No dia 02 de Maio de 2006, com o título Cortejo da Queima das Fitas", editámos no blog esta mesma fotografia, com o seguinte texto:
"Rara e interessante fotografia divulgada por Alexandre Ramires no catálogo "Revelar Coimbra. Os inícios da fotografia em Coimbra (1842-1900)", Coimbra, 2001, documento 50, com o título "Porta Férrea. Festa de Estudantes. Finais do século XIX".
Não querendo duvidar da sólida competência técnica de Alexandre Ramires, tenho para mim que esta fotografia se reporta não a um cortejo da década de 1890 mas sim a um cortejo da Queima das Fitas ocorrido entre 1901-1905. Antes de 1900 são totalmente desconhecidos cortejos da Queima das Fitas, cuja estrutura não deve confundir-se com os antigos cortejos das Latadas (Festa das Latas, Festa do Ponto).
Poderá contra-argumentar-se que em 1899 o Centenário da Sebenta dinamizou um monumental cortejo, mas tal argumento não colhe sentido. O Cortejo do Centenário da Sebenta é conhecido exaustivamente através de fotografias de época e de postais ilustrados. Os postais evidenciam bem que, não obstante o aparato burlesco, as carroças e carros de bois foram concebidos como carros alegóricos.
No presente cortejo, a diferença é flagrante. Perante os cenários da Porta-Férrea e da Alameda Camões, a carruagem de duas parelhas não apresenta qualquer estrutura próxima dos "carros alegóricos". O que vemos é uma carruagem de dois rodados, com quartanistas (??) sentados, profusamente ornamentada com flores e motivos vegetais. Esta solução é directamente inspirada nas carruagens que em Lisboa se exibiam anualmente no Carnaval com homens e mulheres que dinamizavam as elegantes "Batalhas das Flores", de que há relatos ao longo da primeira década do século XX nos carnavais mundanos de Coimbra e do Porto.
A celebração da Primavera e a euforia perante a floração são, contudo, muito anteriores à emergência da Queima das Fitas, pois nas décadas de 1850-1860 os estudantes tinham como horizonte simbólico para o início dos festejos de fim do ano escolar a floração do Tulipeiro da Virgínia existente no Jardim Botânico.
As carruagens eram enfeitadas com motivos florais e no interior seguiam cestas repletas de flores que eram atiradas sobre os ocupantes dos carros mais próximos. Como se pode aferir, o chic "baile de gala" (Ponta Delgada, Fenianos do Porto) e a "batalha das flores" eram então novidades fidalgo-burguesas que vinham desacreditar o velho, porco e malcheiroso Entrudo que em Coimbra metia três dias de ovos podres, cebolas, batatas, tremoços e panelos de barro.
A Batalha das Flores, limpa e perfumada, como que remete para uma antiga tradição cultivada nos séculos XVII e XVIII, no Entrudo, pelos fidalgos de Ponta Delgada. Era a "Batalha das Limas", à base do lançamento aparatoso de bolas de cera recheadas com água perfumada.
Crónicas atinentes ao período 1901-1905 confirmam que os quartanistas de Direito e Teologia ornamentavam os carros de tracção animal com flores e realizavam ao longo do percurso uma "Batalha das Flores". Esquecida a "batalha", restam as flores de papel".
Não querendo duvidar da sólida competência técnica de Alexandre Ramires, tenho para mim que esta fotografia se reporta não a um cortejo da década de 1890 mas sim a um cortejo da Queima das Fitas ocorrido entre 1901-1905. Antes de 1900 são totalmente desconhecidos cortejos da Queima das Fitas, cuja estrutura não deve confundir-se com os antigos cortejos das Latadas (Festa das Latas, Festa do Ponto).
Poderá contra-argumentar-se que em 1899 o Centenário da Sebenta dinamizou um monumental cortejo, mas tal argumento não colhe sentido. O Cortejo do Centenário da Sebenta é conhecido exaustivamente através de fotografias de época e de postais ilustrados. Os postais evidenciam bem que, não obstante o aparato burlesco, as carroças e carros de bois foram concebidos como carros alegóricos.
No presente cortejo, a diferença é flagrante. Perante os cenários da Porta-Férrea e da Alameda Camões, a carruagem de duas parelhas não apresenta qualquer estrutura próxima dos "carros alegóricos". O que vemos é uma carruagem de dois rodados, com quartanistas (??) sentados, profusamente ornamentada com flores e motivos vegetais. Esta solução é directamente inspirada nas carruagens que em Lisboa se exibiam anualmente no Carnaval com homens e mulheres que dinamizavam as elegantes "Batalhas das Flores", de que há relatos ao longo da primeira década do século XX nos carnavais mundanos de Coimbra e do Porto.
A celebração da Primavera e a euforia perante a floração são, contudo, muito anteriores à emergência da Queima das Fitas, pois nas décadas de 1850-1860 os estudantes tinham como horizonte simbólico para o início dos festejos de fim do ano escolar a floração do Tulipeiro da Virgínia existente no Jardim Botânico.
As carruagens eram enfeitadas com motivos florais e no interior seguiam cestas repletas de flores que eram atiradas sobre os ocupantes dos carros mais próximos. Como se pode aferir, o chic "baile de gala" (Ponta Delgada, Fenianos do Porto) e a "batalha das flores" eram então novidades fidalgo-burguesas que vinham desacreditar o velho, porco e malcheiroso Entrudo que em Coimbra metia três dias de ovos podres, cebolas, batatas, tremoços e panelos de barro.
A Batalha das Flores, limpa e perfumada, como que remete para uma antiga tradição cultivada nos séculos XVII e XVIII, no Entrudo, pelos fidalgos de Ponta Delgada. Era a "Batalha das Limas", à base do lançamento aparatoso de bolas de cera recheadas com água perfumada.
Crónicas atinentes ao período 1901-1905 confirmam que os quartanistas de Direito e Teologia ornamentavam os carros de tracção animal com flores e realizavam ao longo do percurso uma "Batalha das Flores". Esquecida a "batalha", restam as flores de papel".
Tendo sido esta fotografia editado sem ensejo de troca de informações entre o signatário do texto e o autor do álbum fotográfico citado, impõe-se corrigir pontos de vista que perdem acuidade quando confrontados com novos dados. Alexandre Ramires, em conversa de 31/10/2006, sustentou que de acordo com as suas investigações e cruzamento de dados, a fotografia não se reporta nem ao Centenário da Sebenta (1899), nem aos cortejos da Queima das Fitas balizados entre 1901-1905. As investigações pacientemente desenvolvidas por Alexandre Ramires são dignas de toda a credibilidade (além de perito, é a mais segura autoridade na matéria), o que nos obriga a rever as escassas informações sobre as festividades académicas conimbricenses de finais do século XIX. Haverá que pesquisar a fundo as festividades estudantis oitocentistas e rever clichés, pois os cortejos alegóricos, que se pensava não existirem antes de 1899, aí estão e em prova bem material.
O meu agradecimento a Alexandre Ramires, com quem gostaríamos de ir contando aqui e ali.
AMNunes
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