sábado, agosto 12, 2006


Silêncio na Serenata Posted by Picasa
Longe vão os anos em que podiam cantar na Sé Velha, sem aparelhagem de amplificação sonora fazendo-se ouvir à distancia as vozes de Augusto Camacho Vieira (década de 1940), Luís Goes ou Fernando Rolim (década de 1950), e José Miguel Baptista ou Fernando Gomes Alves (década de 1960).
Os anos setenta trouxeram as serenatas celebrativas da Sé Velha de volta ao imaginário coimbrão, mas reforçadas logo em 1978 por dispositivos tecnológicos de amplificação sonora.
Desde então, o debate sobre o ruído provocado pela assistência e os méritos e deméritos dos microfones manteve-se, ora mais vivaz, ora mais mortiço.
Ao longo da década de 1980, sobretudo nas serenatas monumentais da Queima das Fitas, a corrida a um lugar nos camarins do "La Scala de Coimbra" (degraus da Sé Velha, entenda-se)começava por volta das 16-17 horas da tarde, com os quintanistas em hora de adeus. A situação era agravada pelo progressivo desaparecimento das récitas de despedida dos quintanistas que no Domingo antes da Serenata Monumental deveriam levar à cena as suas récitas e cantar colectivamente em palco as baladas que anualmente se produziam para os cursos em despedida. A verdade é que, ausentes ou quase ausentes as récitas, as baladas de despedida acabavam por ser estreadas não nos palcos dos teatros de Coimbra mas sim em primeira mão na Sé Velha (5ª feira), com repetição no Sarau de Gala da 6ª feira. E mesmo quando cantadas no palco do Teatro Académico de Gil Vicente, em sede de Sarau de Gala da Queima das Fitas, os grupos que as tinham composto nunca chamavam ao palco os cursos em despedida para cantarem em coro as suas baladas. Todos estes erros (não vamos chamar-lhes "evolução") contribuíam para o congestionamento do escadório da Sé Velha, uma vez que os quintanistas e as quintanistas, mal expirava o acorde da "Balada de Coimbra", queriam gritar "eferreás" em nome dos seus cursos e abrir as pastas para lançar garbosamente ao vento as fitas largas.
Depois, a partir das 22:30 horas, o Largo da Sé Velha começava a encher-se com enxurradas de estudantes dos anos mais avançados e matilhas de caloiros de todos os cursos da UC que, de barriga cheia e bem avinhados, saíam directamente dos jantares de cursos para a serenata. Aos muitos alunos da UC acresciam antigos estudantes, familiares de alunos e académicos dos vários estabelecimentos de ensino superior existentes em Coimbra. Estes estudantes recém-chegados dos jantares de curso eram o pior público da serenata. De copos e garrafas na mão, vinham mais para cantarolar, discutir, gritar e beber, do que propriamente para ouvir a cantoria. Se houvesse transmissão televisiva, vinham armados de cartazes com dedicatórias maternas e acenos. E quanto mais posicionados nas extremidades do Largo onde nasciam as ruas circundantes e mercadejavam os bares abertos, mais estas chusmas de público bem jantado e bem bebido perturbavam a serenata com indisfarçável barulheira.
Cerca de 15 a 10 minutos antes da meia noite começavam a chegar os grupos convidados. Galgar as escadas e trepar ao patamar superior do portal da Sé era uma aventura. Havia guitarristas que faziam subir os estojos dos instrumentos de mão em mão, estes pairando sobre as muitas cabeças dos quintanistas.
Outro problema, por sinal mal gerido, que originava ruído e distracção nas serenatas, era a excessiva duração do evento. Na passagem dos anos 80 para os anos 90, as serenatas passaram a ter cada vez mais formações alinhadas. Por exemplo, na serenata a que se reporta este folheto (02/11/2000), actuaram quatro grupos: Saudades de Coimbra, com 3 temas; Guitarras do Mondego, com 6 temas; Eminium, com 5 temas; Coimbra de Sempre, com 6 temas. A programação é manifestamente exagerada, obrigando a uma duração de quase duas horas, geradora de desinteresse e convidando o público a atitudes de dispersão.
Um dos cultores que mais se preocupou com o excesso de barulho nas serenatas festivas conimbricenses foi Jorge Cravo, para quem haveria que retirar da Sé Velha qualquer material de amplificação sonora.
A questão do "barulho" em cerimónias e festividades está longe de constituir um problema especificamente coimbrão. Em tempos de poluição sonora como estilo de vida predominante nas sociedades ocidentais, os ruídos perturbadores invadem as salas de aula, as discotecas, as missas, os cinemas e os teatros, com os toques de telemóveis e as conversas paralelas a substiturem a comunicação artística.
Um estudioso das festividades populares portuguesas, Pierre Sanchis, demonstrou que nos concertos de arraial o público mais próximo dos palcos tende a adoptar posturas de comedimento, enquanto o público situado nas periferias dos recintos festivos se distrai com outras solicitações.
Sem solução à vista, a Sé Velha pode muito bem constituir uma tremenda desilusão para quem ingenuamente a procura nos tempos que correm: o Largo tornou-se demasiado pequeno para um público crescentemente massificado, as condições de audição dos grupos não são as ideais e o excesso de grupos alinhados cansa a outiva mais paciente.
AMNunes


Canção da Nora Posted by Picasa
Painel de azulejos existente em Cortes, arredores de Leiria, com os famosos versos de José Marques da Cruz.
Fotografia: José Anjos de Carvalho
AMNunes


Batalhão Académico Posted by Picasa
Uniforme dos estudantes da UC que em 1808-1811 integraram o Batalhão Académico que, primeiro sozinho na Região Centro, e depois agregado às forças anglo-lusas, combateu na Guerra Pensinsular. Em 1808 este era o figurino de uniforme usado pelos graduados, comportando como distintivo uma dragona dourada no ombro direito.
Fonte: Fernando Barreiros, "Notícia Histórica do Corpo Militar Académico de Coimbra (1808-1811). 1º Centenário da Guerra Peninsular", Lisboa, Livraria Bertrand e Aillaud, 1918.
AMNunes


"Aliciação..." Posted by Picasa
Quem entrar na sala de audiências do Tribunal Judicial da Figueira da Foz deparará com uma tapeçaria mural de grandes dimensões, cujo título é "Aliciação das populações, entre Coimbra e a Figueira da Foz, pelo académico Zagalo, para apoiarem os ingleses desembarcados em luta com os invasores franceses."
O tribunal, da autoria do arquitecto Raul Rodrigues Lima, foi construído com mão de obra prisional e solenemente inaugurado pelo Ministro da Justiça Antunes Varela a 15 de Agosto de 1961. Assinou o cartão da tapeçaria o pintor Renato Torres (1961), tendo a execução técnica corrido por conta da Manufactura de Tapeçarias de Portalegre.
Não está apurado se o tema foi indicado ao pintor directamente pelo Ministro da Justiça, se pelo Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz. Seja como for, e à semelhança do que se passou em tantos outros tribunais, trata-se de cristalizar e sacralizar plasticamente um momento considerado relevante em termos de história local, do qual se extraíria uma lição de boa moral. Esses valores são o orgulho nacional, a união em torno da defesa da soberania e o heroísmo.
Para o que nos importa, o título da obra é excessivamente longo (não se encontra legendada, o que dificulta a identificação imediata), contendo a tapeçaria algumas incorrecções iconográficas de monta.
Junot rompera a linha fronteiriça a 19 de Novembro de 1807, seguindo-se a fuga da família real e a ocupação de Lisboa no dia 13 de Dezembro. A 18 de Junho de 1808 a população do Porto amotinou-se contra os invasores, organizando resistência em torno do bispo D. António de Castro. Seguiram-se focos de insurreição em Chaves, Bragança, Braga, Melgaço e Vila Pouca de Aguiar. Estudantes vindos do Porto chegaram a Coimbra no dia 23 de Junho e logo fomentaram o levantamento contra as forças napoleónicas ocupantes. Tomou-se o aquartelamento francês alojado no Colégio de São Tomás (actual Palácio da Justiça), foram descobertos os brasões do reino na Câmara Municipal e Mosteiro de Santa Cruz e iniciou-se o fabrico de munições no Laboratório Químico da UC.
Optando por uma estrutura tripartida vincadamente figurativa (a obra deveria ser de descodificação imediata), Renato Torres coloca no centro da tapeçaria o momento fulcral em que os estudantes da UC se organizaram em torno do estudante Bernardo Pereira Zagalo e marcharam de Coimbra para o Forte de Santa Catarina na Figueira da Foz.
Zagalo arregimentou 40 praças, sendo 25 estudantes voluntários e, na tarde de 25 de Junho de 1808, avançou em direcção a Tentúgal e Montemor-o-Velho. Com os povos vindos de Coimbra, Tentúgal, Carapinheira e Montemor, armados com foices, pás, enxadas e forquilhas, o destacamento atingia 3.000 homens quando na tarde de 26 de Junho se começou a abeirar do Forte de Santa Catarina.
Zagalo não foi o único oficial a distinguir-se. No levantamento das populações desempenhou papel de relevo o sargento António Cayolla. A Torre da UC funcionou como centro de emissão de mensagens, através de toques de sinos (nesse tempo os sinos ouviam-se até Tentúgal!) e de fogueiras acesas no topo.
A rendição do forte ocorreu no dia 27 de Junho de 1808, com Zagalo coroado de glória. As operações militares não terminaram com a conquista do Forte de Santa Catarina. O Batalhão Académico avançou para sul, tendo libertado Soure, Condeixa, Pombal, Leiria e Nazaré.
Entretanto, a frota comandada pelo Duque de Wellington (Arthur Wellesley, 1764-1852) levantara ferro de Inglaterra a 09 de Julho. O desembarque das tropas britânicas ocorreu no Cabo Mondego entre 01 e 05 de Agosto de 1808. Ao receberem a notícia, os elementos mais destacados do Batalhão Académico avançaram da região de Leiria para a Figueira da Foz, juntando-se assim às tropas de Wellington.
Bernardo António Pereira Zagalo, natural de Ovar, aluno de matemática na UC e militar, nasceu em 1780 e faleceu no ano de 1841. Em relação ao primeiro momento da história protagonizada por Zagalo, os estudantes iniciam a revolta ainda de Capa e Batina (desenho de RTorres inspirado numa litografia de Macphail, existente na BGUC), rodeando Zagalo. A abordagem fisionómica de Zagado na tapeçaria é meramente virtual, não havendo notícias de qualquer retrato conhecido daquele académico.
Aqui ocorre o primeiro erro de palmatória. Procurando conferir destaque a Zagalo, Renato Torres veste-lhe um uniforme errado (erros grosseiros na faixa peitoral e nas calças brancas). Não há elemento algum que nos diga que Zagalo não estaria de Capa e Batina no momento da insurreição. Depois, decidido organizar o Batalhão Académico no dia 23/06/1808, e constatada a impropriedade da Capa e Batina para acções de combate, logo o estudantes decidiram adoptar um uniforme integralmente preto: calça preta de alçapão com botas, polainas e espada; casaca militar de abas, em preto, com vivos a azul claro, cabeção e canhões a carmezim; barretina de sola, com duas borlas de franja prateada, penacho carmezim, uma chapa metálica com os dizeres "Voluntário académico", e uma fita amarela onde se lia "Vencer ou morrer por D. João VI." Os oficiais, e Zagalo era oficial, não podiam trazer quaisquer bandas, devendo aplicar no ombro direito uma dragona de canotão dourado. O correame era todo em amarelo.
Resta saber se houve tempo para ter prontos estes uniformes de 23 para 25 de Junho. O mais certo é o destacamento comandado por Zagalo ter avançado em trajos civis de Coimbra para a Figueira. Parece que só após a conquista do Forte de Santa Catarina, e com os estudantes que estavam de férias a correrem em força para a Universidade com vista a alistarem-se no Corpo Voluntário Académico, é que foi decidido e definido o modelo de uniforme militar a usar pelo Batalhão Académico.
O segundo núcleo fixado por Renato Torres confere destaque às gentes humildes de Montemor que participaram vitoriosamente na luta. Como cenário, o pintor escolheu a Torre da UC e a Sé Velha. A Sé Velha, além de desnecessária, contém anacronismos na escadaria nobre e na omissão do Arco da Imprensa da Universidade. Em seu lugar deveria figurar o Laboratório Químico da UC onde se fabricaram intensamente munições. A Torre da UC é elemento correcto, pois serviu para troca de mensagens entre Coimbra e os corpos miliares em marcha.
Um terceiro nucleo distinguido por Renato Torres valoriza a praia de Buarcos, o Forte de Santa Catarina e a recepção à esquadra naval britânica. Relativamente a este terceiro momento da história fixada pelo pintor parece haver falta de congruência entre o extenso título da tapeçaria, a expulsão das tropas francesas que se encontravam no Forte de Santa Catarina e o desembarque comandado por Wellington.
A narrativa plástica sugere que uma vez tomado o forte, Zagalo entrou em comunicação com a esquadra britânica e ajudou a preparar o respectivo desembarque no Cabo Mondego. A História diz-nos que a esquadra parou no Porto e só após conversações com as forças amotinadas contra Junot no Porto é que ficou decidido efectuar o desembarque no Cabo Mondego. A esquadra aproximou-se da Figueira da Foz no dia um de Agosto, estando o Batalhão Académico em operações entre Pombal e Leiria. Só no dia 5 de Agosto, de tarde, é que o Batalhão Académico soube em Leiria que o desembarque no Cabo Mondego estava a decorrer com sucesso.
Procurando concentrar num mesmo espaço e num momento único apreensível pelo olhar acções distintas em termos de espaços e de sequências temporais, Renato Torres apresenta vulnerabilidades iconográficas e de articulação espácio-temporal que o aproximam dos "cortejos históricos" fantasiados nas décadas de 1930-1940 por Leitão de Barros.
Como condensar com sucesso no mesmo espaço pictórico os seguintes acontecimentos?
-Coimbra, 23/06/1808: insurreição contra a ocupação napoleónica;
-Coimbra e Montemor, 25/06/1808: incursão militar em direcção à Figueira da Foz e recrutamento de forças camponesas;
-Figueira da Foz, 27/06/1808, conquista do Forte de Santa Catarina e expulsão do contingente francês;
-Cabo Mondego, 01 a 05/08/1808, desembarque das forças britânicas e formação inicial do exército anglo-luso.
O desejo de credibilizar o virtual heróico sobrepõe-se às insuficiências investigativas do real manipulado pelo Estado Novo. Alguns historiadores mais sensíveis ao campo da produção artística já realçaram evidentes paralelos entre a manipulação da História pelos cineastas de Hollywood e a manipulação da História pelos artistas plásticos que produziram encomendas para os regimes autoritários europeus. A ideologia é diferente, mas os objectivos da encenação que presidem ao sacrifício do real pelo virtual apresentam pontos de convergência.
Em suma, ou bem que que o pintor Renato Torres falsificou deliberadamente os acontecimentos de 1808, ou bem que o encomendador da obra não fez o trabalho de casa, ou fê-lo com menor escrúpulo.
AMNunes

sexta-feira, agosto 11, 2006


Adeus a "Xabregas" Posted by Picasa
Fotografia oriunda do acervo do Museu Académico, datável de 1930-1931, com Jorge Alcino de Morais "Xabregas" (g), José Lopes Espírito Santos (voz) e José Alves de Oliveira (violão aço). Todos eles pertenceram ao Fado Académico de Coimbra, fundado em 1930. Merecem atenção a configuração clássica da Guitarra Toeira de Coimbra e o violão de cordas de aço com as ilhargas acentuadamente baixas (dito "o bacalhau"). José Monteiro Lopes do Espírito Santo (1908-1967), abandonou as cantorias e o FAC em 1932 para se dedicar com afinco aos estudos que o guindaram a lente da Faculdade de Medicina da UC. E Espírito Santo não foi o único sócio d FAC que ascendeu a lente, pois o cantor António Augusto Ferreira da Cruz também veio a integrar os quadros da Faculdade de Letras da UPorto (História)*.
Jorge Alcino de Morais nasceu em Samões, Concelho de Vila Flor, no ano de 1908, tendo falecido na cidade de Faro aos 22 dias de Setembro de 2004.
Orfão de pai, Xabregas viveu até aos cinco anos com familiares na cidade do Porto. Dos 5 aos 10 anos esteve radicado em Trás-os-Montes. Aos 10 anos de idade regressou ao Porto, cidade onde fez uma parte do secundário num colégio particular e outra no Liceu Rodrigues de Freitas até ao ano de 1925. Colega de serenatas e guitarradas de estudantes do Liceu do Porto como Carlos Leal e Amândio Marques, Xabregas e Amândio Marques seguiram para a UC em 1925. Xabregas foi cursar Físico-Química, curso que terminou quase 10 anos depois, em 1934. O seu amigo e guitarrista Amândio Marques (1903-1987) fez Direito entre 1925-1930, não tendo deixado nome nos anais da memória da CC.
Xabregas começou a tocar os primeiros acordes de guitarra em afinação natural ainda criança, por volta dos 9-10 anos, em Trás-os-Montes, para tanto usando uma guitarra pertencente a uma sua tia.
Na 2ª metade da década de 20 (dita "Década de Oiro"), Xabregas participou em incontáveis serenatas espontâneas, fez saraus em Coimbra, Portugal regional e Galiza, fundou o FAC (1930-1938) e acompanhou as grandes vedetas dos anos 20 e 30. Eis uma pequena amostra: Paulo de Sá, António Menano, Edmundo Bettencourt, Lucas Junot, Francisco Serrano Baptista, José Paradela de Oliveira, Artur Paredes, Armando Gois, Artur Almeida d'Eça, Alexandre Sá Carneiro, Felisberto Passos, Lucena Sampaio, José Espírito Santo, António Cruz, Albano de Noronha e Luís Providência e Costa (seu 2º guitarra).
Em 1929 Xabregas efectuou uma série de gravações (possivelmente para a Parlophone), com velhos amigos do Liceu do Porto, alguns dos quais frequentavam agora a UP, mas nenhuma das matrizes chegou a entrar no mercado discográfico. Aliás, Xabregas manteve-se sempre em ligação com os antigos colegas serenateiros da fase liceal portuense. Ainda de acordo com as declarações prestadas em 1989, quando o FAC viveu uma grave crise de cantores entre 1934-1938, Jorge Xabregas trazia a Coimbra e integrava nas digressões do seu grupo vozes ligadas à Academia do Porto. Testemunhos este teor ajudam, por exemplo, a fazer luz sobre a divulgação em Coimbra de uma peça como "À Meia Noite ao Luar", aí pelos anos de 1936-1937.
Na fase inicial de Coimbra, o reportório instrumental de Xabregas assentava em peças trazidas do meio académico portuense e nas composições divulgadas por Artur Paredes, como "Si Menor", "Balada de Coimbra" e "Fado Hilário". Xabregas inseria-se na facção dos guitarristas conimbricenses que criticavam abertamente Albano de Noronha, acusando-o de plagiar o estilo de Artur Paredes. Jorge Xabregas pertenceu à chamada "escola de transição" em termos de guitarra de Coimbra. Não plagiava abertamente Artur Paredes, e também já não praticava a afinação natural nem os toques antigos de 1ª e 2ª sem harmonizações. Seguia um estilo eclético que resultava da fusão de elementos herdados da Belle Époque e do Ultra-Romantismo, aqui e ali polvilhados de resíduos fadísticos (marcantes no tom de Ré Menor), com as novidades paredianas. Foi este o estilo que mais se impôs na década de 1940, para finalmente merecer as imprecações das formações lideradas por António Brojo e António Portugal.
Terminado o curso em 1934, Xabregas começou a leccionar no Liceu de Coimbra (1936-1939), manteve-se na direcção do FAC e matriculou-se em Medicina. Mobilizado para serviço militar em 1939, esteve na Figueira da Foz (1939-1940) e no Colégio Militar (Lisboa). No ano lectivo de 1940-1941, Jorge Xabregas seguiu para Angola. Foi professor e Reitor no Liceu de Nova Lisboa, cidade onde tocou frequentemente como Carlos Figueiredo na década de 1950 (Figueiredo chegou em 1953).
Regressado a Portugal, Xabregas ainda trabalhou como Reitor no Liceu de Sintra. Após a aposentação viveu em Oeiras e em Faro.
Jorge Xabregas deixou "Fado da Noite", popularizado por Camacho Vieira e gravado por Machado Soares, "Variações em Lá Menor" (gravações APortugal e OSérgio) e as inéditas "Variações em Sol".
Fontes: testemunhos prestados pelo biografado em 15/04/1989 (Coimbra) e 08/08/2001 (Faro)
Agradecimentos: Dr. José Mendes Morais
*Armando Luís de Carvalho Homem assinou uma boa notícia biográfico-académica sobre este historiador. Vide "António Cruz (1911-1989): um Testemunho", Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. História, II Série, VI, 1989, pp. 457-469. António Cruz não seria o único a "silenciar" no seu currículo o passado ligado a "fados e guitarradas". O lente da Faculdade de Direito da UC José Carlos Martins Moreira (1895-1977), executante de violão, que gravou discos com Paulo de Sá/Elísio de Matos, também omitiu do seu currículo qualquer suspeita de ligação à Galáxia Sonora Coimbra, preferindo valorizar a sua faceta de monárquico e a empatia que lhe merecia a ideologia hitleriana.
AMNunes

quinta-feira, agosto 10, 2006


"Coimbra é uma Lição" Posted by Picasa
Rainha incontestada e sem rival entre todas as "Coimbra Spaghetti", "Coimbra é uma Lição" começou por não ser. Nem conimbricense, nem tema do universo da Canção de Coimbra.
Data de 1939 esta canção ligeira, destinada, não se sabe bem, se a banda sonora de filme, se a ensaio e montagem de um teatro de revista. A dupla de autores tinha-se distinguido desde os alvores da década, concretamente na ainda hoje cantada banda sonora do filme "A Canção de Lisboa" (1933). Escreveu os versos o letrista José Maria Galhardo e assinou a música Raul Ferrão (1890-1953). Versátil, Ferrão era Tenente Coronel, Engenheiro Químico e inspirado compositor.
A canção ficou a aguardar melhores dias, até que em 1946 Armando Miranda a integrou na banda sonora do filme "Capas Negras", estreado em 1947. Quem no filme interpretava "Coimbra é uma Lição" era Alberto Ribeiro, actor, fadista e cantor de operetas, com voz "estilo reis da rádio". Oriundo de Valongo (Ermesinde, 1920...), Alberto Ribeiro havia conquistado notoriedade como fadista em alguns cafés do Porto na 2ª metade da década de 1930, tendo transitado para o mundo do espectáculo em Lisboa. Como é sabido, o imenso sucesso atingido pelo filme em Portugal e no Brasil não foi secundado nos territórios da Academia de Coimbra.
Apesar de ensaiado directamente pela mão de Ângelo Vieira de Araújo, Alberto Ribeiro não convencia nos temas de Coimbra, e não conquistou qualquer adesão local com a sua interpretação do tema de Raul Ferrão.
Na opinião dos ressentidos estudantes de então, "Coimbra é uma Lição" era uma canção de teatro de revista tipicamente lisboeta e como tal permaneceria por meio século. A letra continha lugares comuns que não cativavam os estudantes mais desconfiados de estarem a ser aredidos com arremetidas de falsa identidade cultural. No refrão, a palavra "faculdade" estragava tudo. Em Coimbra "faculdade" usava-se com sentido muito rigoroso e restrito, sem o alcance generalista empregue em Lisboa e no Brasil, espaços onde "cursar faculdade" ou "estar na faculdade" queriam significar universidade/ou ensino superior. Insuportável aos ouvidos dos estudantes era também a voz afectada de Alberto Ribeiro, logo acusado de não perceber nada do estilo de Coimbra.
Caberia a Amália Rodrigues (1920-1999) lançar "Coimbra é uma Lição" nos circuitos internacionais do grande espectáculo, quando em 1950, integrada nos musicais de divulgação do Plano Marshall, cedeu a Yvette Giraud as bases para a futura "Avril au Portugal"/"April in Portugal".
No caso concreto da Academia de Coimbra, só após 1974 e num contexto de diluição e reinvenção da memória histórica foi possível abrir caminho à aceitação de "Coimbra é uma Lição". Tudo começa de alguma forma com uma projecção do filme "Capas Negras", no Teatro Académico de Gil Vicente", a 21 de Janeiro de 1980, integrado no programa da chamada Semana de Recepção ao Caloiro (18-26 de Jan. de 1980).
A entidade promotora era a Direcção Geral da AAC afecta à JSD, que acolhia de boamente o aconselhamento formulado por Joaquim Teixeira Santos, activo membro da AAEC. O filme era recuperado como "documento histórico", apto a ensinar aos estudantes as tradições perdidas. A partir daqui ficavam abertas as portas a uma atitude de relativização da memória histórica e de re-invenção de supostas tradições. Sucederam-se as gravações da Estudantina Universitária de Coimbra (LP "Canto da Noite", ano de 1992) , de Mário Gomes Pais com o grupo Aeminum (CD "Coimbra é uma Saudade", ano de 2002), dos Antigos Tunos da Universidade de Coimbra (CD "15 anos depois", Coimbra, 2000), e do Coro dos Antigos Orfeonistas da Universidade de Coimbra (CD "20 anos a cantar Coimbra", 2003).
Conhecendo a dimensão internacional do "Coimbra é uma Lição", José Miguel Júdice, ao tempo Bastonário da Ordem dos Advogados, instigou José Moças, da Tradisom, a realizar um levantamento de registos portugueses e estrangeiros desta canção. O resultado foi o CD COIMBRA. APRIL IN PORTUGAL. AVRIL AU PORTUGAL, Tradisom/Quinta das Lágrimas, TRAD 038, ano de 2004, com 24 amostragens repescadas entre 1947 e 2003, que passam por Amália Rodrigues, Yvette Giraud, Alberto Ribeiro, Antigos Orfeonistas da UC ou Caetano Veloso. Os textos de apresentação, bem articulados, são assinados por Maria de São José Côrte-Real.
Para ficar com uma ideia aproximada do volume de gravações que este tema tem merecido, solicitei à SPA uma relação de declarações de registos fonográficos. O rol é verdadeiramente impressionante, passando por largas dezenas de incursões: casas de fados, filarmónicas, corais, acordeonistas, orquestras ligeiras, tunas e artistas de música ligeira onde se situam nomes como Cândida Branca Flor, Roberto Leal ou Júlio Iglésias.
Deixando de lado o mundo dos corais e das tunas, haverá lugar à integração desta composição na Galáxia Sonora Coimbrã? A versão cantável não parece reunir condimentos para incursões no imediato e as versões instrumentais continuam a não cativar candidatos.
Mas os processos de construção da identidade não são imutáveis. O futuro (ou o pós-modernismo) nos dirá se José Manuel Beato foi a derradeira voz da utopia quando num vigoroso artigo jornalístico de 1992 se insurgiu contra uma gravação que vinha de fazer-se.
Agradecimentos: José Moças (Tradisom), Goreti Lopes (SPA)
AMNunes


Levar para férias... (5) Posted by Picasa
O LP "Concerto em Frankfurt", Philips 812 599-1, ano de 1983, gravado ao vivo por Carlos Paredes/Fernando Alvim em 1982, e reeditado no CD "Concerto em Frankfurt", Philips 812599-2, ano de 1990, e na antologia "O Mundo segundo Carlos Paredes. Integral: 1958-1993", Lisboa, EMI-724358030426, ano de 2002, é a escolha de Luís Carlos Santos para audição de férias. Dentre os vários temas contidos nesse disco (Canto do Amanhecer, Dança Palaciana, ect.), Luis Carlos destaca a interpretação de "Variações em Ré Menor" de Artur Paredes.
Natural de Coimbra, Luís Carlos Santos licenciou-se em Bioquímica na Faculdade de Ciências da UC em 1993. Delegado de Informação Médica, tem longo currículo como executante de viola de acompanhamento. Participou na gravação de vários discos e foi membro de grupos da Secção de Fado da AAC, como a Estudantina e a Orquestra Típica. Integrou a formação Praxis Nova. Na Secção de Fado da AAC chegou a trabalhar como monitor de viola de acompanhamento, numa época em que também ensinava guitarra nessa agremiação Ricardo Dias.
Um abraço muito comovido a este nosso amigo que à maneira de Alexandre Herculano foi cultivar... a pintura para as serranias da Lousã.
AMNunes


Levar para férias... (4) Posted by Picasa
Para ouvir em época estival, o Dr. Carlos Alberto Santos da Costa (não confundir com o cantor Carlos Costa) propõe o CD "Trova Lírica", Lisboa, Movieplay, PE 51.013, ano de 1994, com 14 faixas, 12 cantadas e 2 instrumentais. A voz é de Victor de Almeida e Silva, a guitarra e arranjos de Paulo Soares (JoJó) e a viola de Carlos Alberto Santos da Costa.
Infelizmente, o disco indicado já não se encontra disponível no mercado, pelo que nos limitámos a digitalizar uma folha de inventário do arquivo sonoro da Secção de Fado da AAC.
Na globalidade, "Trova Lírica" é um excelente projecto em termos de interpretação vocal (Victor Silva sabe utilizar muito bem o seu tipo de voz, sendo igualmente bom no lançamento das frases) e de trabalho de acompanhamento. Paulo Soares é soberbo na guitarra.
A única crítica que formulo a este disco prende-se com o facto evidente de Victor Silva se colar em excesso ao estilo vocal do último José Afonso, talvez por se identificar com o modus faciendi afonsino, talvez porque tinha acabado de participar no concurso "Chuva de Estrelas" com uma imitação de José Afonso.
Carlos A. S. Costa é natural da Póvoa de Varzim e licenciou-se na Faculdade de Direito da UC em 1985. Advogado e executante de viola de acompanhamento, foi director da Secção de Fado da AAC e fundador da Estudantina Universitária de Coimbra. Compôs o tema "Ondas do Mar da Póvoa". Participou na gravação do LP "Coimbra em Canções", dos Praxis Nova, em 1991.
Prevendo as dificuldades de acesso ao CD "Tova Lírica", Carlos A. S. Costa indica, em alternativa, uma reedição do primeiro LP de Carlos Paredes "Guitarra Portuguesa" (1ª edição de 1967).
AMNunes

ESTÓRIAS À LENTE

I.

Aqui há uns cinquenta anos havia um lente de Direito – conhecido pelas suas respostas prontas – que morava perto do cemitério da Conchada. O número do telefone era quase igual: só diferia num dos algarismos. Resultado: volta-meia-volta davam-se telefonemas lá para casa, perguntando se era do cemitério. Normalmente isto acontecia de manhã – quando o lente se encontrava na Faculdade.
Mas um dia… por qualquer razão o Mestre não teve aulas e a dado passo toca o telefone bem perto dele, que atendeu:

- É do cemitério da Conchada ?

Resposta de imediato:

- Exactamente, fala do jazigo da Família Tal-tal-tal…


II.

O dito lente era suposto ser achacado de hemorróidas. E vejam, Senhores, esta espantosa cousa de um escolar arrancar a aprovação na prova oral à pala disso…
Pois é, um aluno foi à oral com nota baixa (qualquer coisa como um oito), isto tendo estudado manifestamente pouco. Mas lá teve a brilhante ideia que o safou. Senta-se no seu lugar de examinando, perante o lente e o Juiz-Desembargador que nesse tempo (e até à década de 70) soía presidir ao júri. E de imediato põe uma expressão de dor e executa movimentos no banco, como se o sofrimento derivasse de partes retro-posteriores. O Mestre ia começar a interrogar, mais eis que repara no pequeno 'espectáculo'. E pergunta:

- O Sr. sente-se bem, está incomodado ?

Ao que o aluno retorque:

- Não, não, Sr. Doutor, não é nada…

Começa o interrogatório, com o aluno a ir respondendo, mas sempre com os mesmos esgares e movimentos. O Mestre a dado momento suspende o interrogatório, dizendo:

- Não, não, tenha paciência mas o Sr. não está bem. De que é que se queixa ? Pode voltar cá mais logo ou num dos próximos dias...

- O Sr. Doutor desculpe – diz o aluno em voz quase inaudível – mas tenho andado com um problema de hemorróidas…

- Ó Homem, e não podia já ter dito ?! Eu bem sei o que isso é, isso é um tormento ! O que é que tem tomado ?

O aluno, devidamente informado sobre cremes, pomadas e supositórios, lá indicou uns fármacos.

- Isso não dá nada, que eu já experimentei. Faça um banho local morno ao deitar e depois aplique isto assim-assim [outro fármaco] durante uma semana, e deve melhorar.

Seguiram-se umas poucas perguntas ultra-acessíveis a que o aluno foi respondendo; posto o que, despachado com 11 e «votos de melhoras»…



III.

Aqui há uns 70 anos, um lente de Medicina Legal bem conhecido pelo seu inigualável sentido de humor, viu-se confrontado com uma turma mista de finalistas de Medicina (cadeira de Medicina Legal) e de Direito (Curso Jurídico de Medicina Legal), onde os segundos alegavam grande dificuldade de acompanhamento das aulas teóricas: o que sabiam sobre o corpo humano (e só sobre isso) tinha sido aprendido até ao 2.º Ciclo do Liceu. Abordado o Mestre no termo de uma aula, este solicitamente prometeu resolver o problema, e logo a partir da aula seguinte. Na dita, começou a prelecção como segue:

- Queixam-se os Srs. de Direito da dificuldade em acompanhar as minhas exposições teóricas, dizendo nomeadamente que eu uso muitos termos e expressões técnicas. Mas o problema resolve-se: doravante, quando eu usar algum desses termos técnicos, darei de imediato a tradução para linguagem vulgar, a bem da cabal compreensão dos Srs. de Direito. Ora hoje vou começar por lhes recordar alguns pontos básicos da função digestiva. Como os Srs. sabem, os alimentos entram pela boca, onde sofrem a acção da língua, dos dentes e da saliva (cuspo para os Srs. de Direito), depois passam para a faringe (garganta para os Srs. de Direito), daí para o esófago (canal das couves para os Srs. de Direito) e chegam então ao estômago (fole para os Srs. de Direito). Aí sofrem a acção de diversos agentes químicos, posto o que passam para os intestinos (tripas para os Srs. de Direito) e depois a parte assimilável pelo organismo é absorvida através da corrente sanguínea, a parte não assimilável é expulsa para o exterior sob a forma de f… (m… para os Srs. de Direito)…



IV.

Um lente de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UP fazia regularmente a visita da enfermaria do Serviço hospitalar que dirigia, acompanhado de Colegas mais jovens, Assistentes, Alunos e Enfermeiros. Verifica aqui, toma a temperatura além, corrige a medicação acolá… Um dia chega perto de um doente com um saco de gelo aplicado no abdómen. Palpando o saco, acha que este não está à temperatura devida. E diz de imediato:

- O Sr.ª Enfermeira, este gelo está quente !

Ao que um dos Assistentes retorque:

- Perdão, Sr. Professor, mas se está quente não é gelo !
Armando Luís de Carvalho HOMEM

quarta-feira, agosto 09, 2006

PASSATEMPO (I)

Nesta secção pretendemos testar o nível de conhecimentos de alguns dos mais assíduos leitores do Blog "guitarradecoimbra". Os leitores interessados poderão responder às perguntas abaixo formuladas, enviando as soluções através de "comment", seguidas da respectiva identificação. As respostas correctas, acompanhadas dos nomes dos participantes, serão colocadas à frente de cada questão.
1 - Que figura da CC ficou conhecida pela alcunha de PAPÍZIO?
Tavares de Melo, de seu nome completo Eduardo Manuel Tavares de Melo
2 - Naturalidade:
Vila Franca do Campo, Ilha de São Miguel, Açores
3 - Data de nascimento:
Dia 05 de Janeiro de 1924
4 - Curso frequentado na UC:
Direito (de 1942 a 1951)
5 - Organismos académicos de que fez parte:
Orfeon Académico e TAUC
6 - Identificação dos instrumentos musicais de que foi executante:
Contra-baixo na TAUC e violão de cordas de aço em grupos de CC
7 - Composições de que foi autor:
Incerteza, Quando os Sinos Dobram, rudimentos de Canção do Mar (registo Camacho)
8 - Profissão:
Esporadicamente advogado, foi notário no Nordeste, Povoação, Ribeira Grande e Ponta Delgada
9 - Óbito:
Ponta Delgada, no dia 27 de Agosto de 1992
Bom Trabalho!
AMNunes


Levar para férias... (3) Posted by Picasa
Para pachorrenta (ouvir e reescutar, com a calma de quem está longe do stresse) audição de férias, Rui Lopes sugere o CD "António Portugal. António Brojo. Variações Inacabadas", Lisboa, EMI-Valentim de Carvalho 7243 8 31729 2 4, ano de 1994.
São 18 peças instrumentais para Guitarra de Coimbra, com paragens em Manuel Rodrigues Paredes, José Maria Amaral, António de Almeida Santos, Artur Paredes, Alfonso Correia Leite, Flávio Rodrigues da Silva, António Pinho de Brojo, Carlos Paredes, João Carlos Bagão Moisés, Augusto Hylario da Costa Alves, António Abreu de Almeida Carvalhal e António Jorge Moreira Portugal (erro de autoria na faixa 5, que é de José Elyseu, e na 4, de Artur Paredes).
Natural de São Miguel de Rio Torto, Concelho de Abrantes, licenciado em História pela Faculdade de Letras da UC (2001), Rui Lopes pós-graduou-se em Ciências Documentais, sendo funcionário do Arquivo da Escola Superior de Enfermagem Dr. Ângelo da Fonseca (Coimbra). Executante de guitarra, integrou o grupo Saudades de Coimbra fundado em 1983 na cidade de Abrantes por José Amaral.
Rui Lopes licenciou-se com um Seminário sobre Manuel Rodrigues Júnior, mal conhecido e pouco estudado Ministro da Justiça na fase de instauração e legitimação do Estado Novo, cujo resumo se encontra publicado. Escreveu um artigo sobre José Amaral ("José Amaral: um Guitarrista de Coimbra em Abrantes", revista ZAHARA, Nº 6; republicado neste blog em 03/12/2005). Interessa-se particularmente pela vida e obra artística de Lucas Rodrigues Junot, a propósito de quem tem estabelecido contactos no Brasil com vista ao resgate de informações e documentação que importam à Galáxia Sonora Coimbrã.
AMNunes


Levar para férias... (2) Posted by Picasa
De férias, mas cheio de trabalho, Adamo Caetano sugere como disco de audição imprescindível em tempos de descanso o CD "Prospecção", editado em 2004, com Jorge Machado (voz) e Fernando Marques/Pedro Nunes (gg) e Manuel João Vaz (v).
Este disco foi galardoardo com o 1º Prémio de Inéditos Edmundo Bettencourt da Câmara Municipal de Coimbra em 2004, tendo aparecido no mercado durante o 1º semestre de 2005.
Natural de Ançã, formado em Biologia no ano lectivo de 1999-2000 pela UC, Adamo Caetano é Técnico de Informática no Departamento de Engenharia Química da UC. Antigo Presidente da TAUC e ainda hoje sócio daquele centenário organismo, Adamo Caetano colocou a viola de acompanhamento debaixo da cama e canta no Grupo de Fados da TAUC.
AMNunes


Levar para férias...(1) Posted by Picasa
A caminho de férias, o guitarrista Fernando Marques sugere como disco de CC imprescindível para tempo de descanso "Canções do Mar e da Vida", editado pela primeira vez em 1969, remasterizado no CD "Dr. Luiz Goes. Canções do mar e da Vida", Lisboa, EMI-Valentim de Carvalho 7243 8 33480 22, ano de 1995.
Formado em Sociologia pela Faculdade de Economia da UC em 1995, premiado com o 1º galardão de inéditos Edmundo Bettencourt da CMC, Fernando Marques lecciona Sociologia em Santa Comba Dão e está a redigir uma tese de Mestrado sobre "O ensino da guitarra em Coimbra", orientada pela Prof. Doutora Teresa Pessoa (Faculdade de Psicologia da UC, Ciências da Educação).
Merecidas férias a este nosso amigo, pois em ano escolar de leviatânica "tolerância zero" aos professores, e com a tutela a namoricar o putrefacto conceito de "fascismo amigável" bebido no conselheiro de F. Roosevelt, Bertam Gross, os tempos são de inquietante "pedagogia da disciplina" (João Paraskeva, docente da Universidade do Minho, fala em "espectro da docentofobia", in "A Página da Educação", Ano XV, Nº 159, Agosto/Setembro de 2006, pág. 38).
AMNunes


Tradições musicais da Pampilhosa Posted by Picasa
Contracapa do folheto do CD "Pampilhosa. Tradição Musical", Lisboa, Estúdios Valentim de Carvalho, ano de 2002, num trabalho do GEDEPA (Grupo Etnográfico de Defesa do Património e Ambiente da Região da Pampilhosa/Mealhada).
A fotografia em destaque foi captada no escadório de uma casa rústica do século XVI, recuperada pelo GEDEPA e transformada em museu e centro de documentação. O GEDEPA edita regularmente a revista "Pampilhosa", efectua recolhas arqueológicas, documentais, orais e utensílios do quotidiano rural, faz teatro, reconstitui tradições populares caídas em desuso, desenvolveu acções de promoção dos gaiteiros e de recuperação do "Guitarrinho de Coimbra", tendo prestado apoio às recolhas do Dr. José Alberto Sardinha.
O disco contém 23 faixas sonoras, correspondendo a pregões tradicionais populares de artes, ofícios e mercadorias os números 1 (pichéis e capachos), 4 (fruta e água), 7 (chinelos e semente), 10 (areia fina e carqueja), 13 (bolos e jornais), 19 (tremoços e pirolitos) e 23 (babanis). Aliás, a jóia da coroa deste trabalho de recolha e reconstituição radica na riqueza e diversidade dos pregões populares.
Há modas de canto e dança que remetem o auditor para o Minho e o Douro Litoral, como sucede com os registos nº 3 (Tirana) e 17 (Loureiro). Outras modas são comuns ao cancioneiro da Região de Coimbra, com incidências em Penacova/Lorvão. O "Vira da Nossa Terra" obedece ao padrão rítmico clássico em ternário composto, com ares de família do "Vira de Coimbra" mais ancestral. O "Maneio "(nº8) era bailado nas Fogueiras de Coimbra com grande folgança. O "Abracito" é uma variante do conimbricense "Abracinho" (O Salgueiro à borda d'água). Quanto ao "José Retratado" (nº 18), quase poria um dedo no fogo para jurar que veio do Largo do Romal, dos tempos em que Adelino Veiga dava cartas, o mesmo acontecendo com o "Nó da Gravatinha" (gravado pelo grupo numa cassete pela década de 1980). No tema "Prima" (nº 21) as solistas empregam um lançamento de voz natural muito interesssante para quem tem informações sobre a forma como as mulheres de Coimbra interpretavam temas de serenata. E como se pode aferir por este exemplo, não eram propriamente vocalizações coladas ao Fado de Lisboa, ao Soul ou ao Jazz.
O GEDEPA ostenta um longo percurso, pautado por objectivos que visam melhorar a qualidade do seu espectáculo, a diversificação do reportório, a credibilização dos trajos populares e da sua tocata. Em geral, os objectivos traçados pelas várias direcções eleitas traduziram-se na melhoria dos resultados. Contudo, e falando da tocata, há ainda um excesso de acordeão que importaria relativizar. O acordeão não deve acompanhar todo o reportório, nem ficar no mesmo alinhamento dos cordofones pelo efeito de abafamento que provoca. Uma das mais valias implementadas pelo GEDEPA no ano de 2006 consistiu na aquisição de uma Viola Toeira.
De todas as modas gravadas no disco de 2002, destacamos a letra do tema nº 9, "Mariquinhas", com alusões ao imaginário estudantil que tão fortemente marcou Coimbra e povoados circunvizinhos. Trata-se de uma moda tonal, com estrutura estrófica muito vincada.
***
MARIQUINHAS
Mariquinhas como passou?
Olé, como tem passado?
Tenho corrido mil terras
Não a tenho encontrado.
==
Não a tenho encontrado
Lá nos campos de Coimbra
Disseram os estudantes:
Oh que menina tão linda!
==
(Ai) Oh que menina tão linda
Oh que menina tão bela
Disseram os estudantes
Eu hei-de casar com ela!
==
Mariquinhas como passou?
Olé, como tem passado?
Eu tenho passado bem
Estimo tê-la encontrado!
==
Agradecimentos: Dr. José Machado Lopes
AMNunes


O Diálogo do Gaiteiro Posted by Picasa
Em Outubro de 1988 o Grupo Etnográfico de Defesa do Património e Ambiente da Região da Pampilhosa (Mealhada) promoveu umas jornadas culturais sobre o "Gaiteiro". Um inquérito à tradição popular deu a conhecer este curioso "Diálogo do Gaiteiro":
***
-a caixa grita: "carne assada, carne assada, carne assada!"
-a gaita geme: "Pão e vinho, pão e vinho, pão e vinho!"
-o tambor rufa: "é tão bom, é tão bom, é tão bom!"
***
Fonte: contracapa da publicação "Pampilhosa. Uma Terra e um Povo. Revista do Grupo Etnográfico de Defesa do Património e Ambiente da Região da Pampilhosa", Nº 8, Maio de 1989. Exemplar oferecido pelo Dr. José Machado Lopes
AMNunes

terça-feira, agosto 08, 2006

Duas historietas para férias
Por António M. Nunes
*****
Os Três Estudantes e o Juiz
Era uma vez três estudantes que iam para as casas das suas famílias passar férias. No caminho encontraram um lobo morto. Pararam, e mirando a carcassa disse um deles:
-Este lobo merece um necrológio a preceito!
-Ó se merece! Aquele que fizer o verso mais bem feito a este lobo finado não pagará o jantar na estalagem - disse outro.
-Mãos à obra, acrecentou o terceiro, e logo declamou:
==
Aquele lobo
Por onde andou
Quanto comeu
Nada pagou!
==
Saiu-se o condiscípulo prontamente:
==
Este lobo
Quando era vivo
Tudo comeu cru
E nada cozido!
==
Acrescentou o terceiro estudante (que fora o autor da graçola):
==
Quando este lobo
Dormia a sesta
Não dormiu nunca
Uma como esta!
==
E remataram os três em coro:
==
Eis aqui um lobo
Pelo que manifesta
Das suas jornadas
A pior foi esta!
==
Depois de improvisarem as coplas, os três estudantes enredaram-se em questiúnculas, pois cada um pretendia que os seus versos fossem considerados os melhores. Afastada qualquer possibilidade de acordo, os estudantes foram procurar o Juiz da terra e expuseram-lhe o pleito.
-O Meretíssimo há-de dizer-nos qual dos versos é melhor, para sabermos qual dos três comerá o jantar de graça.
Ouvidas as coplas, respondeu o Juiz:
-Estão todas as quadras bem feitas, com pilhas de graça.
E recitou o esperto Juiz:
==
Pelo que os senhores dizem
E eu vejo nos autos
Os três paguem o jantar
E comeremos quatro.
==
Os estudantes fingiram aceitar a sentença. Mas sentindo-se ludibriados pelo artilheiro Juiz, combinaram entre si enganá-lo. Chegados à estalagem encomendaram um jantar para quatro e em segredo pediram à cozinheira que cozesse um paio e o pusesse na mesa cortado em três pedaços iguais.
Sentados os três estudantes e o Juiz à volta da mesa, um dos estudantes espetou o garfo num dos nacos do paio e declamou:
==
Em nome do Padre
Este me cabe!
==
O segundo estudante fez o mesmo, dizendo:
==
Em nome do Filho
Este seja comigo!
==
O Juiz vendo no prato só um naco de paio, agarrou-se a ele gritando:
==
Em nome do Espírito Santo
Antes que fique em branco!
==
Com esta rápida "acção executiva" o esperto Juiz lembrou-se dos tempos em que também fora estudante.
*****
Este conto popular foi recolhido da tradição oral por Francisco Adolfo Coelho, "Contos Populares Portugueses" (1ª edição de 1879), 6ª edição, Lisboa, 2001, págs. 263-264 ("Os três estudantes e o soldado"). A versão Afolfo Coelho foi recolhida junto de uma pessoa oriunda de Almeida, então a viver em Lisboa. Contracena com os três estudantes um magala espertalhão. A versão que apresentamos resultou de um cruzamento com outra mais completa e verosímil, recolhida por Teófilo Braga, "Contos Tradicionais do Povo Português", Volume I, 6ª edição, Lisboa, Dom Quixote, 2002, págs. 340-341 ("A graça estudantesca"), cuja primeira edição ocorreu em 1883.
Esta saborosa historieta, cuja linguagem foi alvo de actualização, deve remontar aos séculos XVII/XVIII.
*****
Os Estudantes e o Burro do Azeiteiro
Dois estudantes encontraram numa estrada um humilde azeiteiro que guiava um burro carregado de bilhas de azeite.
Os estudantes, que estavam sem dinheiro no bolso, viram naquele inesperado encontro uma maneira fácil de gozarem o azeiteiro e de lhe furtarem o burro e o azeite para revenda.
Enquanto o pobre homem seguia sossegadamente seu caminho com o pachorrento burro pela arreata, um dos estudantes foi-se ao burro, tirou-lhe a cabeçada e enfiou-a na sua própria cabeça e pescoço, enquanto o companheiro fugia com o jumento sorrateiramente.
O estudante que tomara o lugar do jumento estacou a marcha, fazendo com que o azeiteiro olhasse para trás. Qual não foi o espanto do burriqueiro quando viu um homem no lugar do seu jumento.
Vendo-o confuso, o estudante encabeçado disse-lhe com voz doce e terna:
-Ah, senhor, quanto lhe agradeço ter-me dado uma cacetada na moleirinha! Quebrou-me o encanto que durante tantos anos me fez passar por burro!...
O azeiteiro, crente no logro do burro enfeitiçado, tirou o chapéu e cumprimentando o estudante disse-lhe muito humildemente:
-Perdi no senhor, como burro, o meu ganha-pão; mas, paciência! Como homem que agora é, peço-lhe muitos perdões pelas vergastadas no lombo, mas, que quer?! O senhor fazia-me às vezes desesperar com as suas birras, e eu não era senhor de mim!
-Está perdoado, bom homem!, respondeu o estudante. O que lhe peço agora é que me deixe em paz!
Vendo-se só, sem jumento nem carregamento, o azeiteiro lamentou-se da sua desgraça e tratou de pedir dinheiro emprestado a um compadre para ir no dia seguinte à feira comprar outro burro.
Chegado à feira, o azeiteiro viu à venda o animal que lhe fora roubado na véspera, ao cuidado do outro estudante cuja cara não chegara a ver. O ingénuo azeiteiro não percebeu logo que era o seu animal e crente que o Burro-Homem se tinha transformado novamente em jumento, chegou-se ao pé do estudante e pediu-lhe licença para dizer um segredo ao burro. O estudante aceitou e o azeiteiro, chegando a boca à orelha do animal, gritou com toda a força:
-Olhe, senhor burro, quem não o conhecer que o compre!
*****
Divertida historieta recolhida da tradição oral por Francisco Adolfo Coelho, "Contos Populares Portugues", 6ª edição, Lisboa, Dom Quixote, 2001, págs. 271-272 (1ª edição de 1879), cujo título é "O burro do azeiteiro". Relato fornecido por pessoa oriunda de Almeida, então a residir em Lisboa. Admitimos que existisse uma versão coimbrã mais completa. O relato original respeitará aos séculos XVII/XVIII.

segunda-feira, agosto 07, 2006

PERDIDOS E ACHADOS
Títulos e letras cujas melodias são dadas por perdidas
Por José Anjos e Carvalho e António Manuel Nunes

O presente tentame de inventariação respeita a uma pequena amostragem de espécimes cantáveis da Galáxia Sonora Coimbrã cujas melodias se consideram perdidas. Admitimos que algumas das letras, ou partes delas, alinhadas nas secções de peças estróficas e com refrão pudessem cantar-se com melodias ainda hoje conhecidas, sobretudo em épocas em que a transmigração de coplas soltas constituiu expressão dominante.
Daí que, em determinadas situações, não seja claro se todos os títulos e letras tiveram melodia própria, ou se alguma dessas melodias chegou ao presente gravada com letra diversa da original. Para não nos perdermos em exemplos, na década de 1920, o título “Inquietação” (Quanto mais foges de mim), chegou a ser baptizado com 6 títulos e 6 letras diferentes. A indicação da autoria desta obra oscilou nos discos conhecidos entre o “popular” e a remissão correcta para Alexandre Rezende.
O arrolamento dos verbetes resultou do cruzamento dos inventários informáticos dos dois autores, tendo seguido as tipologias de catalogação onde foram detectadas as lacunas musicais. Alguns dos títulos indicados poderão não estar inteiramente correctos, ou resultar da conversão oral de incipits (=1º verso) em títulos (ex: o “Fado dos Passarinhos”, vulgarmente identificado como “Passarinho da Ribeira”).
As composições “estróficas/com uma só parte musical)” e com “coro/e ou refrão” foram elencadas alfabeticamente. O último lote averba apenas composições especificamente ligadas a récitas estudantis de despedida de cursos, muitas delas com coro, cuja arrumação segue o critério cronológico e não o alfabético.
Um primeiro dado a salientar nesta recolha prende-se com o facto de não terem sido averbadas omissões dignas de nota em secções como “peças com duas partes musicais”, e “sonetos e sonetilhos”. Como se pode concluir a partir da amostragem, as lacunas mais relevantes promanam de secções como “composições estróficas”, “composições com coro/e ou refrão”, passando pelos espécimes ligados às despedidas dos quintanistas e sextanistas da UC.
Pensamos que este dado é relevante, na medida em desmistifica a velha e persistente crença de um reportório coimbrão quase exclusivamente centrado em monodias estróficas. Por outro lado, a organização deste pequeno inventário visa chamar a atenção para lotes significativos de reportório perdido. Assim, relativamente à década de 1890, remanescem notícias de muitas composições de Manuel Mansilha que estão dadas como inacessíveis. Um desses espécimes é o afamado “Fado Mansilha”. Suspeitamos que outras peças cantáveis do referido compositor entraram no século XX em discos de 78 rpm de cantores como Avelino Baptista, Luiz Macieira e Almeida Cruz (não activos em Coimbra).
Para a década de 1930 também há notícia de duas composições de Felisberto Passos cujo rasto se terá perdido. Divaldo Gaspar de Freitas refere ainda, para a mesma década, um espécime não resgatado que conheceu farto aplauso: “O Noivado de Maria”.
Não querendo entrar em leiras que não são da nossa lavra, seja-nos permitido questionar o facto de a maior parte das formações juvenis coinimbricenses em fase de gestação e de afirmação optar quase invariavelmente pelas mesmas amostragens reportoriais (mas, ecletismo e incidência sobre o mesmo tipo de reportório não são tiques comuns à generalidade das formações mais maduras?).
A comprovada existência de tantos grupos de feição eclético-generalista poderia constituir um incentivo à especialização de formações vocacionadas para trabalhos de recolha. Além das formações generalistas, faz todo o sentido que alguns grupos se especializem em recolhas, reconstituição de espécimes esquecidos, dedilhação de cordofones caídos em desuso e resgate aprofundado de uma determinada época ou de um certo compositor.
O sonho de uma antologia sonora integral, à maneira do projecto “Tempos de Coimbra” (1984), gizada pela formação António Brojo/António Portugal é hoje desaconselhado a todos os títulos.
Nos tempos que correm, e estando disponíveis amostragens de fontes sonoras esquecidas, faria todo o sentido surgirem trabalhos de fundo do género “Hylario e a sua época”, “A Canção de Coimbra no tempo de José Dória e João de Deus”, “O Reportório de Francisco Menano”, “A obra coimbrã de Paulo de Sá”, “Temas em voga na década de 1930”, etc..
Apenas e só para ilustrar a paisagem sonora dos cordofones, seria importante arranjar uma boa justificação para o facto de ainda não ter aparecido nenhum projecto áudio-visual demonstrativo da função, lugar e singularidade dos toques de instrumentos como a Guitarra Inglesa, A Guitarra Toeira de Coimbra e a Viola Toeira.
A persistente ausência deste tipo de trabalhos começa a levantar interrogações. Afinal para que servem, qual o real valor e marca distintivo-qualitativa de tantas formações no activo? Que papel podem continuar a desempenhar as escolas de formação enquanto mais valias no alargamento dos horizontes dos seus formandos? Os silêncios que este campo tem vindo a atravessar nos últimos 20 anos não é justificável, em nosso entender, com argumentos como a falta de maturidade das formações estudantis/juvenis, a ausência de apoios financeiros ou o não estar na natureza das escolas de ensinança a recolha, estudo e salvaguarda de reportório caído em desuso.
Independentemente da valia musical das peças noticiadas, solicitamos aos leitores do Blog que, no caso de possuírem quaisquer dados relevantes aptos a permitirem a respectiva transcrição musical, nos façam chegar os fundos melódicos eventualmente existentes ao proprietário do blog.


I – Reportório Estrófico

CEGUEIRA MINHA
Música: João Carlos Bagão Moisés
Letra: Leonel Carlos Duarte Neves
Incipit: Na noite cheia de mágoas
Origem: Lisboa
Data: 1953

Na noite cheia de mágoa,
Guitarras gemem nas ruas...
Sei lá se o Mondego é de água
Ou é de lágrimas tuas?!

Cegueira minha de rastos,
No céu ainda há estrelinhas,
Sei lá se as estrelas são astros
Ou são as saudades minhas?!

Composição musical estrófica. Estes são os primeiros versos especificamente destinados a temas da Canção de Coimbra, título e letra integrais, que foram feitos pelo Dr. Leonel Neves para o seu amigo João Carlos Bagão, corria o ano de 1953. Segundo testemunho prestado pelo Dr. Leonel Neves, na sua casa de Odeáxere, Algarve, no Verão de 1995, este tema não chegou a ser gravado. Mais tarde, o Dr. Augusto Camacho alterou o título e letra e bem assim a música e veio a gravá-lo, na forma e título por que é conhecido, Serenata (Na noite cheia de mágoa), em 1992, com acompanhamento de António Brojo/António Portugal (gg) e Aurélio Reis/Luís Filipe Roxo (vv).

CHUVA DE ESTRELAS
Música: autor(es) desconhecido(s)
Letra: autor(es) desconhecido(s)
Incipit: Houve uma chuva de estrelas

Houve uma chuva de estrelas
Numa noite de luar,
Caíram duas dentre elas
E nasceu o teu olhar.

Teus lindos olhos são sonhos
Que a noite conta ao luar,
Sonhos que a lua me conta
E que ando sempre a sonhar.

Não descortinámos qualquer fonte musical relativa a este espécime, pelo que não se apresenta a respectiva solfa. Não sabemos se o título indicado seria o original. José Anjos de Carvalho lembra-se que esta composição era cantada na década de 1940, mas não consegue trautear a melodia.

FADO
Música: Luís Pinto de Albuquerque Stockler
Letra: Afonso Lopes Vieira
Incipit: Olhos que a mim me perdeis
Origem: Coimbra
Data: 1899

Olhos que a mim me perdeis,
Que me encheis
Todo de luz e de graça;
Tende piedade de mim
Sendo assim
Engraçados dais desgraça.

Olhos verdes, olhos verdes,
Vejo-os, olho-os
De os olhar ando cego;
Verdes como as minhas mágoas,
Como as águas,
Que leva o rio Mondego.

Cantai as minhas cantigas,
Raparigas,
Que a cantar mais lindas sois;
Dizei-as aos namorados,
E, casados,
Às vossas filhas depois.

Composição musical estrófica. Espécime referido na História do Fado, de Pinto de Carvalho (Tinop), a págs. 284 e 285. Esta serenata estrófica fazia parte das canções do Orfeon Académico de Coimbra em 1900. Fora composta em 1899, por altura dos festejos do Centenário da Sebenta. Não detectámos rasto algum da respectiva melodia.

HEI-DE ENCONTRAR QUEM ME QUEIRA
Música: José Paradela de Oliveira?
Letra: autor não identificado
Incipit: Hei-de encontrar quem me queira
Data: década de 1930


Hei-de encontrar quem me queira,
Quem me trate com carinho,
Com ternura e com paixão;
Quem leve a existência inteira
Velando para que a dor
Não fira meu coração.

Trago a minha alma escondida
Muito pura e muito bela,
Divina esperança a cantar!
Esperança que é minha vida;
É como a luz duma estrela
Em noite escura, a brilhar.

E nesta esperança a viver,
Sinto a ventura sorrir,
Sou mais feliz que ninguém;
Mas se ela um dia morrer,
Se essa esperança me fugir,
Foge-me a vida também.

Faltam-nos dados sobre este tema que andou em voga na década de 1940. O título proposto pode não estar correcto. Num apontamento de Fernando Murta Rebelo, datado de 12-01-1983, estas eram, com ligeiras variantes, as três estrofes que constituíam esta canção, apontamento que tinha ainda a indicação de Paradela de Oliveira ser o seu «criador» e de se cantar no tom de Mi menor. Desconhecemos se algum antigo estudante de Coimbra sabe cantar esta composição.

OS OLHOS QUE VI A CHORAR
Música: autor(es) desconhecido(s)
Letra: autor(es) desconhecido(s)
Incipit: Os olhos que vi a chorar


Os olhos que vi a chorar,
Tão tristes que até chorei,
As mágoas são de meu penar
Os olhos que tanto amei.

Viverei para adorar
Os olhos negros de alguém,
A saudade está a findar,
Com ela findo eu também.

Não é inteiramente seguro que o título transcrito seja o original. Sabe-se que era uma composição difundida nas serenatas da Emissora Nacional, na 2ª metade da década de 1940. Não encontrámos nenhum antigo estudante que declarasse conhecer a melodia.

PORQUE ÉS TÃO GRANDE SAUDADE
Música: autor(es) desconhecido(s)
Letra: autor(es) desconhecido(s)
Incipit: Porque és tão grande, saudade

Porque és tão grande, saudade!
Porque me fazes penar
Se a minha boca é somente
Para alguém de quem gostar.

Esses teus lábios de sonho
Que não mais tornei a ver,
Como posso andar risonho
Se só me fazes sofrer?!


O título merece-nos algumas reservas. As coplas podem ser de autores diferentes. Seria um tema cantado na década de 1940, cuja melodia não conseguimos recolher.

PRIMEIRO FADO
Música: Luís Pinto de Albuquerque Stokler
Letra: autor não identificado
Incipit: O meu amor, que esquisito...
Origem: Coimbra
Data: ca. 1896-1898

O meu amor, que esquisito...
Sendo rosa desmaiada,
De cada vez que a fito
Torna-se logo encarnada!

Sei os segredos das rosas,
Da branca e da encarnada.
A encarnada anda d’amores;
Da branca não digo nada...

Espécime estrófico da autoria de Luís Pinto de Albuquerque, músico que em 1899-1900 foi regente do Orfeon do Centenário da Sebenta. Não foi possível aceder à partitura, publicada por volta de 1900 na casa Moreira de Sá, com dedicatória a Alexandre Rey Colaço. Transcrição da letra a partir de Alberto Pimentel, A “triste canção do sul”, Lisboa, 1904, pág. 277. Rey Colaço era das amizades de Albuquerque, tendo-lhe dedicado em 13/09/1895 o “Fado Pintasilgo”.

RUAS ESTREITINHAS DA ALTA
Música: autor(es) desconhecido(s)
Letra: autor(es) desconhecido(s)
Incipit: Ruas estreitinhas da Alta

Ruas estreitinhas da Alta,
Que eram só minhas e tuas,
Mas desde que tu partiste
Que largas são essas ruas.

Escadas do Quebra-Costas,
Que eu descia a correr,
Mas desde que tu partiste
Ao subi-las, quero morrer.

Não foi possível arranjar mais elementos sobre este tema que se cantava na década de 1940. Pena é que as bobines de fita de aço da Emissora Nacional, onde eram gravadas as serenatas de Coimbra na 2ª metade da década de 1940, tenha sido desgravadas e reutilizadas pelos técnicos daquela estação de rádio, pois a sua audição poderia ajudar a desfazer algumas das dúvidas aqui apresentadas.

ÚLTIMO FADO
Música: José Augusto Coutinho de Oliveira
Letra : Eugénio de Albuquerque Sanches da Gama
Incipit: A minha tristeza é tanta
Origem: Coimbra
Data: 1919

A minha tristeza é tanta,
A minha dor é tão forte,
Que a mim apenas me encanta
O pensamento da morte!

Vai tão longe a mocidade,
Vejo tão perto o meu fim,
Que, às vezes, dá-me vontade
De deitar luto por mim!...

Estas duas quadras encontram-se no livro de versos de E. Sanches da Gama, Pela Vida Fora, a págs. 124 e 125. No original, o 2º verso da 2ª quadra é assim: “Sinto tão perto o meu fim”. Esta composição foi editada em partitura impressa na Casa Armando de Sousa, de Coimbra, mas até a momento não foi possível encontrar qualquer exemplar.

II – Reportório com Coro/ou Refrão

BARQUINHA
Música: autor desconhecido
Letra: autor desconhecido
Incipit: Linda barquinha
Origem: Coimbra
Data: década de 1930?

Linda barquinha
Voga no mar,
Como andorinhas
Sempre a voar.

Trilam as aves
Lá nos silvados,
Trovas suaves
Cantos dourados.

ESTRIBILHO
Falam de amor
As camponesas,
Por entre flores
Suas devesas.

As mariposas
De lindas cores
Beijam as rosas
Aos seus amores.

Barcarola com letra impressa no folheto “Canções Populares do Rancho de Tricanas de Coimbra”, sem data, proveniente do espólio de José Lopes da Fonseca (Trego). Melodia desconhecida.

FADO
Música: Álvaro Teixeira Lopes (1870-193…)
Letra: A Gonçalves da Cunha
Incipit: És a cruz da minha vida
Origem: Coimbra
Data: ca. 1925-1927

És a cruz da minha vida
Meu Calvário todo abrolhos;
Mas à vida assim vivida,
Quero mais que à luz dos olhos.

Quem tiver penas de amor,
Não as diga, esconda-as bem;
Pois não há quem sinta a dor,
Como a sente quem a tem.

CORO
Ninguém ama, ninguém canta,
Ninguém sofre, ninguém reza,
De alma ingénua, firme e santa,
Como a gente portuguesa.

Espécime impresso, sem partitura, no folheto “Canções do Rancho Infantil da Rainha Ranta Izabel”, Coimbra, 1932. Melodia desconhecida. A 2ª quadra e o coro foram publicados no livro de Gonçalves da Cunha, “Trovas de Coimbra”, Coimbra, Livraria Cunha, 1931, a págs. 95 e 104.

FADO
Música: autor desconhecido
Letra: popular
Incipit: Tudo passa neste mundo
Origem: Coimbra
Data: década de 1930?

(homem)
Tudo passa neste mundo
Tudo esquece até a dor,
Só não esquece nem passa
Um saudade d’amor.

(mulher)
Isto quem anda d’amores
Tem de ficar no seu posto.
Suportar, rir as dores
Andar doente por gosto.

(homem)
Palminho de cara lindo
Carinha de lindo jeito,
Que linda medalha davas
P’ra gente trazer ao peito.

(mulher)
Amo-te muito, hei-de amar-te,
Não me sacio, acredita,
Que a rede do amor é feita
Duma saudade infinita.

CORO
Deixai-me cantar o fado
Não faço mal a ninguém,
Eu canto só p’ra espalhar
Mágoas que me dá meu bem.

Canção com letra impressa no folheto “Canções Populares do Rancho de Tricanas de Coimbra”, sem data. Melodia desconhecida. Parece ser um tema forçado no âmbito do teatro de revista local. A 1ª quadra é popular e consta das recolhas de Carlos Martins, “Cancioneiro da Saudade”, Lisboa, Tipografia Fernandes, 1920, pág. 157. Uma outra variante desta copla é muito cantada a Ilha Terceira, no tema “Saudade”. A 2ª quadra, igualmente popular, figura em recolhas impressas. A 3ª quadra anda nas recolhas de José Leite de Vasconcelos, “Cancioneiro Popular Português”, Volume I, pág. 131, e foi gravada em disco por António Menano. A 4ª quadra é uma variante da impressa no já referido cancioneiro de Carlos Martins, pág. 55.

FADO DA SAUDADE
Música: Mattos Miguens
Letra: popular
Incipit: Vivo triste pensativa
Origem: Coimbra
Data: 1914

Vivo triste pensativa,
Cuidosa, dando ais;
Desejosa de saber,
Meu amor, por onde andais?

Da minha janela rezo
À Senhora das Areias,
Que me traga o meu amor
Que anda por terras alheias.

CORO
Se as saudades matassem
Muita gente morreria,
Mas as saudades não matam
Se não ao primeiro dia.

A cobra nasce no mato,
Lá se cria e lá padece;
Quem dá confiança a homens
Grande castigo merece.

Este era o segundo número musical da opereta “Entre Duas Avé-Marias”, texto original de Ernesto Donato, com versos de Mattos Miguens. A encenação e estreia ocorreram em 1914, tendo o produto revertido a favor da Cantina Escolar Dr. Bernardino Machado. A solfa desapareceu, mas as coplas foram dactilografadas e anotadas por José Lopes da Fonseca (Trego) em 1951, facto que permitiu a sua recolha em Julho de 2003. J. P. de Mattos Miguens, formado em Direito, advogado, poeta, jornalista e compositor musical, faleceu em 25 de Março de 1930, conforme notícia inserta no “Brado Académico” de 31 de Março de 1930, pág. 2. Era Director do jornal conimbricense “O Despertar” e advogado na comarca de Pombal.

MONDEGO ENAMORADO
Música: Miguel Guenaga
Letra: Joaquim de Almeida
Incipit: Mondego p’ra onde vais
Origem: Coimbra
Data: 1922

Mondego p’ra onde vais
No teu lento caminhar?
Venho de longe, da Serra,
E vou seguindo p’ró Mar.

Ó meu pobre caminheiro,
Porque vais tu a chorar?
É p’las saudades que sinto
Dum amor que vou deixar.

CORO
Vinha comigo a Alegria,
Aqui a deixo ficar,
Tristemente vou seguindo,
Pois não torno a voltar...
Mas aos salgueiros eu peço
Que te fiquem a guardar...
Coimbra quem pode ver-te
Sem por ti se apaixonar!

Balada estreada pelo Rancho Infantil da Praça Velha nos festejos da Rainha Santa Isabel, em Julho de 1922. Letra impressa no folheto “Canções do Rancho Infantil da Rainha Santa Izabel”, Coimbra, 1932, pág. 3. Não foi possível aceder à respectiva melodia.

NOITE DE MAIO
Música: Alice de Almeida
Letra: E. Miranda
Incipit: Do alto céu o luar
Origem: Coimbra
Data: década de 1920

Do alto céu o luar
Mandou para a terra um beijo
Andam risadas no ar
Amor... um sonho... um desejo...

Treme a folhagem... as rosas
Ouvem segredos sem q’rer...
Tantas coisas mist’riosas
Que nem as sabem dizer...

CORO
Soluça a água nas fontes,
Murmura o rio baixinho
Das altas serras, dos montes,
Desce o luar de mansinho.

Serenata impressa no folheto “Canções do Rancho Infantil da Rainha Santa Izabel”, Coimbra, 1932, sem partitura.

III – Reportório de Récitas de Despedida de estudantes da UC

BALADA DA DESPEDIDA DOS QUINTANISTAS DE DIREITO
DE 1876-1877
Música: José Júlio da Silva Ramos
Letra: José Júlio da Silva Ramos
Data: 1877

..................................

E agora, repartidos nos atalhos
Da ciência do bem e da verdade,
Sobre nós, companheiros dos trabalhos,
Estende as negras asas a Saudade.


José Júlio da Silva Ramos foi um estudante brasileiro (Recife, 1853; Rio 1930) que frequentou a UC. Veio para Portugal em 1866 e para Coimbra em 1869, tendo-se estreado como poeta em 1871, com o livro «Adejos», da Imprensa da Universidade, com cerca de quatro dezenas de poesias de cariz romântico. Posteriormente publicou um segundo livro e colaborou n’A Lira e no Mosaico.
A Récita de Despedida dos Quintanistas de Direito de 1876-1877 foi levada à cena na noite de 14 de Março de 1877, no Teatro Académico, em Coimbra, e repetida na noite de 17 do mesmo mês.
A peça da récita, da autoria de dois irmãos siameses (um preto e outro branco), os quintanistas Gonçalves Crespo e António Vasco de Melo, futuro Conde de Sabugosa, era em prosa e verso e intitulava-se “Phantasias do Bandarra”. A música era dos quintanistas José António Forbes de Magalhães e Simões Barbas, que viria a ser o professor da cadeira de música da Universidade, tendo sido ele quem fez a instrumentação e regeu a orquestra.
Além da Balada de Despedida, para a qual não dispomos de mais elementos, havia o Hino do Curso, música de Simões Barbas, letra de Gonçalves Crespo.

ÚLTIMA BALADA
(Balada da Despedida do 5º Ano Jurídico de 1885)
Música: Manuel dos Santos Melo da Cruz
Letra: autor não identificado
Incipit: Canta ao largo a viola branda e grata
Data: 1885

Canta ao largo a viola branda e grata,
Choram mágoas os doidos bandolins…
-Vibra em coro a divina serenata
Que a nossa alma atravessa e arrebata,
Como chuva de lírios e jasmins…

A natureza inteira treme ansiosa
Ao ouvir a suavíssima guitarra…
E morre no horizonte d’oiro e rosa,
Como queixume de oração radiosa
A extrema voz duma canção bizarra!

Assim, amigos, num porvir distante
Cheio de sombra e mágoa e soledade
Há-de ecoar saudoso e delirante
Como o grito d’amor que vaga errante
O bandolim da nossa mocidade.

Balada cantada no final da récita “O Segredo do Mandarim” pelo cantor e guitarrista Santos Melo, aluno de Direito natural de Alijó que viria falecer precocemente no mês de Fevereiro de 1893. Esta peça, da autoria de Solano de Abreu, foi representada no Teatro Académico, nos dias 21, 23 e 24 de Março de 1885, e repetida a 20 de Maio desse mesmo ano. Não se conhece qualquer fonte musical, manuscrita ou impressa, que permita reconstituir a referida balada.
A referida récita teve um “hino”, com música de Lima de Macedo Júnior e letra de Manuel da Silva Gaio e Costa Macedo. Até ao momento não se afigurou possível apurar a autoria da letra. A “viola” referida no poema é a “viola francesa” de seis ordens singelas. Santos Melo foi um artista académico popularíssimo na Coimbra da primeira metade da década de 1880, das relações e amizade do poeta-operário Adelino Veiga. Em “A Lira do Trabalho”, págs. 70-71, Adelino Veiga dedica-lhe o poema “Na Penumbra”. Não são conhecidas composições da autoria de Santos Melo, embora o seu nome possa ser relacionado com duas peças recolhidas na década de 1890 e publicadas no cancioneiro de César das Neves, respectivamente “Serenata d’um Louco” (Mulher formosa, sedutora e linda) e “Saudades da Aldeia” (Que saudades desta terra).

HINO DO CURSO DO 5º ANO JURÍDICO DE 1889-1890
Música: Artur Pinto da Rocha
Letra: Artur Pinto da Rocha
Data: 1890

………………..

A Récita de Despedida do 5º Ano Jurídico de 1889-1890 foi levada à cena na noite de 26 e 28 de Abril de 1890, no Teatro D. Luiz (=Sousa Bastos), em Coimbra.
A peça, da autoria do poeta e estudante brasileiro Artur Pinto de Rocha, intitulava-se «A Padeira de Aljubarrota» e foi musicada pelo Professor de Música da Universidade, Dr. António Simões de Carvalho Barbas.

ÁRIA DOS BARQUEIROS
(Barcarola da Despedida do 5º Ano Jurídico de 1897-1898)
Música: Visconde de Arneiro
Letra: autor não identificado
Incipit: Voa a bateira
Data: 1898

Voa a bateira
Na aura fagueira
À flor do rio,
E se balança
Na onda mansa
Que chora em fio…

Nas horas calmas
Abrem-se as almas
Ao sol do amor
E às barcarolas,
Como as corolas
D’um prado em flor!

Sobre as areias
Cantam sereias
Vê-las quem dera!
São nossas fadas!
As namoradas
Da barca à espera!

Luar que rola
É branca estola
P’ra nos casar!
Barquinha, voa
Como uma loa
Cantada ao mar!...

Esta barcarola foi cantada no final da Récita do V Ano Jurídico de 1897-1898, intitulada “Boémios”, com a assinatura do estudante Manuel Dias Gonçalves Cerejeira, cuja representação teve lugar no Teatro Príncipe Real na noite de 26 de Março de 1898. A partitura da récita contava com a colaboração de figuras ilustres e teve duas baladas, uma de Manuel Mansilha e outra com música de Soares Nobre e letra de Ângelo Vilela Passos (pai de Felisberto Passos). Da récita foi editado um caderno com cerca de 26 canções/melodias que é dado como perdido até ao presente.
Esta ária popularizou-se e, segundo Armando Carneiro da Silva, ainda era muito cantada nos inícios do século XX. Porém não conseguimos encontrar qualquer rasto da música.

BALLADA DE DESPEDIDA
(Na Récita de Despedida, em 1905)
Música: autor desconhecido
Letra: Carlos Luís Ferreira
Incipit: Adeus Coimbra, ninfa d’encantos
Data: 1905

Coro:
Adeus Coimbra, nynpha d’encantos,
Gentil Athenas, vamos embora;
Ao mar da vida nos dirigimos,
Um novo leme nos guia agora.

Voz:
Das nossas pastas, as rubras fitas,
Jamais veremos esvoaçar;
Ficam dispersas sobre o Mondego,
Como avezinhas para emigrar.

Voz:
Foram-se os tempos das serenatas
Que estremunhavam sempre ao luar…
No teu regaço, linda Coimbra,
Adormeceram a soluçar!

Voz:
E vós, guitarras, meigas, doridas,
Dizei gemidos, tangei o fado;
Ai não fiqueis como estremecidas,
Chorai também o nosso passado
.

Voz:
As nossas capas, todas de luto,
Sempre as teremos no coração;
Inolvidáveis lá vão, coitadas,
Viver agora p’rà solidão.

Voz:
É um tributo de amor infindo,
Saudade imensa que não fenece,
O preito d’hoje que te prestamos,
A tri, Coimbra, noss’alma off’rece.

Coimbra, 09-01-1905
Carlos Luiz Ferreira

Este texto veio publicado em “ENCYCLOPÉDIA DAS FAMÍLIAS, Revista illustrada de instrução e recreio”, Nº 225, 19º anno, Setembro de 1905, pág. 649.
Se as fitas são rubras, esta balada seria de uma Récita de Direito. Tanto quanto julgamos saber, em 1905 houve apenas uma récita dos Quintanistas de Direito, “Ontem, Hoje e Amanhã”, com partitura impressa, sendo a letra de Eugénio Pimentel e Virgílio de Sousa, com música de Theophilo Russel, artista profissional, professor de violino e, na altura, regente da Tuna Académica.
Carlos Luiz Ferreira entrou na peça da récita pelo que presumimos que esta balada não mereceu aprovação nem foi cantada na récita. Ignoramos se chegou a ser musicada. Também desconhecemos se este Carlos Luís Ferreira tinha relação (ou se era a mesma pessoa) com o cantor Luís Ferreira que em 1910 gravou discos com peças ao estilo de Coimbra (Fado das Lágrimas; Fado de Saudade).
No ano lectivo de 1904-1905 foram alinhavadas quatro baladas de despedida, mas esta foi uma das que não logrou ser posta em música.

BALADA DA DESPEDIDA DO V ANO MÉDICO DE 1917-1918
Música: José Nevil Pinto da Cunha Saavedra e José Augusto Coutinho de Oliveira
Letra: Luis Ibérico Nogueira
Data: 1918

…………..

No ano de 1918 houve duas récitas de despedida, a do V Ano Jurídico e esta do V Ano Médico. A récita de despedida de 1917-1918 do V Ano Médico foi levada à cena na noite de 27 de Maio de 1918, repetida na noite de 28 de Maio e, dias depois, na noite de 3 de Junho, sempre no Teatro Avenida, em Coimbra.
A peça da récita, intitulada «Lux Moritura» foi escrita por Luis Ibérico Nogueira, que autografou também os versos do Fado e os do Coral da récita, com música original de José Nevil Pinto da Cunha Saavedra e de José Augusto Coutinho de Oliveira.
Foi ensaiador o Dr. Azevedo Leitão, O Dr. Matos Chaves teve a seu cargo as caracterizações e Carlos Lobo os cenários.
Desconhecemos a letra e a música da balada. A música do fado da despedida é da autoria de José Saavedra, com letra de Ibérico Nogueira. José Saavedra e Ibérico Nogueira escreveram também a música e a letra do Coral da récita. Ao que se sabe esta foi a primeira récita de despedida que contou com a participação de duas alunas, Teresa Machado e Célia Leite, que posteriormente exerceram Medicina.

BALADA DA DESPEDIDA DO V ANO MÉDICO DE 1919-1920
Música: Fausto de Almeida Frazão
Letra: Américo Cortêz Pinto e “Um Grupo de Esculápios” do 5º Ano de Medicina de 1919-1920
Incipit: Este tempo de Coimbra
Data: 1920

Este tempo de Coimbra
É um sonho em nossa vida,
À chegada adormecemos
E acordamos à partida.

Neste sono que dormimos
Deixamos a mocidade,
Amanhã já somos velhos,
Só nos resta a Saudade.

E se hoje a vida é florida
Amanhã é um mistério,
Também a morte se abriga
Nas flores do cemitério.

Nós temos na despedida
Muitas penas que sentir,
É que a tristeza vem logo
Quando sente alguém a rir,

Não se esquecem nunca mais
As horas aqui passadas,
A Saudade e a partida
Andam sempre de mãos dadas.

Letra conforme o «Programa e Coplas» da respectiva Récita, impresso na Tipografia União, de Coimbra.
A peça desta Récita de Despedida intitulava-se «Da Parvónia ao Bacocal», era constituída por 3 actos e foi levada à cena no Teatro Avenida na noite de 31 de Maio de 1920. Foi escrita por “Um Grupo de Esculápios”, ensaiada pelo Dr. Azevedo Leitão, musicada pelo Dr. José Coutinho de Oliveira e regida pelo Dr. José Rodrigues. Fausto de Almeida Frazão, quintanista de Medicina, foi o autor da música da Balada.
Fausto Frazão foi igualmente o autor da música do “fado da despedida” desta récita, cujo título era o clássico “Menina e Moça” (Coimbra, menina e moça).

BALADA DA DESPEDIDA DO V ANO MÉDICO DE 1925-1926
Música: Jaime Portugal
Letra: Carlos Alberto Dias Costa
Incipit: Ó Mar da Vida, revolto Mar
Data: 1926

Ó Mar da Vida, revolto Mar,
Torna-te manso, sereno e brando!
Olha que nós vamos embarcar
Cheios de esp’ranças, rindo, cantando!

Preamar! Preamar!
Que bom cheiro a maresia...
É largar! É largar!
Hemos de voltar um dia
A sonhar, a cantar.

Ondas de espuma, brancas, branquinhas,
Areias de oiro, cor do luar...
Olhai na praia tanta conchinhas!
Ó Mar da Vida, revolto Mar!

Vamos lá! Embarcar!
Olha a Estrelinha do Norte
Sobre nós a brilhar!
Vamos lá, que a Nau da Sorte
Vai largar! Vai largar!

As nossas capas! Tanta saudade!
Ó vida cheia de desenganos!
Ainda vai perto a mocidade
Coimbra nossa! Nossos vint’anos...

Nova Aurora a raiar!
Já a nossa vista alcança;
Novo Sol a brilhar,
Mar da Vida, Verde-Esp’rança
A sonhar, a cantar.

A Récita de Despedida de 1925-1926 do V Ano Médico foi levada à cena na noite de 25 de Maio de 1927, no Teatro Avenida, em Coimbra, e na noite seguinte, 26 de Maio, para o público em geral.
A peça da récita, feita em prosa e verso, foi escrita por Alberto Chúquere da Costa e por Adriano Chúquere Gonçalves da Cunha. Intitulava-se «Esculápio em Cuecas», foi musicada por Jaime da Silva Portugal e tinha três actos e cinco quadros. Foi ensaiada pelo Dr. José Rodrigues, com o Dr. Matos Chaves como ponto, os cenários foram de José dos Santos Malaquias e, os contra-regras foram Jaime Sarmento e Jaime Leal.
Entre os participantes na peça contou-se José de Paiva Boléo.
A letra da balada foi escrita por Alberto Chúquere da Costa, música de Jaime Portugal. Álvaro Teixeira Lopes escreveu para esta récita a música do fado que foi cantado por José dos Santos Malaquias, letra de Alberto Chúquere da Costa.
Ver a letra em "Crónicas da Vida Académica Coimbrã", de António Correia. Desconhecemos se teve impressão musical.

BALADA DE DESPEDIDA DO V ANO MÉDICO DE 1926-1927
Música: autor não identificado
Letra: João Carlos Celestino Pereira Gomes
Incipit: Há quantos anos dura o caminho
Data: 1927

Um Quintanista:
Há quantos anos dura o caminho,
– Linda Coimbra – dos nossos passos?
Inda meninos, deixando o ninho,
Muitos já levam filhos nos braços!

Pastas doiradas, que mãos de bilros
Nos estreitaram ao coração:
– Já pelos choupos não se ouvem chilros...
Dai-nos a benção da extrema-unção.

Coro dos Quintanistas:
Na Torre, a Cabra não nos conhece,
Já chama outros, plangendo aos céus;
De nossas almas sobe uma prece:
Adeus Coimbra, adeus! Adeus!...

Um Quintanista:
Tricanas tristes, chorando, agora:
Os quintanistas que vós chorais,
Dons Encobertos como o de outrora,
Diz-se que voltam, não voltam mais.

Guitarras doidas tendo de cor
A rua, a casa das Bem-Amadas:
Choram-te as cordas, na nossa dor,
Mãos de Saudade martirizadas!

Coro dos Quintanistas:
Capa da luto, capa aziaga,
São treze anos os anos teus.
– Saudade é amarga como triaga,
Adeus, ó capas, adeus, adeus!

Um Quintanista:
Ilusões mortas, ontem sonhadas,
Vão-nos nos olhos a soluçar...
Fitas doiradas – folhas doiradas,
Lá vem o Outono que as vai levar.

Bando saudoso, de almas serenas,
– Terra de Lenda – vai-te deixar!
Tentam-se as asas, ai, mas as penas
Não têm forças para nos levar...

Coro dos Quintanistas:
Na Torre, a Cabra já nos esquece,
Já chama outros, plangendo aos céus;
Nas nossas almas morre uma prece:
Adeus Coimbra! adeus! Adeus!...

No ano de 1927 houve duas récitas de despedida, a do V Ano de Ciências e a do V Ano Médico.
A Récita de Despedida do V Ano Médico de 1926-1927 foi levada à cena na noite de 28 de Maio de 1927, no Teatro Avenida, em Coimbra, e repetida depois na noite de 30 do mesmo mês de Maio.
A peça da récita, foi escrita por João Carlos Celestino Pereira Gomes, tinha um prólogo, dois actos e seis quadros, intitulava-se «Fitas Doiradas... Ilusões Doiradas» e foi editada pela Livraria Atlântica, de Coimbra. Musicada por D. José Paes de Almeida e Silva, foi encenada pelo Dr. Alfredo Matos Chaves. A orquestra foi regida por D. José Paes e por César Magliano. Desconhecemos a música correspondente à letra transcrita.

BALADA DE DESPEDIDA DO 5º ANO DE CIÊNCIAS DE 1926-1927
Música: D. José Pais de Almeida e Silva
Letra: Adriano Gonçalves
Incipit: A vida é lindo botão de rosa
Data: 1927

A vida é lindo botão de rosa
Cheio de luz e suavidade.
Rosa formosa, rosa formosa,
Que a seiva nutre da mocidade.

Rosas tão lindas, rosas viçosas,
Pétalas de oiro, numa saudade.
Somos as rosas, somos as rosas
Dessa roseira da mocidade.

A seiva é forte, seiva alterosa,
Cheia de vida, de luz e cor.
O botão abre, dá uma rosa,
Rosa formosa, rosa de amor.

Rosas nascidas, vão-se perder!
Ai como é linda a roseira em flor!
Venham formosas mãos de mulher
Colher tais rosas, rosas de amor!

Letra conforme edição de 1927 da Casa Minerva, de Coimbra, a págs. VIII, da peça “Sonho Final”. A peça foi escrita por Adriano Gonçalves, tendo sido musicada por D. José Pais de Almeida e Silva.
A récita dos quintanistas de Ciências, “Sonho Final”, foi levada à cena em Coimbra na noite de 25 de Maio de 1927. Teve, como ensaiadores, Castanheira Lobo e D. José Pais de Almeida e Silva (Vagos, 06-06-1899; Lisboa, 27-12-1968) e, como principal actor, no papel do estudante Zé Bastos, Artur Almeida d’Eça (Lisboa, 03-09-1902; Porto, 29-06-1958), o qual não viria a concluir o curso de ciências em que estava matriculado. Desconhecemos o paradeiro da música desta balada.

BALADA DE DESPEDIDA DO V ANO MÉDICO DE 1927-1928
Música: Manuel Raposo Marques
Letra: Eduardo Vaz Craveiro
Incipit: Adeus Coimbra
Data: 1928

Coro I:
Adeus Coimbra,
- Ó Mocidade,
Quanta saudade
Em nós se gera!...
Sonhos doirados
Com serenatas,
Em noites gratas...
Tudo é quimera!...

Quintanista:
Lá vem o tempo que à vida impele,
Vem com as horas, sem se quedar!...
Ó que Destino nos trará ele?!
- Tempo da Vida: -Tarda a chegar!...

Tudo era sonho – sonho tão lindo,
Fumo de encanto, subindo lento!...
O nosso lábio, rubro, sorrindo,
Se era em tristeza... era um momento.

Hoje dizemos tristes cantigas,
Que os nossos olhos fazem toldar.
Ó sonhos belos! Ó raparigas!...
Adeus! Já somos para abalar!

Coro geral: Quintanista:
Adeus Coimbra!... Terra tão linda...
Coro geral:
Adeus Coimbra... adeus...adeus!...
Quintanista: Coro I :
Já a saudade... Nas almas timbra
Coro geral:
Saudade infinda... Coimbra Adeus!...

Quintanista:
Ó Vida nova!... Ó nova aurora!...
Que de surpresas tu nos trarás?
A nossa alma, dorida, chora,
Olhando o tempo ficado atrás!...

Só destas pastas, que de bordadas
Foram por fadas muito a primor,
As fitas d’oiro... sonho desfeito! –
Ao nosso peito falam de amor!...

Fitas voando: - doce momento! –
Lá vem o tempo... ficareis sós!...
Rainha Santa, do relicário
Neste calvário velai por nós!...


Coro geral:
Adeus Coimbra,
- Ó Mocidade,
Quanta saudade
Em nós se gera!...
Sonhos doirados
Com serenatas,
Em noites gratas...
Tudo é quimera!...


A Récita de Despedida do V Ano Médico de 1927-1928 foi levada à cena nas noites de 25 e 28 de Maio de 1928, no Teatro Avenida, em Coimbra.
A peça da récita, da autoria dos quintanistas José de Matos Brás e Eduardo Vaz Craveiro, intitulava-se «O Veneno das Seringas» e era constituída por um prólogo, dois actos e cinco quadros.
A encenação esteve a cargo do Dr. Alfredo Matos Chaves e da parte musical incumbiu-se Manuel Raposo Marques; foi ponto, o quintanista Carlos Nunes Ferreira e contra-regra, José de Matos Braz; cenários de Eduardo Belo Ferraz, António Vitorino e João Carlos Celestino Gomes, guarda roupa da Casa Cruz.
A Balada de Despedida teve lugar no final do III quadro do II acto, com que a peça termina. Desconhecemos o paradeiro da música correspondente à letra transcrita.


BALADA DA DESPEDIDA DOS QUARTANISTAS DE LETRAS DE 1929
Música: autor não identificado
Letra: autor não identificado
Incipit: A nossa vida tem horas
Data: 1929

A nossa vida tem horas
De desolada amargura;
Nossos olhos têm água
Quando a sorte nos descura.

No momento que atravessa
Todos sofremos também:
Uns olhando o que passou,
Outros vendo o que ainda vem.

Mas o nosso grande mal,
O nosso grande pesar,
É não podermos viver
Como aqui vamos rezar:

Quiséramos sonhar a vida inteira,
Sonhos iguais àqueles que sonhamos,
Fitando a capa negra, feiticeira
A quem da vida tudo confiamos.

Quiséramos tornar a linda Atenas
Uma ilusão que nunca mais findasse,
E fosse alívio para as nossas penas
Quando a ventura nos desamparasse.

Quiséramos sorrir sempre alegria,
Viver contentes como em pequeninos,
Vendo na vida sempre o mesmo dia,
Feito de Sol e cantos purpurinos.


Que tudo fosse um campo de vitória
Onde ninguém ficasse vencedor;
Combates dum combate cuja glória
Fosse para nós o verdadeiro amor.

Onde em cortejos moças bem formosas
Nos procurassem com desejo ardente,
Trazendo então como Isabel as rosas,
Prémio de amor, que tanto eleva a gente.

Onde então, como ventura,
Todos sentíssemos bem
A beleza que perdura
E não enfada ninguém.

Mas como nada podemos
De isto tudo conseguir,
Em Coimbra nós havemos
De preparar o porvir.

Em Coimbra, a mais ouvida
Mentora de Portugal,
Vamos lutar pela vida
Que não vai correndo mal.

Letra impressa pela Tipografia da Gráfica Conimbricense, Ldª., do Largo da Feira em Coimbra. Não foi possível apurar se esta letra chegou a ser musicada.

BALADA DA QUEIMA DAS FITAS DE 1930
Música: Manuel Raposo Marques
Letra: autor não identificado
Incipit: Azul escuro para muitos
Data: 1930

Letras:
Azul escuro para muitos
Quer dizer felicidade…
Para nós diz a tristeza
De perder a felicidade.


Direito:
Fitas vermelhas, sangrentas,
Agonia do sol-pôr
Queimadas à chama rubra
Deixam saudades e dor.

Ciências:
As fitas azuis claras
Como o claro azul do céu,
Parecem a Natureza
A cantar hinos a Deus!

Medicina:
Amarelo é desespero,
Mentira, não digam tal!
Lutamos a vida inteira
Por um mais alto ideal.

Matemática:
As fitas azuis e brancas,
Nas pastas a esvoaçar,
São beijos do céu azul
Na espuma branca do mar!

Farmácia:
A festa é cheia de vida,
De alegria e mocidade,
Mas só nós é que trazemos
A triste cor da saudade.

Coro final:
Já queimámos as nossas fitas,
As primeiras ilusões
Fica a saudade a rezar
Cá dentro dos corações.

E desta chama brilhante
Restam cinzas muito puras
Que nos dizem vida nova
As primeiras amarguras.

Letra conforme o folheto “Coplas da Revista”, impresso na Tipografia União, Rua Pedro Cardoso, 2-4, Coimbra.
A Récita de Despedida teve lugar no Teatro Avenida na noite de 4 de Abril de 1930, em Coimbra. A peça era constituída por uma revista académica composta de três actos, da autoria de Augusto Morna, com música, orquestração e regência de Manuel Raposo Marques. Nos “Fados e Guitarradas” actuaram a cantar, Armando Goes e Serrano Baptista, e a tocar Felisberto Passos, Jorge de Morais, Sá Carneiro e José de Oliveira. Não foi possível aceder à música desta balada.

BALADA DA DESPEDIDA DO V ANO MÉDICO DE 1937-1938
Música: António da Silva Fonseca
Letra: António da Silva Fonseca
Incipit: Adeus Coimbra
Data: 1938

Adeus Coimbra,
Terra d’amor
Que tens formado
Tanto doutor!
Adeus Mondego,
Das serenatas!
Adeus tricanas,
Lindas gaiatas!

A Récita de Despedida do Curso do V Ano Médico de 1937-1938 foi levada à cena em récita de gala, na noite de 29 de Março de 1938, no Teatro Avenida, em Coimbra, e repetida depois na noite de 4 de Abril seguinte.
A peça da récita, escrita em prosa e verso, com três actos e treze quadros, intitulava-se «Gotas Amargas... Quantum Satis...» e é obra colectiva do curso. A encenação esteve a cargo de Mário Temido com a colaboração do Dr. Octaviano Carmo e Sá. representaram papéis nesta peça o cantor e guitarrista João Gonçalves Jardim e Salvador Dias Arnault (futuro lente de História).
A Balada de Despedida foi cantada pelo quintanista Bernardino António de Carvalho Pargana. Desconhecemos a música desta balada ou qualquer fonte com ela relacionada.

BALADA DE DESPEDIDA DO V ANO MÉDICO DE 1938-1939
Música: autor não identificado
Letra: Manuel Ribeiro (Manuel ou Marcelo?)
Incipit: Capas negras, tremulando
Data: 1939

I
Capas negras, tremulando,
Ondulando, esfarrapadas.
Quais andorinhas em bando,
A cada instante adejando,
Sempre alegres, descuidadas.
II
Sobraçadas, com fervor,
Com amor, as nossas fitas.
O oiro deu-lhes a cor
E o desespero da dor,
Mais ainda, as fez bonitas.
III
Mocidades, em botão,
Breve irão desabrochar.
E, de sobre o coração,
As fitas largas se vão
Para nunca mais voltar.
IV
E agora, na despedida,
Desta vida tão formosa,
Em nossa face dorida,
Sentimos rolar perdida
Uma lágrima saudosa.

Coro:
Fitas mais belas
Não há em Coimbra,
São amarelas,
A cor mais linda
Têm lampejos
Dum arrebol.
Parecem beijos
Do próprio Sol.

Letra editada pela Tipografia União, Coimbra, 06-02-1939, de que foram feitos 500 ex. No ano de 1939 não houve récita de despedida alguma. Desconhecemos se esta letra foi posta em música.

BALADA DA DESPEDIDA DO V ANO MÉDICO DE 1940-1941
Música: Constantino Ferreira Esteves
Letra: Constantino Ferreira Esteves
Incipit: Coimbra, sempre moça, adeus
Data: 1941

Solista:
Coimbra, sempre moça, adeus
– Efémero berço de ilusões,
Revivo nos encantos teus
Os anseios e jubileus,
As meigas e doces paixões.

Adeus alegria e amor
Sonho belo da mocidade
Deixamos-te como penhor,
Sentida com grande fervor,
Esta angustiosa saudade
.

Solista:
Adeus ventura a sorrir
– Tempos belos que bendizemos
Esta geração vai partir
Com fé em risonho porvir,
Mas Coimbra, te esquecemos.

Fitas amarelas esvoaçam
Presas da nossa devoção;
Com as capas que nos enlaçam
São figuras negras que passam
São andorinhas que se vão.

Coro:
Balouçam fitas amarelas,
O sol em oiro transformado
-Onde crescemos
Parece não haver mais belas
Neste rincão abençoado.
Esta velhinha capa, airosa,
Vai junto a mim para viver
-Longe d’aqui
Aquela miragem saudosa
Que fere e faz sofrer.

A Récita de Despedida de 1940-1941 do Curso do V Ano Médico, foi levada à cena nas noites de 5 e 6 de Maio de 1941, no Teatro Avenida, em Coimbra. Teve como ensaiador o Dr. Octaviano de Sá, como encenador António José Soares, como cenógrafo o Dr. José Alves. O trabalho de orquestra esteve a cargo do músico militar Júlio Fernandes.
A peça da récita, uma comédia revista com lentes, intitulava-se «Pontas de Fogo» e foi escrita por João Francisco Ramiro da Fonseca, Gaspar Eduardo Sarmento Parada Leitão, Francisco de Brito Amaral, André de Carvalho e Victor Bernal del Rio. Não dispomos de quaisquer informações sobre a melodia.

BALADA DE DESPEDIDA DO V ANO JURÍDICO DE 1949-1950
Música: Mário Marques Mendes e António de Almeida Santos
Letra: Ernesto Matos Viegas Correia de Moura Coutinho
Incipit: Vamos partir, brevemente
Data: 1950

Vamos partir, brevemente,
E as nossas ternas cantigas,
A Sebenta, a Cabra, o Lente,
... tornam-se histórias antigas!

Coimbra da Academia
Já não canta, não tem voz:
Vamos partir qualquer dia
... e agora chora por nós.

Coro:
Fitas vermelhas, berrantes,
Cheias de vida e de cor!
Almas alegres, gritantes,
Almas sedentas de amor!

Fitas rubras, qual fogueira,
Queira Deus que sempre assim:
Que a nossa vida, Deus queira,
Seja fogueira sem fim.

Não penses mais na partida,
Coimbra, peço por Deus:
Os sonhos da nossa vida
Fundidos ficam nos teus!

Só parte quem vai sozinho,
Só parte quem deixa alguém:
Na Beira, Algarve, ou no Minho,
Podemos sonhar também.

Coro:
Fitas vermelhas, berrantes,
Cheias de vida e de cor!
Almas alegres, gritantes,
Almas sedentas de amor!

Fitas rubras, qual fogueira,
Queira Deus que sempre assim:
Que a nossa vida, Deus queira,
Seja fogueira sem fim.

“FAUSTO. Récita de Despedida do V Ano Jurídico da Universidade de Coimbra. Fantasia em 4 actos”, de 1949-1950 foi levada à cena na noite de 20 de Março de 1950, no Teatro Avenida, em Coimbra, e repetida no dia seguinte. O livreto era da autoria do estudante Alberto Luís de Oliveira Reis. Os ensaios estiveram a cargo do Dr. Octaviano de Sá e regeu a orquestra Manuel Eliseu. Desconhecemos se esta balada teve impressão musical. Sem qualquer colaboração, já tivemos o ensejo de solicitar ao Dr. António de Almeida Santos que nos cantasse esta balada num suporte áudio, por cremos que será o único antigo estudante com lembrança da referida melodia.
Nesta mesma récita foram estreados como “fados de despedida” dois célebres temas de Carlos Figueiredo, “Adeus Sé Velha” e “Ondas do Mar”, pois no ano de 1950 aquele autor terminou o seu bacharelato em Direito.

BALADA DA DESPEDIDA DO 6º ANO MÉDICO DE 1959
Música: Rui Coimbra
Letra: Alfredo Rasteiro
Incipit: Adeus Coimbra
Data: 1959

Adeus Coimbra
Foste p’ra nós uma mãe
Hei-de trazer-te meus filhos
P’ra que sejam teus também.

Adeus Coimbra
Oh adeus, vamos partir
Saudosos vamos embora
Quanto nos custa sair.

(coro)
As nossas capas
Todas em fio
Choram connosco
Ao desafio.

As nossas fitas
Oiro que chora também
Estão tristes, querem consolo
Ou os sorrisos d’alguém.

Letra impressa no folheto da récita “Os Pontos do Curso K’Vai. Récita de Despedida dos Finalistas de Medicina”, Coimbra, Março de 1959, cujo peça é da autoria do curso. Desconhecemos como seria a melodia. Se não laboramos em erro, o autor da letra veio lente de História da Medicina da Faculdade de Medicina da UC. A brochura desta récita é o primeiro documento de costumes estudantis onde aparece consagrada pela primeira vez localmente a expressão “finalistas”, “neologismo” que mereceu reparos da parte do Reitor Maximino Correia.

BALADA DA DESPEDIDA DO VI ANO MÉDICO DE 1966
Música: José Niza
Letra: Libério Ribeiro
Incipit: Coberta de pombas brancas
Data: 1966

Coberta de pombas brancas
Correm as águas p’ró mar
Lágrimas soltas nas águas
Por Coimbra ir deixar.

Pérolas brancas no rio
Prendas do entardecer
Lágrimas soltas nas águas
De meus olhos a sofrer.

(coro)
E se um dia eu voltar
Mais águas irão correr
E se um dia eu voltar
Mais águas irão correr
No leito e margens do rio
De novo eu irei chorar…

Mais lágrimas vão para o mar.

Texto conforme o folheto “Balada da Despedida do VI Ano Médico de 1966”, representada em 19/03/1966 com o título médico… O Grego (007 anos… ordem para marchar)”.
De acordo com informações prestadas pelo Dr. José Miguel Baptista em 07 de Agosto de 2006, quem ensaiou e estreou esta balada no palco do Teatro Académico de Gil Vicente, a pedido de José Niza, foi o próprio José Miguel Baptista. O cantor foi acompanhado pela formação António Andias/Manuel Borralho (gg) e Rui Borralho/Rui Pato (vv). José Miguel Baptista identificou de imediato a letra, mas passados tantos anos tem dúvidas quanto à melodia. Ainda de acordo com a mesma fonte, o jornalista Rocha Pato deu notícia desta récita e balada nos jornais de 20 de Março de 1966.

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