António José de Almeida
Oriundo de Penacova (27/06/1866), AJA fez o Liceu de Coimbra e concluiu os seus estudos superiores na Fac. de Medicina da UC em 30/07/1895.
Ainda liceal, causou enorme agitação em Coimbra por ter promovido em 15 de Novembro de 1889 a celebração da implantação do regime republicano no Brasil. Na sequência do Ultimato Britânico de 11 de Janeiro de 1890, redigiu e publicou um exaltado texto onde criticava o regime e o Rei D. Carlos, a que deu o título de "Bragança, o último". Este artigo veio a público num jornal estudantil editado por Afonso Costa, «O Ultimatum», com data de 23 de Março de 1890.
Acusado de abuso de imprensa e de falta de respeito ao Chefe de Estado, AJA foi julgado no tribunal de Coimbra a 25 de Junho de 1890, conjuntamente com o seu colega de Direito Afonso Costa, e condenado a três meses de prisão. O proprietário da Tipografia Operária, Pedro Cardoso, viu-se a braços com um processo e o jornal não conseguiu ultrapassar o primeiro número. O defensor de AJA foi o advogado e antigo estudante de Direito Manuel de Arriaga, um republicano moderado, conhecido pelas suas propensões artístico-humanísticas, que AJA viria a convidar em Outubro de 1910 para assegurar a Reitoria da UC.
Ao longo dos anos de curso, AJA intensificou a sua militância ideológica em prol da causa republicana. Participou activamente na preparação da rebelião republicana portuense do 31 de Janeiro de 1891 e na Greve Académica de Maio de 1892 contra as medidas autoritárias do Governo de José Dias Ferreira.
O seu temperamento fogoso, a figura garbosa e o verbo inflamado faziam de AJA um líder juvenil sedutor. Mas se estes atributos soavam a virtudes aos ouvidos dos republicanos e descontentes com a obsolescência do rotativismo, para os lentes monárquicos eram um sinal de imprudência. Logo nos alvores do curso, AJA tornou-se notado como bom aluno, revelando capacidades e ambições que o poderiam guindar ao claustro docente. Consciente das potencialidades do jovem AJA e querendo evitar uma "lança em África", o lente de Medicina Lopes Vieira, fazendo uso de uma atitude criticável, emitiu uma informação escrita dirigida a outros colegas, tentando sensibilizá-los para a necessidade de em circunstância alguma AJA vir a ingressar no copo docente da Fac. de Medicina. Lopes Vieira não perderia pela demora, tendo AJA escrito "Desafronta e palavras de um Intransigente", uma obra que o guindaria ao estatuto de herói estudantil e passaria a leitura de cabeceira de muitos liceais e universitários.
Membro dos "46 Incondicionais" que lutando contra o encerramento da UC por José Dias Ferreira, o fechamento da AAC no Colégio da Trindade, e a exigência de um camuflado pedido de desculpa escrito que possibilitaria aos académicos arrependidos a realização de exames, AJA perdeu o ano.
Após a formatura, trabalhou em Angola, São Tomé e Príncipe e realizou estágios científicos em Paris. Regressado a Portugal, seria eleito deputado pelo Partido Republicano, seguindo-se logo em 1906 a actividade parlamentar na Câmara dos Deputados. Na qualidade de deputado, AJA viveu intensamente a Crise Académica de 1907 e por diversas vezes interpelou o Governo de João Franco sobre o curso dos acontecimentos. A esse propósito, ficaram célebres os longos discursos proferidos nos dias 05 de Março, 05 e 09 de Abril de 1907, onde relembrou em tom condenatório os acontecimentos académicos de 1892 e traçou duras críticas à UC. Nelas se vislumbra já uma parte das reformas que viria a implementar em Outubro de 1910 (cf. AJA, "Quarenta Anos de Vida Literária e Política, II, 1933, pp. 73 e ss.).
Preso na sequência do golpe republicano de 28 de Janeiro de 1908, AJA assumiu no Governo Provisório Republicano a pasta do Interior (1910-1911), correndo então nesse ministério os negócios da Instrução Pública.
Na dupla qualidade de Ministro do Interior [e da Instrução] deslocou-se a Coimbra em 19/10/10910, acompanhado pelo novo Reitor da sua confiança, Manuel de Arriaga, procedendo à laicização da UC, à abolição do antigo cerimonial e protocolo, à extinção de cursos e à implementação centralista de um novo programa de estudos superiores.
Apesar de ter sido na recta final do reinado de D. Carlos um dos organizadores da carbonária, AJA mostrou ser um político republicano moderado, próximo de uma sensibilidade humanística cristã anti-clerical e do republicanismo laico e demo-liberal, facetas que o tornaram muito apreciado em Coimbra e no resto do país.
Acusado de manobras demagógicas para captar apoiantes - parece que com alguma inveja e injustiça da parte dos seus pares e detractores -, AJA, ao contário de outros líderes republicanos elitistas e novos-ricos, dava mostras de sentir-se à vontade no meio das multidões e dos seus apoiantes populares.
Profundamente pressionado entre Outubro de 1910 e Julho de 1911 por um grupo académico radical, auto-designado Falange Demagógica, AJA não cedeu às exigências anarquistas e jacobinas extremadas que reclamavam em Coimbra e no Parlamento a extinção da UC.
No decurso do cisma republicano, fundaria em 1912 o Partido Evolucionista. Primeiro Ministro do bloco União Sagrada, em 1916 AJA visitou demoradamente a UC que o recebeu numa atitude humilde e subserviente, como que a pedir-lhe desculpa pelos "erros" do passado e a querer demonstrar que modernizara o ensino, a investigação e o corpo docente. Tolerante com a sua Alma Mater, AJA não deixou, contudo, de com ela ser injusto:
-promoveu logo em 1911 eleições reitorais para as novas universidades de Lisboa e Porto, mas impôs à UC um reitor da confiança do governo, opção centralista e dirigista que tendeu a arrastar-se no tempo;
-nunca deu sinal à UC de que aprovava o retorno do cerimonial ou a eleição reitoral, quando em simultâneo valorizou as aberturas solenes que se passaram a realizar em Lisboa e Porto. Profundamente atingida no seu património simbólico, a UC como que perdeu a sua identidade multissecular, fulminada por aviltamentos que atingiram o auge em 1919 com o Ministro da Instrução Leonardo Coimbra e o seu reitor e lugar-tenente Joaquim José Coelho de Carvalho;
-privou a UC do seu património simbólico (cerimonial, insígnias, trajes), sem que tomasse idênticas medidas em relação às Escolas Médico-Cirúrgicas, Escolas Politécnicas e Academia de Ciências (igual contenção vestimentária seria observada pelo Ministério da Justiça relativamente aos uniformes judiciários que continuarem em pleno uso, bem como pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, onde foram mantidos o Grande Uniforme de diplomata e as cerimónias de apresentação de credenciais). Na qualidade do Ministro do Interior do Governo Provisório, não são conhecidos a AJA normativos de abolição dos Trajes de Gala, insígnias e cerimonial das Câmaras Municipais. As comissões executivas municipais nomeadas logo após o 05 de Outubro de 1910 deixaram de observar o cerimonial municipal espontaneamente...
-guardou silêncio quando a partir de 1915-1916 alguns dos antigos lentes da Fac. de Direito da UC transferidos para o Studium Olissiponensis começaram a aparecer em Hábito Talar e Borla e Capelo nas aberturas solenes do ano escolar da Universidade de Lisboa (entre eles contavam-se críticos como Afonso Costa). E procurando estabelecer outros parelismos temáticos, na Presidência da República, ultrapassado o ciclo de extrema austeridade institucional associado a Teófilo Braga (1910-1911), o primeiro Presidente eleito, Manuel de Arriaga (1911-1915), retomou o protocolo de Estado em termos de recepção de diplomatas, cerimónia de posse presidencial e cortejo solene de carruagens entre o Palácio de Belém e o Parlamento;
-os silêncios de AJA acabariam por reverter a favor de Sidónio Pais. Jubilosamente aclamado pela UC em 1918, coube-lhe sancionar o retorno do cerimonal conimbricense reformado.
Paladino da participação de Portugal na Grande Guerra e Presidente eleito da República entre 06/08/1918 e 05/10/1923, AJA cumpriu mandato integral. Consolidou as relações diplomáticas entre Portugal e o Brasil e tornou-se conhecido pelas tentativas de entendimento cordial com a Igreja Católica.
A cerca de um ano do término do seu mandato, em Outubro de 1922 ocorreu em Lisboa o sangrento assassinato de Machado dos Santos e de António Granjo (que se havia destacado como figura de proa da Crise Académica de 1907).
Após a Revolução de 28 de Maio de 1926, AJA continuava a contar adeptos em Coimbra. Entre 1926-1929, nas tascas, mercearias e barbearias do Largo da Feira, Rua dos Estudos e Rua Larga, vozes soltas de desolados com os rumos da Ditadura Militar gritavam "Viva o António José".
Figura prestigiada da Primeira República, AJA faleceria no dia 31 de Outubro de 1929, ao cabo de longos padecimentos provocados pelo excesso de ácido úrico que nos dias piores o conduziam à cadeira de rodas.
Fontes on line:
-"O Portal da História. António José de Almeida",
-"O Portal da História. Discurso..." (com foto supra utilizada),
-"António José de Almeida, 6º Presidente da 1ª República. O Leme. Biografias",
-"Presidência da República. Antigos Presidentes: António José de Almeida",
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