domingo, abril 01, 2007


Bernardino Machado (9)
Retrato do Doutor Bernardino Luís Machado Guimarães (Rio de Janeiro, 28/03/1851; Porto, 29/04/1944) como lente catedrático da antiga Faculdade de Filosofia Natural da UC (ca. 1876). BM enverga a borla e capelo em azul escuro, cor oficial da Fac. extinta em 1911, e o Hábito Talar conforme o modelo que vingou a partir de 1834, com as simplificações introduzidas em 1863: batina talar preta de corte singelo, abotoando com fileira vertical de botõezinhos+capa preta talar, com cordão preso ao colarinho, podendo comportar bandas e gola, ou apenas colarinho no estilo da antiga capa dos jesuítas. A calça comprida era admitida aos lentes laicos desde 1863, mas BM deixa antever os sapatos de gala com fivela de prata, sendo admissível que estivesse de calção e meias pretas altas, pois na década de 1870 ainda havia alguns lentes não clérigos que envergavam nas galas solenes peças do antigo uniforme.
BM matriculou-se na Fac. de Matemática em 1866, mas breve se transferiu para a de Filosofia Natural. Atingiu o bacharelato em 1873, a licenciatura em 14/01/1875 e defendeu actos magnos de doutoramento em 1876, seguindo-se a investidura doutoral.
BM leccionou sucessivamente na UC Agricultura, Zootecnia e Economia Rural, mas a menina dos seus olhos seria a cadeira de Antropologia Física. Filiado no Partido Regenerador, BM foi eleito deputado pela primeira vez em 1882. Seguiu-se longa e acidentada carreira política no trecho final da Monarquia Constitucional e Primeira República. Exilado e afastado do poder, BM pôde ainda assistir ao triunfo e afirmação do Estado Novo.
Par do Reino em 1890 e ministro, BM mostrou ser um docente e um político muito sensível a problemas como as condições de vida do operariado português, o ensino técnico-profissional e a instrucção pública.
Crescentemente desiludido com o rotativismo monárquico, BM manifestou a sua adesão ao Partido Republicano em 1903, acontecimento que deu brado na época. Logo a seguir, na abertura solene do ano lectivo, em 10 de Outubro de 1904, proferiu na Sala dos Actos Grandes uma Oração de Sapiência onde teceu vigorosas críticas à UC. Tão inusitadas se revelaram as palavras proferidas por BM que a assistência mais progressista presente na Sala dos Capelos derrogou a antiga praxe e bateu palmas ao orador. O representante do Reitor, Doutor Avelino Calisto, não se conteve e replicou a BM em tom de censura.
Sendo algumas das reivindicações estudantis de 1907 uma reactualização das críticas esgrimidas por BM em 1904, não admira que o lente e político tenha seguido a Crise Académica de 1907 com acrescido interesse. No dia 25 de Março de 1907 BM fez uma alocução no Centro Republicano Escolar de Belém, Lisboa, onde afirmou que se demitiria do cargo de lente catedrático da UC caso o Conselho de Decanos prejudicasse algum dos alunos grevistas. Agastado, João Franco pressionou o Reitor Santos Viegas para que instasse BM a precisar melhor o conteúdo das suas afirmações, o que no fundo equivalia a exigir-lhe que clarificasse se apoiava a posição do governo ou a causa estudantil.
O Reitor deixou-se levar por João Franco e tomou a lamentável atitude de escrever uma carta a BM, na qual lhe solicitava explicações. BM respondeu ao Reitor polidamente, como era seu timbre, mas com enorme altivez. Inteirado do teor do acórdão disciplinar do Conselho de Decanos, BM apresentou a sua demissão em 16 de Abril de 1907. O governo franquista não se fez rogado e por Decreto de 25 de Abril de 1907 declarou BM exonerado das suas funções docentes na UC.
Após o 05 de Outubro de 1910 exerceu funções diplomáticas, quase sempre em situação de contiguidade com Afonso Costa. Primeiro Ministro em 1913, guindou-se a dois mandatos presidenciais (1915-1917 e 1925-1926). Da primeira vez viu-se destituído pelo golpe protagonizado por Sidónio Pais (seu colega da antiga Fac. de Matemática que no decurso da Grande Guerra transitara de posições progressistas para ideais conservantistas), e da segunda, o golpe militar conduzido por Costa Gomes tolheu-lhe o mandato.
Em 14 de Outubro de 1919 os colegas de BM da Faculdade de Ciências propuseram que o antigo lente fosse reintegrado no corpo docente. Com efeito, BM seria oficialmente reintegrado no claustro da Fac. de Ciências pela letra do Decreto de 05 de Novembro de 1919.
Não consta que BM tenha mandado fazer um novo Hábito Talar pelo figurino adoptado em 1915/1916, ou que tenha adquirido insígnias doutorais azul celeste, cor oficial desde 1911, fruto da fusão das antigas Facs. de Matemática e Filosofia (o curso de Mat. manteve o privilégio das cores pombalinas).
Progenitor de 16 rebentos, BM tinha fama de dar-se com toda a gente e de cumprimentar afavelmente os seus inimigos. A sua gentileza, traduzida no velho costume de cumprimentar desbarretado, motivou um cortejo de caricaturas onde BM aparece a fazer vénias de cartola na mão. Estes comportamentos distanciavam BM dos homens do seu tempo, numa época em que liberais monárquicos e republicanos aprendiam esgrima e resolviam as questões de honra a estocadas de florete. Daí, talvez, a conhecida alcunha de BM, "o Manteiga"...
BM teve grandes admiradores nas fileiras populares republicanas conimbricenses. Por 1912 foi inaugurada na velha Alta, no edifício da Igreja de São Pedro, a Cantina Escolar Bernardino Machado, em cuja festa se interpretou o "Fado da Despedida do 5º Ano Jurídico de 1912", com música de Francisco Menano e letra de José Marques da Cruz. Havia mesmo quem, no trauteio de "Nossas mágoas são o fructo/Que nos dá este viver", intitulasse a composição de "Fado das Festas Escolares da Cantina Bernardino Machado".
Fontes on line:
-"Bernardino Machado. Portugal. Dicionário Histórico",
-"Bernardino Machado. O Portal da História",
-"Biografia...", O Leme, por Maria Luísa Boléo,
-"Bernardino Luís Machado Guimarães",
-"Antigos Presidentes: Bernardino Machado",
Fotografia: António Machado, «Memórias», Porto, L. Figueirinhas, 1945; idem, Alberto Xavier, «História da Greve Académica de 1907», 1962.
AMNunes

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