, Columbia, 1969, acompanhado por João Bagão/Aires de Aguilar (gg) e António Toscano/Fernando Neto (vv). Luiz Goes modifica o título para “Fado das Saudades” e substitui a letra original por outra da autoria de Leonel Carlos Duarte Neves. Versão remasterizada no CD “Canções do Mar e da Vida”, Lisboa, EMI-Valentim de Carvalho, 724383348022, ano de 1995, faixa nº 12; idem, CD “Luiz Goes. Homem só Meu Irmão”, EMI-VC/Caravela, 724385309823, ano de 1996; ibidem, “Luiz Goes. Canções para quem vier. Integral (1952-2002)”, Lisboa, EMI-Valentim de Carvalho, 724358029727, ano de 2002, Cd nº 3. Eis a letra registada por Luiz Goes, preferida por Armando Goes para figurar como versão definitiva do presente espécime:
Saudades de alguém ausente
Devem ser tristes, decerto,
Mas são mais tristes se a gente
As tem de alguém que está perto.
Mais triste do que esperar,
Toda a vida, quem não vem,
É toda a vida passar
Sem ter de esperar alguém.
A autoria da presente letra foi confirmada pelo próprio Dr. Leonel Neves, no verão de 1996, na sua casa de Odeáxere, no Algarve, em testemunho a José Anjos de Carvalho. Mais informou que não teria ainda 20 anos quando a fez (ca. 1940) expressamente a pedido de Armando Goes. Um dos raros intérpretes desta canção pela década de 1990 era o Dr. José Manuel Beato, em criativa retoma da versão herdada de Luiz Goes, que a terá interpretado na Serenata Monumental da Queima das Fitas de Maio de 2001, transmitida em diferido pela TVI. Que saibamos, o registo original nunca foi reeditado, à semelhança de toda a obra fonográfica de Armando Goes.
O presente espécime não deve confundir-se com as obras seguintes:
-“Fado da Saudade” (Sumia-se a barca, eu chorava), de alvores do século XX, presente na colecção de solfas cantadas por Manasses de Lacerda, cujo autor desconhecemos, sem gravação discográfica;
-“Fado da Saudade” (Oh São João de Coimbra), com música de Paulo de Sá e letra do cantor Agostinho Fontes, feito no Brasil em 1925, sem gravação discográfica conhecida;
-“Fado da Saudade” (A saudade é queda d’água), música de José Mesquita, letra de Afonso Duarte, gravado pelo próprio Mesquita no LP “Coimbra dos Poetas”, Lisboa, FOTOSSONORO, SPA 83, ano de 1983, de difícil acesso;
-e ainda "Fado da Saudade" (Saudade é como gostar), com música de João Lamego e letra de Agostinho de Matos, gravado pela formação do cantor José Tavares Fortuna, oriunda da Universidade do Porto.
Recomendações: quando possível, um trabalho de recolha e de reconstituição deve considerar a obra original e as diferentes abordagens que foi sofrendo ao longo do tempo. Dito isto, somos de opinião que, quanto ao título, pode manter-se o original (=FADO DA SAUDADE); quanto à letra, é de atender à evolução das preferências do próprio Armando Goes, cantor que adoptou o texto de Leonel Neves e o transmitiu a seu sobrinho Luiz Goes; quanto à tonalidade e arranjo de acompanhamento, a cada voz suas especificidades, a cada tocador de guitarra suas unhas. Como se dizia na Coimbra do Renascimento, em modo de sentença popular, "Palavras sem obras, Cítola sem cordas"!
Transcrição musical: Octávio Sérgio (2005)
Textos e pesquisa: José Anjos de Carvalho e António M. Nunes
Agradecimentos: Dr. Afonso de Sousa, José Moças (Tradisom), Leonel Neves, Eng. Pedro Ramalho
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