sábado, março 31, 2007

RECONSTITUIÇÃO DA FEIRA DOS LÁZAROS
«TRADIÇÃO
Domingo de Lázaros reviveu gestos de outros tempos


Em Celas e no Largo D. Dinis, o Grupo Folclórico de Coimbra e o Grupo Folclórico da Casa do Pessoal da Universidade de Coimbra reconstituíram, mais uma vez, a Feira dos Lázaros. O dia amanheceu claro, com os primeiros raios de sol a fazer lembrar a Primavera. O domingo é de Lázaros e a feira com ecos centenários, o cheiro da doçaria e as cores dos brinquedos de outras meninices encheram o Bairro de Celas e o Largo D. Dinis de gente e memórias antigas. Assim se cumpriu a tradição. O Grupo Folclórico de Coimbra recriou ontem – no penúltimo domingo antes da Páscoa –, no Bairro de Celas, a Feira dos Lázaros, uma iniciativa que se perde no passar dos tempos, mas que está relacionada com o preceito das Obras da Misericórdia, o de visitar os enfermos.
Noutros tempos, a população de Coimbra dedicava este dia – no qual a Igreja recorda a ressurreição de Lázaro –, a visitar os doentes do hospital, especialmente os que sofriam de lepra. Por isso – e como a movimentação era muita junto ao antigo hospital –, começaram a juntar-se nesse dia, ali no largo, os vendedores de doces, de brinquedos e de artesanato.
Os doentes, referiu Nelson Correia Borges, presidente do Grupo Folclórico de Coimbra, também participavam, confeccionando passarinhos feitos com massa de pão e penas de galinha, os “lázaros”, que eram vendidos cá fora.
A Feira dos Lázaros realizou--se até finais da década de 40, altura em que a Alta de Coimbra foi demolida para dar lugar às faculdades. Grande parte dos antigos moradores mudou-se para o Bairro de Celas. “Era uma tradição tão enraizada que trouxeram para aqui a feira e, durante alguns anos, ela ainda foi sendo realizada. Mas depois foi desaparecendo. O nosso grupo veio aqui recuperá-la”, referiu Nelson Correia Borges. E bem. Ontem, o largo encheu-se de cor. O que se comercializava nesta feira, e que ainda hoje se vende, é muito variado. Uma das suas principais componentes é a doçaria tradicional coimbrã, onde se salientam os pastéis de Santa Clara, as arrufadas de Coimbra e o arroz doce. Ou os queijinhos de amêndoa, os palitos de Lorvão, as grades do convento, os suspiros... tudo confeccionado com o saber moldado pelas preciosas mãos das mulheres do grupo. Existem, igualmente, outras tentações, como é o caso dos bananins, das pevides, dos tremoços. Para os mais novos, e não só, estão à venda brinquedos de madeira de outros tempos. E algum artesanato.
No Largo D. Dinis
Também o Grupo Folclórico da Casa de Pessoal da Universidade de Coimbra organizou, como vendo sendo hábito, a sua Feira dos Lázaros, no Largo D. Dinis. A escolha do local tem, naturalmente, a ver com o antigo Largo do Castelo, que ali mesmo acolheu inúmeras feiras até à destruição da Velha Alta, nos anos 40 do século passado. A reconstituição vem-se mantendo desde 1991, ano em que o grupo decidiu promover a iniciativa. Até hoje tem sabido cumprir a sua missão. Ali, entre os produtos vendidos, destacavam-se os doces e as guloseimas, brinquedos antigos, de madeira e lata, sacas feitas com retalhos de pano, cestaria e latoaria. Os mais novos entretiveram-se a jogar a sorte na roleta de rebuçados. Para esta iniciativa, o Grupo Folclórico da Casa de Pessoal da Universidade de Coimbra convidou o Grupo Folclórico e Etnográfico do Brinca (Eiras) – que levou o cheiro da broa acabada de sair do forno de lenha, os bolos de massa sovada e os bolos de mel e noz, além da doce jeropiga –, o Grupo Folclórico das Paliteiras de Chelo – com a doçaria conventual Mosteiro de Lorvão, os palitos e a arte de esculpir pequenos pedaços de madeira –, e o Grupo Folclórico da Vila de Pereira – com as suas célebres queijadas, as raivas ou os papos de anjo... Todavia, o produto mais característico de ambas as feiras, curiosamente confeccionado pelos doentes, eram as galinhas feitas com massa de pão e enfeitadas com penas – que acabaram por ser designadas por Lázaros.
O vereador da Câmara Municipal de Coimbra que tutela o Pelouro Cultura não faltou, marcando presença na iniciativa. Para Mário Nunes, ambos os grupos, ao reconstituírem a Feira dos Lázaros encetam “uma luta contra o tempo e contra a modernidade”.“ É a afirmação de que há coisas na vida do povo que não morrem. E esta é uma delas. Ambos os grupos continuam uma tradição e marcam a verdade da sua essência. São, também por isso, baluartes da cultura popular”, referiu o edil».
[texto de Patrícia Cruz Almeida, jornal AS BEIRAS on line, edição de 25 de Março de 2007, http://www.asbeiras/pt/, AMNunes]

Joel Canhão vai ser homenageado, esta noite, pelas 21h 30min na Capela da Universidade. Notícia do Diário as Beiras de hoje, com foto de Pedro Monteiro.

sexta-feira, março 30, 2007

"Ópera e Guitarra divulgam Coimbra", é um texto de Mário Nunes, vereador da Cultura da Câmara Municipal de Coimbra, saído hoje no Diário as Beiras.

Fotos de quatro grandes cultores da Canção de Coimbra, ilustrando uma página do livro "Lisboa, o Fado e os Fadistas", de Eduardo Sucena, da Vega Editora, numa segunda edição em 2002. A primeira edição saiu em 1992. Recebeu o prémio Municipal Júlio de Castilho de Olisipografia 1992 (Complementar).

quinta-feira, março 29, 2007




Alguns alunos da escola de guitarra do ISEC actuaram na 3ª feira, 27 de Março, pelas 22horas no auditório do ISEC.

José Alexandre interpretou Nas Asas da Saudade e Verdes Anos de Carlos Paredes (Foto1)

David Bisão interpretou Canção para Titi de Carlos Paredes (Foto2)

Horácio Fachada interpretou Valsa Triste de Gonçalo Paredes (Foto3)

Pedro Rodrigues interpretou Asas Sobre o Mundo e Canto de Amor de Carlos Paredes (Foto4)

O acompanhamento de viola esteve a cargo de Bernardino Gonçalves da Associação Cultural Coimbra Menina e Moça.

A Escola de Guitarra do Instituto Superior de Engenharia de Coimbra foi fundada em 2003 pela Associação Cultural Coimbra Menina e Moça e possui actualmente 15 alunos de guitarra. O ensino é ministrado por António de Jesus e Alexandre Cortesão, guitarristas do grupo daquela associação cultural.

Aproveito para informar que vamos começar a gravar um CD em Abril corrente e pensamos lançá-lo no final de 2007.
Horácio Fachada

quarta-feira, março 28, 2007





Caricaturas de cinco ilustres cultores da canção de Coimbra dos princípios do século passado. Estas caricaturas, pertencentes ao espólio de Joaquim Pinho, ilustram um artigo de Alberto de Serpa, "Cantores e tocadores de Coimbra", na revista ILUSTRAÇÃO --- 4º ano nº77. Lisboa, 01 de Março de 1929, pág,s 18 e 19. Em breve aqui será colocado o texto atrás referido. O autor destas caricaturas é Carlos Carneiro - informação prestada por António M Nunes; Três delas estão no seu livro "No rasto de Edmundo de Bettencourt - uma voz para a modernidade".

Noite de tertúlia sobre a história do Fado de Coimbra. Notícia do Diário de Coimbra de hoje.

terça-feira, março 27, 2007

No lançamento de «Método de Guitarra Portuguesa»*, de José Santos Paulo**

Armando Luís de Carvalho HOMEM

- Sr. Dr. José Castanheira, em representação da Direcção da Associação Cristã da Mocidade
- Sr. Vereador do pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Coimbra
- Sr. Presidente da Tuna Académica da Universidade de Coimbra
- Sr. representante do Conservatório de Música desta Cidade
- Sr. representante da Entidade Patrocinadora
- Caro José Santos Paulo
- Caros Alunos e Caros Familiares de José Santos Paulo
- Minhas Senhoras, Meus Senhores, Meus Amigos:

Não são necessários pretextos para visitar a Cidade onde se nasceu (na freguesia de Santa Cruz, no caso vertente), a Cidade onde – ainda que efemeramente – se estudou e onde se tem Família e Amigos. Mas o prazer é redobrado quando nos convidam a vir a Coimbra falar de temas do Universo Musical respectivo, e logo numa Casa a que meu Pai teve alguma ligação nos anos 40 do século passado; e estando em causa uma Obra editada pela Tuna Académica, Organismo a que meu Pai também pertenceu, exercendo inclusivamente, aí por 1942, o cargo de Vice-Presidente de uma Direcção liderada pelo Dr. Aurélio Reis, hoje um dos decanos do universo musical em que todos nos reconhecemos. Daí que as minhas primeiras palavras sejam de agradecimento a José Santos Paulo por se ter lembrado da minha pessoa para hoje aqui usar da palavra. Queira por isso, e desde já, aceitar um sentido «Bem haja !» e um grande abraço.

E começarei por salientar que, para um conjunto de intérpretes do Canto e da Guitarra de Coimbra que, desde o princípio da década de 80, nos habituámos a ver identificados como «Tertúlia do Fado de Coimbra», esta conjuntura que abrange os meses finais de 2006 e os iniciais de 2007 está de facto a decorrer sob os mais brilhantes auspícios:

a) Em primeiro lugar, tivemos há alguns meses o surgimento do Álbum O Meu Lugar, poemas de António Arnaut, 5 dos quais ditos pelo seu Autor e mais 10 interpretados pelos, na circunstância, denominados «Quatro Elementos», i.e.: José Santos Paulo, no seu muito especial registo de tenor de grande extensão nos agudos; Álvaro Aroso, continuadamente inovador na Guitarra de Coimbra; Eduardo Aroso na viola, mas em parâmetros que lhe permitem falar, com toda a propriedade, de «guitarra clássica», tal como consta da ficha técnica do CD; e José Carlos Teixeira, cuja performance no baixo acústico posso dizer que me convenceu em termos das potencialidades deste instrumento em certas áreas da Galáxia Musical Coimbrã. Tive então oportunidade de opinar – em conversas telefónicas com Álvaro Aroso e num breve texto ainda inédito fora da blogosfera [1], que os ditos «Quatro Elementos» se apresentavam como verdadeira formação de câmara, com o canto – fosse de poemas líricos, fosse de poemas de intenção social – a assumir-se como especial forma de lied e com os 3 instrumentistas bem longe dos tradicionais papéis de solo + acompanhamento que tradicionalmente a Guitarra e a Viola (ou as Violas) têm ostentado em Coimbra. E tive a satisfação de, ao pensar assim, me encontrar em sintonia com Alguém muito mais Autorizado que eu, o Doutor Flávio Pinho, no seu excelente texto de abertura ao mini-livro com as partituras dos temas.

b) Em segundo lugar, publicamente se apresenta hoje o Método de Guitarra Portuguesa de José Santos Paulo. Para quem não seja «homem de um só livro», o momento é de júbilo, uma vez que a Bibliografia nesta área fica substancialmente enriquecida depois da realização pioneiramente congénere de Paulo J. Soares (Jó Jó), há cerca de 10 anos (e realização «congénere», disse eu, ainda que seguindo caminhos não necessariamente coincidentes). Mas, prosseguindo, o momento é necessariamente de muita satisfação para todos nós:

i. Porque, se qualquer Método é antes de mais, e daí em diante, material basilar de trabalho para os alunos do seu Autor,

ii. ele é também potencial objecto de consulta para executantes mais maduros, que eventualmente poderão retocar ou corrigir as suas abordagens desta ou daquela peça, confrontando uma prévia versão empírica com uma versão musicalmente estabelecida;

iii. e finalmente, na ainda hoje – e apesar de quanto ultimamente se tem escrito – limitada Bibliografia sobre a Guitarra de Coimbra, a Obra agora apresentada, para além de material de trabalho e fonte, pode converter-se em referência essencial para estudiosos do instrumento e dos seus contextos, históricos e outros; donde, a importância da cuidada indicação das fontes – discográficas e outras – das peças apresentadas.

Prosseguindo. Esta realização era esperada – ou, pelo menos, esperável – desde que, há alguns anos, em 2000, no ensaio A Guitarra Portuguesa. Aproximações Histórico-Musicais à sua Génese e Fixação em Portugal, Eduardo Aroso abordou e ilustrou a prática didáctica de José Paulo no domínio da Guitarra, instrumento que há pouco fizera a sua entrada no Conservatório da Cidade. José Paulo seria entretanto co-Autor de um livro sobre Flávio Rodrigues. Anunciada algum tempo depois, a saída deste Método concretiza-se agora e vem sem dúvida marcar um momento muito especial de alguém muito especial. Porque digo isto ?
Nascido em Moçambique, JOSÉ AUGUSTO SOBRAL DOS SANTOS PAULO veio para Portugal em meados dos anos 70 e viveu inicialmente em Miranda do Corvo – onde possui raízes familiares –, radicando-se em Coimbra na década subsequente; e nesta Cidade – bem como no Conservatório de Vila Nova de Gaia, na Universidade de Aveiro e no Teatro Nacional de S. Carlos – fez o essencial da sua formação. Mas com uma particularidade, que o torna uma figura não propriamente única, mas de perfil muito pouco vulgar no Canto e na Guitarra de Coimbra: é que em termos de Ensino Superior essa formação é estritamente musical (Canto, Acústica, História da Música, Composição, Guitarra “Clássica”…); a sua ALMA MATER está pois essencialmente nos Conservatórios ou Instituições congéneres, e os “lentes” que teve como Mestres chamam-se Mário Mateus, José Carlos Travassos Cortez, Isabel Maia, José de Oliveira Lopes ou Amador Cortez Medina. No panorama dos estudos musicais no nosso País dir-se-á que é um trajecto como tantos outros: o Ensino Superior da Música está muito mais nos Conservatórios ou em Escolas Superiores Politécnicas (v.g. a ESM/IPL ou a ESMAE/IPP) do que nas Universidades, constituindo o Mestrado em Ciências Musicais da FL/UC ou o Departamento de Ciências Musicais da FCSH/UNL, por exemplo, as tais excepções-que-confirmam-a-regra. Mas no Universo do Canto e da Guitarra esta formação e este percurso são coisa pouco comum: convocando as recordações e lembrando o perfil de cantores ou instrumentistas que eu conheça ou tenha conhecido, apenas me ocorre um nome com pontos de contacto no seu currículo – o de Luís Filipe Roxo Ferreira, de quem aliás José Paulo foi aluno em Guitarra Clássica; como aluno igualmente foi, jovem adolescente, em meados da década de 70, do pioneiro do ensino formal da Guitarra de Coimbra, Jorge Gomes.

O presente Método espraia-se por 4 centenas de páginas e duas características de fundo nele logo me impressionaram:

1) O Método enuncia como programa de trabalho – depois rigorosamente cumprido – um ensino-aprendizagem da Guitarra em termos de progressividade, em termos de avanço dos estudiosos segundo procedimentos de dificuldade crescente; ou, como nas próprias palavras do Autor, segundo uma «progressão ordenada de exercícios» (fim de citação).

2) Sendo José Santos Paulo uma poderosa personalidade – percebi-o logo no dia em que tive o prazer do o conhecer pessoalmente (Viseu, Maio de 1994, por ocasião de um Encontro de Grupos de Guitarra e Canto de Coimbra, organizado por Hermínio Menino no pólo regional da Universidade Católica) –, a verdade é que o seu Método se revela a Obra de um Mestre cuja postura não será propriamente a do «magister dixit», bem pelo contrário.

Nestas duas características centrarei o remanescente das minhas palavras.

O Método como Obra inculcante de uma aprendizagem por passos de complexidade crescente, antes de mais. Serei breve neste ponto: para salientar essencialmente que, para um aluno de José Paulo, dominar a primeira metade (mais ou menos…) do volume exigirá trabalho árduo e talvez até algo ascético, trabalho que o fará contactar com sons e realidades bem diferentes – e porventura bem menos interessantes – do que os sons e os temas que, sedutoramente, o tenham conduzido ao estudo da Guitarra. Mas também me quer parecer que de um estudioso que saiba “dobrar” com êxito o “cabo da Boa Esperança” dessas primeiras 180 páginas de «estudos» e «exercícios» muito se poderá esperar no que toca a execução do repertório, não raro bem exigente, que depois lhe é proposto, e onde se inclui um tema tão complexo – e ao mesmo tempo tão coimbrão – como as «Variações em mi menor» de Jorge Tuna e uma virtuose como o «Capricho em Lá Maior» de Octávio Sérgio.

José Paulo como a antítese perfeita do «magister dixit», em segundo lugar. Comecemos por ter em atenção as figuras 7., 8. e 11. (pp. 14-15). Está em causa a posição da Guitarra. José Paulo revela-se adepto da colocação apenas na coxa direita por executantes adultos. Mas, ao fazê-lo, propõe, aconselha, diz justificadamente o que acha melhor; não impõe ! A prova é que apresenta também a hipótese alternativa do apoio nas duas coxas. E ilustra devidamente: faz-se fotografar com a Guitarra sucessivamente em cada uma das posições; opinando que se o apoio na coxa direita será preferível para estudantes adultos (a partir dos 13 anos), acrescenta que o apoio sobre as duas coxas será por seu turno aconselhável a estudantes mais juvenis, «de iniciação», que pela dimensão do seu corpo utilizem preferencialmente uma Guitarra de três quartos; para ilustrar esta última situação, de novo se faz fotografar, mas agora acompanhado de seu Filho – criança ou quando muito pré-adolescente à data. Ou seja: ao enunciar um preceito metodológico – coisa muito diferente de uma lei científica –, José Paulo expõe-se: a Si e a um dos seus Entes mais Queridos; uma atitude de abertura, suscitante, quanto a mim, da simpatia dos leitores.
Mas há mais, no que respeita a José Santos Paulo enquanto Mestre não praticante do «magister dixit» e enquanto Homem que o não é «de um só livro». Que autores são propostos aos estudiosos que doravante utilizem o seu Método ? Esta interrogação tem a ver com o seguinte: os entusiastas da Obra de Thomas Kuhn sobre a estrutura das revoluções científicas poderão, aportando os seus conceitos para o domínio da criação e da prática musical, detectar vários «paradigmas» – sete, mais concretamente – na prática dos actuais guitarristas de Coimbra (e uma prevenção farei neste momento: o que se segue é muito mais interrogação, reflexão ensaística, do que afirmação peremptória):

1) Uns haverá que optem predominante ou exclusivamente pela Obra de Artur Paredes (1899-1980).

2) Outros farão outro tanto relativamente a Carlos Paredes (1925-2004). Alguns poderá ainda haver que conciliem os dois Mestres, eventualmente acrescidos de outros membros da Família, como Gonçalo ou Manuel Paredes. Este paradigma Paredes – ou, talvez melhor dizendo, estas várias faces de um eventual paradigma Paredes – creio enformar(em) uma parte muito significativa – eventualmente maioritária – do repertório hoje escutável em Coimbra.

3) Uma terceira tendência, radicante, porventura, em meios da Velha Alta, em executantes que sempre viveram em Coimbra ou proximidades, terá o seu máximo referencial em Flávio Rodrigues e naquilo que ele possa ter representado de uma modernidade ‘arcaizante’ (um aparente paradoxo) e alternativa à «modernidade presencista» de Artur Paredes; alguns executantes poderão aliar essa – porventura – maior sintonia com a herança oitocentista à execução de peças de sua autoria, construídas segundo coordenadas sintonizadas com os referenciais.

4) Ainda uma outra tendência passará pela execução de peças de Mestres como João Bagão (1921-1995) ou José Maria Amaral (1920-2001), e/ou pelo repertório gravado na primeira metade dos anos 50 pela formação António Brojo (1927-1999) / António Portugal (1931-1994) / Aurélio Reis / Mário de Castro ou, na fase imediatamente subsequente, por António Portugal / Jorge Godinho (1937-1972) / Manuel Pepe / Levi Baptista (e ainda, mais tardiamente, Eduardo de Melo e Paulo Alão). Esta tendência talvez já tenha sido mais forte; mas creio manter-se e ostentar ainda peso significativo.

5) Teremos depois os mais sintonizados com a modernidade da década de 60, com as Obras de Jorge Tuna, Eduardo e Ernesto de Melo, Nuno Guimarães (1942-1973), Francisco Filipe Martins, António Andias, Manuel Borralho; tendência esta, creio, hoje relativamente circunscrita.

6) A vivência e/ou assimilação da modernidade dos sixties poderá nos nossos dias prolongar-se nos que executam essencialmente repertório próprio: e aqui teremos um como que sexto «paradigma», onde a continuidade de situações (Jorge Tuna, Francisco Martins) se pode fazer complementar na afirmação de verdadeiros criadores, ainda que como tal revelados em diferenciados momentos de vida e carreira – penso essencialmente em Álvaro Aroso (e na fase da «Tertúlia» que se iniciará pelos finais da década de 70), em Paulo J. Soares e em mais dois casos, tão «sui generis» como contrastantes entre si: o Grupo «Presença de Coimbra» (Manuel Borralho / José Ferraz de Oliveira / Manuel Gouveia Ferreira), tal como o conhecemos no 2.º e no 3.º CD’s de Jorge Cravo, onde a herança dos loucos anos 60 se traduz hoje numa criação de temas instrumentais onde a dita modernidade se casa às vezes com sons de Velha Coimbra e, contrastantemente, o Grupo «Canção de Coimbra», vencedor, há-de haver uns três anos, do «Prémio Edmundo Bettencourt» e emissor de um discurso musical porventura qualificável de post-moderno. Escusado será dizer que estamos aqui de novo em terrenos minoritários na (actual) Galáxia coimbrã.

7) Sétimo e último «paradigma»: a abrangência, o eclectismo, o enciclopedismo, a erudição. A postura dos que, abertos que estejam ao máximo vanguardismo na execução e/ou na criação em Guitarra, não deixem de conhecer e executar remotas heranças de Oitocentos e a Obra das sucessivas gerações de Novecentos. Expoentes desta última atitude poderão ser um Octávio Sérgio, «mutatis mutandis» um Fernando Frias Gonçalves, um Paulo J. Soares, um José Paulo… E provavelmente não muitos mais…

Porquê José Paulo protagonista do último dos sete «paradigmas» ? Atentemos no «corpus» de peças proposto aos estudiosos segundo o seu Método.
A obra contempla antes de mais 11 «Exercícios» originais de arranque (em cordas soltas), duas séries de «Estudos» também originais (num total de 18), 12 outros «Estudos (em arpejos)», tudo isto alternando com a apresentação de escalas, tons e intervalos. Uma primeira série de peças populares, em número de 12, com arranjos de autores vários (Duarte Costa, José Paulo, João Machado…) dera entretanto imediata sequência aos exercícios preliminares. Mas só já perto do meio do volume, dobrada a página 180, começamos por sistema a deparar-nos com temas ostentando autores sonantes. Temos a partir de então um total de 42 peças / arranjos / harmonizações, de autoria ou responsabilidade dos nomes que seguem (e esclareço que se contabilizaram as duplicações, nos casos de re-apresentação da peça em versão para Guitarra e orquestra):

Ø Assim, o nome mais representado é o de Octávio Sérgio, com 5 peças, seguido do de Eduardo Aroso, com 4; Artur e Carlos Paredes ostentam 3 temas cada; Carlos Seixas, Duarte Costa e Gonçalo Paredes 2 cada; e entre os nomes com uma peça neste Método, e citando apenas os minimamente conhecidos, teremos (por ordem alfabética) Afonso Correia Leite, Álvaro Aroso, Anthero da Veiga, António Ralha, António Rodrigues (vulgo António das Águas), Flávio Pinho, Francisco Filipe Martins, Jorge Morais «Xabregas», Jorge Tuna, José Amaral, José Eliseu e o próprio José Paulo, nomes acrescidos de mais dois do firmamento clássico (António Silva Leite, Franz Schubert).

Querer-se-ia, Senhoras, Senhores, Amigos, maior abrangência ? Por isso eu creio que a Obra hoje trazida a público bem pode ser um livro gerador de consensos, consensos que nos façam tocar e continuadamente ouvir tocar a Guitarra de Coimbra com uma racionalidade emocionada, sentimento porventura simbolizável no «remate em lágrima» da parte frontal da cabeça do instrumento, sentimento que a todos faça esquecer a «maldição dos deuses pequeninos», poéticas palavras de Luiz Goes na sua belíssima Canção Pagã, sentimento que a todos lembre, sempre, as palavras com que, na Sala dos Capelos, em Outubro de 1993, Vergílio Ferreira (1916-1996) fechou a solene petição do grau de dr. h.c. pela Faculdade de Letras:

- Coimbra está para mim nas cordas de uma Guitarra.

Mesmo para terminar, direi algo que afinal todos já sabem: José Santos Paulo é senhor de uma pouco vulgar capacidade de trabalho. Projectos não lhe faltam. E talvez em 2008 aqui possamos voltar para a pública apresentação do trabalho que se segue: um CD com a interpretação de uma série de valsas, mazurkas e outras danças do Maestro João Anjo, com transcrições para Guitarra do próprio José Paulo. Pois que venha breve ! – é o voto que formulo.

Muito Obrigado.

Coimbra e ACM, 24 de Março de 2007
* Ed. Comemorativa dos 115 Anos da Tuna Académica da Universidade de Coimbra, Coimbra, TAUC, 2006, 400 pp.
** Intervenção na sessão pública de apresentação da Obra (Coimbra, Associação Cristã da Mocidade [ACM], 2007/03/24).
[1] Cf. HOMEM, Armando Luís de Carvalho – «Herança [A] (possível) d’ “os Melos” na Guitarra de Coimbra: três temas de Álvaro Aroso (anos 70 / anos 80). Nótulas sobre práticas de uma certa Arte de navegar» [aguardando publicação, 2007; disponível em http:// guitarradecoimbra.blogspot.com/ (post de 2005/03/08, reed. com retoques e aditamentos em 2007/01/03)].

segunda-feira, março 26, 2007













Lançamento do Método de Guitarra Portuguesa de José Santos Paulo, no sábado passado, no salão nobre do ACM. Fotos de vários cultores da Canção de Coimbra e de amigos do autor do método.






Lançamento do Método de Guitarra Portuguesa no sábado passado no salão nobre do ACM. Na mesa que deu início ao lançamento, estiveram José Paulo, António Ralha que deu uma boa lição sobre guitarra, Armando Luís de Carvalho Homem que apresentou o método, Mário Nunes Vereador da Cultura da CMC, José Castanheira presidente do ACM, Manuel Rocha presidente do Conservatório de Música de Coimbra, António Nascimento presidente da TAUC e José Rodrigues patrocinador do método. Na foto final, aspecto da assistência.




Lançamento do Método de Guitarra Portuguesa de José Paulo. Álvaro Aroso, António Ralha e José Paulo nas guitarras, Eduardo Aroso e Carlos Teixeira nas violas, abrilhantaram a festa.








Lançamento do Método de Guitarra Portuguesa, de José Santos Paulo, no sábado passado, no salão nobre do ACM. Alunos do conservatório de Coimbra onde José Paulo dá aulas de guitarra portuguesa, tocaram algumas das peças incluídas no método.

domingo, março 25, 2007

Imagens da Crise Académica de 1907

Brito Camacho
Nascido no Alentejo, Aljustrel, Manuel de Brito Camacho (1862-1934) viveu a maior parte da sua vida em Lisboa. Estudou no Liceu de Beja, passou de raspão pela Escola Politécnica de Lisboa e formou-se na Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa em 1884.
Trabalhou como médico militar, jornalista e político ao serviço da causa republicana. Em 01 de Janeiro de 1906 fundou e passou a dirigir o jornal A LUCTA, periódico onde desenvolveu intensa campanha pró-republicana. Acompanhou de perto o fluir e evoluir da Crise Académica de 1907, sempre ao lado da causa estudantil.
Informações on line:
-"O treino do Leão",
-"Figuras Célebres",
-"Brito Camacho",
-"Planície Heróica",
-"Escola Secundária de Diogo de Gouveia" (de onde extraímos a foto supra),


O Reitor franquista
Após a demissão de Santos Viegas, D. João de Alarcão foi o reitor da Crise Académica de 1907 e o braço direito de João Franco na UC. Os "160 Intransigentes" jamais lhe perdoaram as negociações "doces" que usou para mobilizar a seu favor os desesperados pais dos alunos e seduzir os grevistas com promessas de amnistia e de aproveitamento escolar.
O fidalgo D. João de Alarcão Velasques Sarmento Osório nasceu no Espinhal, Concelho de Penela, a 05 de Novembro de 1854. Era bacharel pela Fac. de Direito da UC (1871-1876). Dedicou-se à actividade político-partidária e ao funcionarismo público superior. No seu currículo inscreviam-se os cargos de Governador Civil da Guarda (1886) e do Funchal, Ajudante do Procurador da Coroal (1890), Par do Reino (1898), Governador Civil de Lisboa (1900 e 1905), Ministro das Obras Públicas (1905), diplomata no reinado de D. Manuel II (1908) e Ministro da Justiça (25/12/1908 a 11/04/1909).
Por decreto da equipa ministerial de João Franco, com data de 18 de Abril de 1907, foi nomeado Reitor da UC, confirmando de novo as apetências governamentais pela intromissão na vida interna e gestão da Alma Mater Studiorum. Fruto da sua acção apaziguadora, o Decreto de 22 de Maio de 1907 e o Decreto de 26 de Agosto de 1907 viabilizaram a reabertura das aulas, a realização de exames de fim de ano e a comutação das penas disciplinares de expulsão assinadas pelo Conselho de Decanos.
D. João de Alarcão foi exonerado, a seu expresso pedido, em Novembro de 1907. Viria a falecer em Montemor-o-Velho a 12 de Setembro de 1918. O funeral, realizado numa 6ª feira, 13 de Setembro de 1918, revestiu-se de grande solenidade. Velado com o Grande Uniforme de Conselheiro de Estado (conforme consta do seu retrato reitoral), o seu bicórnio e espadim foram transportados atrás do ataúde por um amigo íntimo da família Alarcão (cf. necrologias da "Gazeta de Coimbra", edições de 14 e 17 de Setembro de 1918).
AMNunes


António José de Almeida
Oriundo de Penacova (27/06/1866), AJA fez o Liceu de Coimbra e concluiu os seus estudos superiores na Fac. de Medicina da UC em 30/07/1895.
Ainda liceal, causou enorme agitação em Coimbra por ter promovido em 15 de Novembro de 1889 a celebração da implantação do regime republicano no Brasil. Na sequência do Ultimato Britânico de 11 de Janeiro de 1890, redigiu e publicou um exaltado texto onde criticava o regime e o Rei D. Carlos, a que deu o título de "Bragança, o último". Este artigo veio a público num jornal estudantil editado por Afonso Costa, «O Ultimatum», com data de 23 de Março de 1890.
Acusado de abuso de imprensa e de falta de respeito ao Chefe de Estado, AJA foi julgado no tribunal de Coimbra a 25 de Junho de 1890, conjuntamente com o seu colega de Direito Afonso Costa, e condenado a três meses de prisão. O proprietário da Tipografia Operária, Pedro Cardoso, viu-se a braços com um processo e o jornal não conseguiu ultrapassar o primeiro número. O defensor de AJA foi o advogado e antigo estudante de Direito Manuel de Arriaga, um republicano moderado, conhecido pelas suas propensões artístico-humanísticas, que AJA viria a convidar em Outubro de 1910 para assegurar a Reitoria da UC.
Ao longo dos anos de curso, AJA intensificou a sua militância ideológica em prol da causa republicana. Participou activamente na preparação da rebelião republicana portuense do 31 de Janeiro de 1891 e na Greve Académica de Maio de 1892 contra as medidas autoritárias do Governo de José Dias Ferreira.
O seu temperamento fogoso, a figura garbosa e o verbo inflamado faziam de AJA um líder juvenil sedutor. Mas se estes atributos soavam a virtudes aos ouvidos dos republicanos e descontentes com a obsolescência do rotativismo, para os lentes monárquicos eram um sinal de imprudência. Logo nos alvores do curso, AJA tornou-se notado como bom aluno, revelando capacidades e ambições que o poderiam guindar ao claustro docente. Consciente das potencialidades do jovem AJA e querendo evitar uma "lança em África", o lente de Medicina Lopes Vieira, fazendo uso de uma atitude criticável, emitiu uma informação escrita dirigida a outros colegas, tentando sensibilizá-los para a necessidade de em circunstância alguma AJA vir a ingressar no copo docente da Fac. de Medicina. Lopes Vieira não perderia pela demora, tendo AJA escrito "Desafronta e palavras de um Intransigente", uma obra que o guindaria ao estatuto de herói estudantil e passaria a leitura de cabeceira de muitos liceais e universitários.
Membro dos "46 Incondicionais" que lutando contra o encerramento da UC por José Dias Ferreira, o fechamento da AAC no Colégio da Trindade, e a exigência de um camuflado pedido de desculpa escrito que possibilitaria aos académicos arrependidos a realização de exames, AJA perdeu o ano.
Após a formatura, trabalhou em Angola, São Tomé e Príncipe e realizou estágios científicos em Paris. Regressado a Portugal, seria eleito deputado pelo Partido Republicano, seguindo-se logo em 1906 a actividade parlamentar na Câmara dos Deputados. Na qualidade de deputado, AJA viveu intensamente a Crise Académica de 1907 e por diversas vezes interpelou o Governo de João Franco sobre o curso dos acontecimentos. A esse propósito, ficaram célebres os longos discursos proferidos nos dias 05 de Março, 05 e 09 de Abril de 1907, onde relembrou em tom condenatório os acontecimentos académicos de 1892 e traçou duras críticas à UC. Nelas se vislumbra já uma parte das reformas que viria a implementar em Outubro de 1910 (cf. AJA, "Quarenta Anos de Vida Literária e Política, II, 1933, pp. 73 e ss.).
Preso na sequência do golpe republicano de 28 de Janeiro de 1908, AJA assumiu no Governo Provisório Republicano a pasta do Interior (1910-1911), correndo então nesse ministério os negócios da Instrução Pública.
Na dupla qualidade de Ministro do Interior [e da Instrução] deslocou-se a Coimbra em 19/10/10910, acompanhado pelo novo Reitor da sua confiança, Manuel de Arriaga, procedendo à laicização da UC, à abolição do antigo cerimonial e protocolo, à extinção de cursos e à implementação centralista de um novo programa de estudos superiores.
Apesar de ter sido na recta final do reinado de D. Carlos um dos organizadores da carbonária, AJA mostrou ser um político republicano moderado, próximo de uma sensibilidade humanística cristã anti-clerical e do republicanismo laico e demo-liberal, facetas que o tornaram muito apreciado em Coimbra e no resto do país.
Acusado de manobras demagógicas para captar apoiantes - parece que com alguma inveja e injustiça da parte dos seus pares e detractores -, AJA, ao contário de outros líderes republicanos elitistas e novos-ricos, dava mostras de sentir-se à vontade no meio das multidões e dos seus apoiantes populares.
Profundamente pressionado entre Outubro de 1910 e Julho de 1911 por um grupo académico radical, auto-designado Falange Demagógica, AJA não cedeu às exigências anarquistas e jacobinas extremadas que reclamavam em Coimbra e no Parlamento a extinção da UC.
No decurso do cisma republicano, fundaria em 1912 o Partido Evolucionista. Primeiro Ministro do bloco União Sagrada, em 1916 AJA visitou demoradamente a UC que o recebeu numa atitude humilde e subserviente, como que a pedir-lhe desculpa pelos "erros" do passado e a querer demonstrar que modernizara o ensino, a investigação e o corpo docente. Tolerante com a sua Alma Mater, AJA não deixou, contudo, de com ela ser injusto:
-promoveu logo em 1911 eleições reitorais para as novas universidades de Lisboa e Porto, mas impôs à UC um reitor da confiança do governo, opção centralista e dirigista que tendeu a arrastar-se no tempo;
-nunca deu sinal à UC de que aprovava o retorno do cerimonial ou a eleição reitoral, quando em simultâneo valorizou as aberturas solenes que se passaram a realizar em Lisboa e Porto. Profundamente atingida no seu património simbólico, a UC como que perdeu a sua identidade multissecular, fulminada por aviltamentos que atingiram o auge em 1919 com o Ministro da Instrução Leonardo Coimbra e o seu reitor e lugar-tenente Joaquim José Coelho de Carvalho;
-privou a UC do seu património simbólico (cerimonial, insígnias, trajes), sem que tomasse idênticas medidas em relação às Escolas Médico-Cirúrgicas, Escolas Politécnicas e Academia de Ciências (igual contenção vestimentária seria observada pelo Ministério da Justiça relativamente aos uniformes judiciários que continuarem em pleno uso, bem como pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, onde foram mantidos o Grande Uniforme de diplomata e as cerimónias de apresentação de credenciais). Na qualidade do Ministro do Interior do Governo Provisório, não são conhecidos a AJA normativos de abolição dos Trajes de Gala, insígnias e cerimonial das Câmaras Municipais. As comissões executivas municipais nomeadas logo após o 05 de Outubro de 1910 deixaram de observar o cerimonial municipal espontaneamente...
-guardou silêncio quando a partir de 1915-1916 alguns dos antigos lentes da Fac. de Direito da UC transferidos para o Studium Olissiponensis começaram a aparecer em Hábito Talar e Borla e Capelo nas aberturas solenes do ano escolar da Universidade de Lisboa (entre eles contavam-se críticos como Afonso Costa). E procurando estabelecer outros parelismos temáticos, na Presidência da República, ultrapassado o ciclo de extrema austeridade institucional associado a Teófilo Braga (1910-1911), o primeiro Presidente eleito, Manuel de Arriaga (1911-1915), retomou o protocolo de Estado em termos de recepção de diplomatas, cerimónia de posse presidencial e cortejo solene de carruagens entre o Palácio de Belém e o Parlamento;
-os silêncios de AJA acabariam por reverter a favor de Sidónio Pais. Jubilosamente aclamado pela UC em 1918, coube-lhe sancionar o retorno do cerimonal conimbricense reformado.
Paladino da participação de Portugal na Grande Guerra e Presidente eleito da República entre 06/08/1918 e 05/10/1923, AJA cumpriu mandato integral. Consolidou as relações diplomáticas entre Portugal e o Brasil e tornou-se conhecido pelas tentativas de entendimento cordial com a Igreja Católica.
A cerca de um ano do término do seu mandato, em Outubro de 1922 ocorreu em Lisboa o sangrento assassinato de Machado dos Santos e de António Granjo (que se havia destacado como figura de proa da Crise Académica de 1907).
Após a Revolução de 28 de Maio de 1926, AJA continuava a contar adeptos em Coimbra. Entre 1926-1929, nas tascas, mercearias e barbearias do Largo da Feira, Rua dos Estudos e Rua Larga, vozes soltas de desolados com os rumos da Ditadura Militar gritavam "Viva o António José".
Figura prestigiada da Primeira República, AJA faleceria no dia 31 de Outubro de 1929, ao cabo de longos padecimentos provocados pelo excesso de ácido úrico que nos dias piores o conduziam à cadeira de rodas.
Fontes on line:
-"O Portal da História. António José de Almeida",
-"O Portal da História. Discurso..." (com foto supra utilizada),
-"António José de Almeida, 6º Presidente da 1ª República. O Leme. Biografias",
-"Presidência da República. Antigos Presidentes: António José de Almeida",
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José Eugénio
José Eugénio Dias Ferreira, nascido em Lisboa no ano de 1882, faleceu no dia 16 de Janeiro de 1953, sendo lente de Direito no Instituto de Ciências Económicas.
JEDF, licenciado em Direito pela UC, foi reprovado no segundo dia de provas de doutoramento, a 28 de Fevereiro de 1907, não devido a deficiências técnico-científicas de que padecesse a sua tese, antes a manifesto acto de abuso administrativo perpetrado pelo júri, que ultrapassando largamente os tradicionais excessos de linguagem e dureza das interpelações toleradas no "milieu", massacrou e humilhou o candidato.
Para espanto e escândalo da Academia, alguns dias antes da data marcada para os actos magnos (provas de arguição), já corria em modo de rumor que os arguentes pretendiam espremer o canditado. Este rumor fez correr à Sala dos Actos Grandes exagerado vulto de público.
Para os estudantes, "espremer" significava dar luta brava a um candidato a doutor, mas não chumbá-lo. Os dois dias de arguições foram marcados por interpelações exaltadas, frases acintosas, dichotes prepotentes e expressões de mal disfarçada impaciência, especialmente por parte do Doutor Álvaro Machado Vilela, gerando-se assim um ambiente muito tenso que não parecia deixar adivinhar bom desfecho.
Com efeito, a falta de respeito pela pessoa do doutorando e o clima de exaltada crispação não tardaram a confirmar os boatos. Três bolas pretas declararam o candidato reprovado por unanimidade.
A Academia levou José Eugénio em ombros, aclamou-o como herói e iniciou uma das mais importantes greves estudantis de todo o século XX.
Anos mais tarde, José Eugénio viria a defender a sua tese de doutoramento em Direito na sua Alma Mater e, devidamente aprovado e laureado, prestigiou o corpo docente do Instituto de Ciências Económicas/ISCEF.
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Dias Ferreira
José Dias Ferreira (Arganil, 1837-Vidago, 1909) foi um aluno brilhante das Faculdades de Teologia e de Direito da UC (1852-1859). Protegido pelo lente liberal Vicente Ferrer, doutorou-se em 29/06/1860. Começou a trabalhar como lente substituto em 10/05/1861, tendo ascendido a lente catedrático de Direito Civil em 1866.
Em paralelo, JDF exercitava-se na advocacia e na política. Radicado em Lisboa com a família no ano de 1865, abandonaria a docência na UC para se dedicar à advocacia,à actividade política e à gestão de negócios.
Na constância de um segundo casamento, em 1882, foi pai de José Eugénio Dias Ferreira, o candidato reprovado pela Faculdade de Direito da UC nos actos magnos de doutoramento nos dias 27 e 28 de Fevereiro de 1907.
JDF era deputado por Aveiro em 1892 quando estalou a crise do sistema rotativo tradicionalmente repartido entre o Partido Progressista e o Partido Regenerador. Em Janeiro de 1892 o Rei D. Carlos I convidou JDF a formar governo. O "Governo da Acalmação Partidária", chefiado por JDF tomou posse a 17 de Janeiro de 1892 e logrou manter-se em funções até 23 de Fevereiro de 1893.
Durante o governo de JDF, ocorreu na UC uma greve estudantil, corria Maio de 1892. Confrontado com as manifestações de hostilidade ao governo e com a crescente visibilidade da causa republicana no meio académico, JDF mandou encerrar compulsivamente a AAC e exigiu aos grevistas que pretendiam realizar exames e transitar de ano uma declaração escrita, na qual deveriam fazer prova de que só tinham aderido à greve sob coacção de outros colegas.
No meio dos grevistas destacavam-se os estudantes de Medicina António José de Almeida e de Direito Afonso Costa, ambos bem conhecidos pelo desassombro verbal e simpatias republicanas. Constituído um grupo de "46 Incondicionais", JDF não se comoveu nem intimidou. Mobilizou a polícia, que segundo António José de Almeida "deu pranchadas", exiguiu que os estudantes revoltosos abandonassem Coimbra no prazo de 24 horas, e por fim, reabriu a UC, exigindo o documento escrito que tanto indignou a Academia.
António José de Almeida e Afonso Costa integravam os "46 Incondicionais" «que se não prestaram a essa vilíssima comédia», tendo perdido o ano escolar. A rainha D. Amélia, de visita a Coimbra, ainda tentou meter água na fervura a favor da causa estudantil, mas JDF não recuou nem um milímetro.
António José, apesar da sua reconhecida bonomia, não conseguiu encontrar desculpa para a dureza das medidas implementadas por JDF em 1892 e tratou de relembrar o assunto nos debates que travou na Câmara dos Deputados em Março de 1907. Quando chamou à ordem do dia a Crise Académica de 1907, não conseguiu evitar a comparação entre o José Dias Ferreira de 1892 e o João Franco de 1907. Na opinião de António José, a má lembrança da acção de JDF pairava sobre os acontecimentos de 1907 como um aviso à prudência.
[Coimbra, 1993: causou sensação nos círculos intelectuais a nomeação da economista Manuela Ferreira Leite como Ministra da Educação do governo do PSD liderado por Aníbal Cavaco Silva. O que esperar da bisneta de José Dias Ferreira e neta de José Eugénio Dias Ferreira, o primeiro ligado à Greve Académica de 1892, o segundo considerado causa directa da Crise Académica de 1907? Vivamente contestada pelo teor das medidas implementadas entre 1993-1995 à frente da Pasta da Educação, foi justamente nos círculos conimbricenses que começou a correr o epíteto de "Dama de Ferro"...]
Informação disponível na Internet:
-"José Dias Ferreira", http://pt.wikipedia.org/wiki/Jose_Dias_Ferreira (foto de 1870);
-"José Dias Ferreira", http://www.sgmf.pt/;
AMNunes


Antero de Quental
Retrato do jovem Antero Tarquínio de Quental. Natural de Ponta Delgada (18/04/1842), Antero suicidou-ne no Campo de São Francisco, frente ao Convento da Esperança, na sua cidade natal, a 11 de Setembro de 1891. O seu túmulo, à entrada do Cemitério de São Joaquim (Ponta Delgada), ostenta um comovente epitáfio de João de Deus e uma coroa de ferro forjado da autoria do artista conimbricense Daniel Rodrigues.
Antero era um sério candidato a um curso de Filosofia ou ao currículo do Curso Superior de Letras. Nem um nem outro existiam em Coimbra nas décadas de 1850-1860, lacuna que conjugada com pressões familiares conduziu muitos jovens à vacilante opção pelo Direito.
Chegado a Coimbra em 1855, Antero seria acolhido por seu tio, o lente de Medicina Filipe de Quental, um republicano muito activo nas causas cívicas da urbe mondeguina. Antero rapidamente se ambientou no meio estudantil, tendo prosseguido com sucesso os estudos liceais no Colégio de São Bento. A farta cabeleira e o penteado bizarro valeram-lhe a alcunha de "O Marrafa". A 02 de Outubro de 1858 Antero matriculou-se no primeiro ano de Direito, curso que viria a concluir em 1864.
À semelhança de grande parte dos estudantes do seu tempo, Antero começou por ser católico e adepto das praxes académicas, rituais que caso atingissem determinado grau de violência poderiam ser alvo de sindicância disciplinar por parte da Polícia Académica e Conselho de Decanos. Na noite de 20 de Abril de 1859, Antero e outros colegas como Alberto Sampaio, organizaram uma trupe e embuçados e armados de mocas, palmatórias e tesouras, tosquiaram caloiros (alunos do Liceu de Coimbra).
Conforme noticiou "O Conimbricense", de 26 de Julho de 1959, um acórdão do Conselho de Decanos, com data de 13/06/1859, expulsava da UC por um ano os novatos José Sampaio e António Barranca. Alberto Sampaio, Antero de Quental e Martinho Raposo teriam de cumprir oito dias na Cadeia de São Boaventura.
Virá desta altura a aversão de Antero ao Reitor Basílio, cuja assinatura figurava à testa do acórdão do Conselho de Decanos. Dada a proximidade das férias de Verão, Antero solicitou o adiamento do cumprimento da pena. Com efeito, o Conselho de Decanos consentiu na prorrogação do prazo, tendo Antero tomado o vapor para Ponta Delgada. Regressado de férias, Antero deu entrada na Cadeia de São Boaventura no dia 15 de Outubro de 1859, em cuja enxovia permaneceu oito dias (Ana Maria Almeida Martins, "Antero de Quental. Fotobiografia", Lisboa, INCM, 1986, p. 69, Doc. 56, mostra erradamente a Cadeia da Biblioteca Joanina).
Antero faz a sua viragem intelectual nos inícios da década de 1860. São os anos da veia libertária e dos inflamados discursos que faziam correr "discípulos" ao seu quarto e às escadarias da Sé Nova no Largo da Feira dos Estudantes.
Ficariam na memória:
-Abril de 1861: funda a Sociedade do Raio;
-21/10/1862: Felicitação Académica ao Príncipe Humberto de Itália, publicada no jornal "O Conimbricense", de 25/10/1862, onde se exalta a figura heróica de Garibaldi;
-08/12/1862: evacuação da Sala dos Capelos em protesto contra as medidas de controlo disciplinar do Reitor Basílio de Sousa Pinto;
-Dezembro de 1862: Manifesto dos Estudantes da Universidade de Coimbra à Opinião Ilustrada do País;
-25/04/1864 a 13/05/1864: Rolinada. Não tendo o Governo concedido aos estudantes dispensa de exames (ou seja, passagem administrativa) por ocasião do nascimento do Príncipe D. Carlos, Antero liderou um protesto incendiário que levou a Academia quase em peso à cidade do Porto (30/04/1862). Regressados os manifestantes a Coimbra, no dia 13/05/1863, os cabecilhas da Rolinada seriam amnistiados por Decreto de 13 de Maio de 1864, publicado no "Diário de Lisboa, de 23/05/1864;
-Novembro de 1865: Questão Coimbrã.
Antero ficaria para sempre ligado a imaginário mítico coimbrão, relembrado nas palavras de Eça de Queirós ("Um génio que era um santo") e na poesia de Manuel Alegre ("Tempo que não passa").
O "Príncipe da Mocidade" - assim falava Eça -, guardou de Coimbra uma imagem marcada pelo romantismo e pela emoção, a ela se referindo no prefácio de "Primaveras Românticas" (1872): «Fomos todos assim, naquela encantada e quase fantástica Coimbra de há dez anos».
Na óptica dos "46 Incondicionais" da Greve de 1892 e dos "160 Intransigentes" da Crise Académica de 1907, Antero de Quental era um capital simbólico precioso. Na sua "História da Greve Académica de 1907", Alberto Xavier dedicou-lhe 27 páginas.
Fotografia: "Antero Tarquínio de Quental", http://pt.wikipedia.org/wiki/Antero_de_Quental.
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O Reitor Basílio
O reitorado de Basílio Alberto de Sousa Pinto (1793-1881), Visconde de São Jerónimo e Doutor em Leis (1817), decorreu entre 1859 e 22 de Julho de 1863.
Conhecido pela sua extrema severidade e rigor disciplinar, Basílio breve se tornaria um reitor detestado pelos estudantes liberais, republicanos e socialistas, que o alcunharam de "Czar de Borla e Capelo".
Basílio jogou e perdeu a cartada da Capa e Batina. Em termos de costumes académicos, o seu reitorado representou o fim de um tempo marcado pelo desejo de manutenção da velha Loba e Mantéu, a que os académicos progressistas opunham proclamações de abolicionismo radical ou a introdução de mecanismos modernizantes como os sapatos vulgares, a calça comprida, a capa talar singela de colarinho militar e a casaca burguesa.
Considerado uma anacrónica e intolerável sobrevivência do espírito despótico do Ancien Régime, o antigo vintista Basílio viu-se confrontado com a tenaz oposição estudantil que lhe foi movida pela Sociedade do Raio ("do raio que o parta", ou "do raio que o fulmine", dizia-se) liderada por Antero de Quental.
A grande acção de protesto direccionada contra a gestão e a pessoa do Reitor teve lugar em 08 de Dezembro de 1862, dia da Imaculada Conceição (Padroeira da UC), durante a cerimónia de atribuição dos prémios aos alunos distintos. Quando o Reitor se levantou e pretendeu iniciar o seu discurso, a Academia presente na Sala dos Capelos, em execução da estratégia delineada pela Sociedade do Raio, ergueu-se e abandonou em peso o salão nobre.
Antero escreveu então e fez distribuir pelo país uma notável peça de oratória e de fino quilate cultural, o "Manifesto dos Estudantes da Universidade de Coimbra à Opinião Ilustrada do País", onde justificava as razões da oposição manifestada ao reitorado de Basílio.
Em tempos de militância cívica, debate sobre a escolarização e melhoria das condições de vida do operariado, assistência económica a estudantes carenciados, discussão sobre regimes políticos, o associativismo entrava em fase expansionista. Foi neste conturbado reitorado que um grupo de académicos activistas, influenciado por experiências filantrópicas, desportivas, culturais e recreativas como as que estavam a ser intentadas na Suiça e em Cambridge, fundou a primitiva AAC. Com a designação de Clube Académico de Coimbra, este organismo associativo viu os seus primeiros estatutos aprovados pelo Decreto de 19 de Fevereiro de 1862.
A partir da Revolta Académica de 08 de Dezembro de 1862, o Reitor Basílio e o estudante Antero seriam recorrentemente lembrados pela Academia, num jogo de oposições e de confrontos entre Despotismo/Liberalismo, Atraso/Progresso, Dogmatismo Catedrático/Pedagogia.
Aos olhos e espíritos dos académicos implicados na Crise Académica de 1907, Basílio e Antero foram de novo actores imprescindíveis da historicidade reclamada para articular os discursos e a dramatização vividos entre 27 de Fevereiro e 26 de Agosto.
Fonte: pormenor do retrato existente na Galeria dos Reitores da UC, reproduzido a preto e branco em Manuel Augusto Rodrigues, "A Universidade de Coimbra e o s eus Reitores", Coimbra, AUC, 1990, p. 495. O Reitor fez-se retratar em Grande Uniforme de Conselheiro de Estado.
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