terça-feira, fevereiro 07, 2006


Orfeon Académico de Coimbra, em Angola, no ano de 1967. Podem ver-se os componentes do Grupo de Fados e Canções de Coimbra, António Andias e Hermínio Menino (gg), Jorge Rino (v), Barros Madeira e José Manuel Santos, cantores. José Miguel Baptista, que também cantou nesta digressão, não está na foto; espólio de Custódio Moreirinhas. Posted by Picasa


Virgínia Pestana homenageada. Notícia do Diário das Beiras de hoje, com texto de Ana Luísa Barroso e foto de Lobo.
Podemos ver na foto três elementos do Coro dos Antigos Orfeonistas: Valentim Vicente, Luís Santiago e Paulo Veiga. É orador o Presidente da Junta dos Olivais, Francisco Andrade.


Fados Populares Posted by Picasa
Aspecto do CD "Fados Velhos. Ronda dos Quatro Caminhos", Lisboa, Movieplay, MOV 30.359, ano de 1998, remasterização do LP "Fados Velhos", Contradança, LP87-01, ano de 1987. A formação era então constituída por João Cavadinhas (violão, Viola Braguesa, voz solo), Daniel Completo (violão e coros), António Prata (viola de arame, concertina, violino, coros), António Silva Lopes (guizos, voz solo) e Fátima Valido (voz, banjo, cavaquinho, flauta). Os Ronda apresentaram um curioso e insólito projecto de reconstituição de espécimes rotulados de "fados" pelo povo, de parceria com uma ou outra melodia sentimental. O trabalho era baseado, no essencial, nas já muito extensas recolhas de José Alberto Sardinha e também nas gravações realizadas nos Açores pelo Prof. do Conservatório Nacional Artur Santos.
Temos assim fados populares, alguns dos quais coreográficos, acompanhados primacialmente pela viola de arame (Braguesa), cuja proveniência remete o auditor para a Beira Alta (Fadinho), Minho (Siga a Rusga), Douro Litoral (Fado Batido) e Açores (Fado da Povoação, Fado Velho). Depois, há assinalar dois espécimes sentimentais ligados à Ilha Terceira (Pezinho e Fado do Estudante), ambos oitocentistas, sendo o Fado do Estudante aclimatado a partir da respectiva estrófica conimbricense e o Pezinho uma moda valseada com estranha proximidade às "puxadas" que os serenateiros da tempo da Toeira dedilhavam em Coimbra. A fechar a amostra, indiquemos uma versão vulgar da coimbrã Jovens Sereias, recolhida nos arredores de Coimbra (Canção de Coimbra) e o magnífico instrumental de viola de arame Valsinha (em bom rigor é a "Sapateia Valseada", recolhida em 1960 pelo Prof. Artur Santos na Ilha de São Miguel, com toques de Viola da Terra por Manuel Moniz Pimentel e Emundo Pimentel. Cf. reedição "O Folclore Musical nas Ilhas dos Açores. Ilha de São Miguel. Antologia Sonora. Campanha de 1960", Ponta Delgada, Instituto Cultural de Ponta Delgada, 2001, cd nº 1, faixa nº 25).
"Fados Velhos" é documento único no contexto em que foi produzido. Os autores do projecto talvez pudessem ter ido um pouco mais longe na selecção da amostragem:
- omitiram os fados coreográficos do Ribatejo, da Estremadura e da Beira Litoral;
-poderiam ter diversificado as violas de arame utilizadas, indo um pouco além da Braguesa;
-poderiam ter sido mais rigorosos na indicação dos locais onde foram efectuadas as recolhas, pois o genérico e seco "Beira Alta", "Douro Litoral", não facilita a investigação;
-poderiam ser mais precisos quanto à inclusão de certos temas que até talvez sejam rotulados de fados, mas não são de modo algum fados. No entanto, temos de reconhecer a máxima honestidade dos Ronda quando escreveram na memória de apresentação "Para não enveredarmos nestas linhas por caminhos que não são os nossos, diríamos resumidamente que este é um disco de canções tradicionais às quais o povo chama fados e, outras, que talvez também se pudessem chamar fados." Mais claro do que isto...
O disco trazia as letras dos temas cantados e um breve texto de apresentação. Parcos em palavras, os membros dos Ronda afloravam muito ao de leve questões inabituais e provocatórias sobre as origens, classificação e dispersão geográfica do Fado, suscitadas a partir dos encontros e conversas havidas com José Alberto Sardinha.
Parece que finalmente, 19 anos volvidos, José Alberto Sardinha se prepara para nos brindar com algumas respostas nada canónicas.
AMNunes


Sons da Braguesa Posted by Picasa
Grande plano do rosto do LP "Braguesa. Júlio Pereira", Lisboa, Sassetti, TR-004, ano de 1983. Obra sonora notável, muito marcada pelo amor das elites de esquerda às tradições musicais portuguesas, fruto da herança colhida nos levantamentos de Ernesto Veiga de Oliveira e Michel Giacometti. Havia nesse tempo quem entendesse, nos meios mais requentados, que o único e verdadeiro caminho para a música de expressão portuguesa era fazer arranjos para canções urbanas baseados em viras, chulas e malhões. Foi o chamado movimento da "Música popular Portuguesa". Laborando no essencial sobre canções populares provinciais, Júlio Pereira presta um contributo inestimável à causa das violas de arame, particularmente à Viola Braguesa. Entre os participantes e colaboradores contam-se nomes bem conhecidos como Janita Salomé, Pedro Caldeira Cabral (viola de gamba, ocarina) e Amélia Muge (voz). Júlio Pereira procede a fusões instrumentísticas, mas no essencial, confere primazia à Braguesa, tocada nas técnicas do rasgado e do ponteado. O interior do disco funciona como uma autêntica masterclass, incorporando um documentado texto de Ernesto Veiga de Oliveira ("Viola Braguesa. Actas do V Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros") e um diaporama fotográfico que mostra o processo completo de fabrico de uma Braguesa na oficina bracarense de Domingos Machado.
A Viola Braguesa, também conhecida por Chuleira e Ramaldeira (Porto e Douro Litoral) ainda hoje é grandemente utilizada no Minho e no Douro Litoral, seja em tocatas de grupos folclóricos, seja em grupos de música ligeira de expressão tradicional. Uma das afinações mais celebradas nesta viola de cinco ordens de cordas duplas é a do chamado Fado da Mouraria (Sol, Ré, Lá, Sol, Dó), cuja origem está por estudar. Camilo Castelo Branco, nos tempos da juventude esturdiosa vividos na cidade do Porto (anos de 1840-1850), tocava nesta "Viola Chuleira" românticas cantigas de pinga-amores e fadinhos corridos. Desengane-se pois quem pensar que a Braguesa é apenas uma viola para chulas e viras de ranchos folclóricos.
AMNunes

Cordofones Tradicionais Portugueses em "escolas"
Após a Revolução de 1974 consolidou-se a necessidade de proteger e divulgar alguns cordofones tradicionais portugueses. No tocante às violas de arame regionais, algumas quase tinham desaparecido (caso da Toeira na Região de Coimbra, da Beiroa e da Campaniça), devido à morte dos tocadores mais idosos, ao esboroamento da prática das modas e danças regionais e, à acelerada mudança de gostos musicais. Relativamente a Lisboa, a prática do Fado e da Guitarra de Fado não desapareceram, mas o género e os cultores foram alvo de complicados processos de denegrimento, fruto de forçadas e equívocas tentativas de assimilação do Fado à ideologia do Estado Novo em processo de liquidação.
Em Coimbra viveram-se anos particularmente difíceis entre 1969-1978, marcados pela perseguição violenta aos cultores da Canção de Coimbra. Num registo mais popular, tinham desaparecido as Fogueiras de São João e , verificada a morte e o fechamento da oficina de Raul Simões, era caso para dizer "Toeira é morta"!
Nunca as violas de arame tradicionais, nem as guitarras, tinham sido ensinadas em academias ou conservatórios de música em Portugal. Perguntar ao director de um conservatório se havia hipótese de criar uma classe facultativa de Viola Braguesa ou de Guitarra de Coimbra poderia ser tomado como uma ofensa grave ou até sinal de menoridade cultural e intelectual.
Os primeiros passos com vista à implementação de planos de salvaguarda dos cordofones tradicionais portugueses surgiram nos Açores. A Viola da Terra estava em franco declínio na passagem dos anos 70 para os anos 80. Em algumas ilhas praticamente não existiam gravações discográficas da música tradicional local. O grande terramoto que em 1980 fustigou impiedosamente a Ilha Terceira terá ajudado a solidificar a consciência patrimonial local.
Se a década de 1980 ficou marcada nos Açores pela introdução experimental de duas classes de Viola da Terra nos conservatórios de Angra e de Ponta Delgada, a década de 1990 assistiu à entrada da Guitarra de Coimbra nos conservatórios continentais.
Aqui ficam algumas informações sumárias sobre o processo:
-Conservatório Regional de Angra do Heroísmo: existe uma disciplina de Viola da Terra em funcionamento desde 1983. Foi primeiro formador José Luís Lourenço. Desde 1996, o ensino tem estado a cargo de Lázaro Silva. Utiliza-se a Viola da Terra de modelo típico da Iha Terceira, com caixa grande, boca redonda, seis ordens metálicas (15 cordas), instrumento que se tem ressentido da falta de violeiros fabricantes activos na Iha Terceira. Contactos e informações através do telefone 295215021.
-Conservatório Regional de Ponta Delgada: existe uma disciplina de Viola da Terra, ministrada pelo tocador Ricardo Melo. A classe funciona desde 1982, ano em que começou com o Mestre Miguel de Braga Pimentel. Os resultados são considerados excelentes ao nível da adesão dos formandos, salvaguarda, divulgação e construção. Utiliza-se o modelo geral açoriano com caixa de 2 corações, escala de 12 pontos extra caixa e 5 ordens metálicas. O formador tinha em agenda editar um método no dia 18 de Fevereiro de 2006. Contactos e informações através do telefone 296285840.
-Conservatório de Música de Coimbra: no ano lectivo de 1997/1998 começou a funcionar uma classe de Guitarra de Coimbra com o formador Paulo Soares (JóJó). Posteriormente, a disciplina tem sido ministrada pelo executante Prof. José dos Santos Paulo, formador que tem pronto para edição um método didáctico.
-Secção de Fado da Associação Académica de Coimbra: em 1980 foi criada uma classe de Guitarra de Coimbra com João Moura. Posteriormente asseguraram esta escola Fernando Monteiro, Jorge Gomes e diversos discípulos daqueles dois formadores.
-Escola dos Antigos Orfeonistas do Orfeon Académico de Coimbra: classe de Guitarra de Coimbra aberta em 2002 sob orientação de Paulo Soares (Jójó). O formador editou um método em 1997.
-Museu do Fado (Lisboa): classe de Guitarra de Lisboa a funcionar regularmente, sob orientação do guitarrista António Parreira. Contactos através do telefone 218823470.
-Conservatório de Música do Porto: tem em funcionamento uma disciplina de Guitarra de Coimbra, com horário completo, ministrada pelo formador Carlos Jesus. Esta classe foi iniciada em finais da década de 1990 por Paulo Soares (Jójó). Contactos através do telefone 222073250.
Agradecimentos: Conservatório de Angra do Heroísmo, Conservatório de Ponta Delgada, Conservatório do Porto, Museu do Fado (Lisboa), Prof. José dos Santos Paulo (Conservatório de Coimbra), Dr. Jorge Gomes (Secção de Fado da AAC), Prof. Lázaro Silva, Mestre Miguel Pimentel
AMNunes


Verso da Fotobiografia de José Afonso Posted by Picasa
Inquietante e comovente texto de contracapa do livro de José Salvador, "José Afonso. O rosto da utopia", 1ª edição, Lisboa, Terramar, 1994. Repórter da TSF numa homenagem promovida por uma escola de Matosinhos a José Afonso, em finais de Fevereiro de 1994, o autor arrepiou-se ao perceber que os alunos do secundário pouco ou nada sabiam de José Afonso. As civilizações e os paradimas culturais não são imortais, como escreveu Paul Valéry no após Primeira Grande Guerra. As grandes causas de uma geração podem nada dizer às gerações seguintes. A única forma de evitar o esquecimento é produzir memória.
A caminho do 19º aniversário da morte de José Afonso, gostaríamos de perceber porque motivos não encontramos nas bibliotecas escolares portuguesas esta fotobiografia e pelo menos um exemplar de uma das várias antologias de textos cantados que se editaram desde finais da década de 1960. Entre Dezembro de 2005 e Janeiro de 2006 debalde temos percorrido livrarias em busca de antologias de textos de canções de José Afonso. A resposta é invariável: "não temos. Está esgotado"! Em vão vasculhámos casas de venda de discos, procurando uma impossível reedição completa da obra fonográfica de José Afonso.
Tendo em conta a pessoa e a obra, não deveria ser um Ministério da Cultura a tomar em mãos a iniciativa e os encargos de reedição da obra discográfica completa de José Afonso? Ok, estamos em Portugal, os tempos são de crise e de retorno ao liberalismo feroz e putrefacto de antes de 1929. Que nos diria José Afonso deste regresso ostensivamente musculado às razões de Estado despótico-pombalinas, à tão salazarenta e odiosa primazia do Poder Executivo que nos bastidores do Conselho de Ministros viola o respeito pelo Judicial e pelo Legislativo, aos patéticos apelos à mística do sacríficio nacional unindo nação e chefe naquele ideal que levou as mães italianas a ofertarem a Mussolini as alianças de casamento para superar as sanções decretadas pela Sociedade das Nações contra a Itália invasora da Etiópia, ao calvário dos funcionários públicos flagelados por aquela ameaça inspectorial presente na carta do humanista António Ferreira "A medo vivo/A medo escrevo e falo,/Hei medo do que falo só comigo,/Mas ainda a medo vivo, cuido,/A medo calo"?
AMNunes


Fotobiografia de José Afonso Posted by Picasa
Capa da obra do jornalista José Salvador, "José Afonso. O rosto da utopia", 1ª edição, Lisboa, Terramar, 1994. Obra meritória, nascida do propósito de colmatar lacunas sobre a vida e obra de José Afonso detectadas nos alunos do ensino secundário, já conheceu 2ª edição. A inventariação dos discos gravados por José Afonso é a parte menos conseguida, contendo lacunas e erros cronológicos que não foram corrigidos na 2ª edição. José Salvador, antigo estudante de Coimbra, natural de Espinho, é um jornalista premiado, com nome feito na área dos vinhos.
AMNunes

Biografia de Manuel Marques





















segunda-feira, fevereiro 06, 2006


Partitura de "Pensamento Livre", com música de Virgílio Caseiro e letra de João Valente. A letra desta canção de Coimbra é bem clara para se ficar a saber o que o autor pretende. A música com que Virgílio Caseiro a revestiu rompe com as mais vulgares soluções estilísticas e de encadeamento harmónico, como diz o autor no livro "Novas Canções para Coimbra". Posted by Picasa

domingo, fevereiro 05, 2006

"As Pupilas do Senhor Reitor" e outras dúvidas
Por António M. Nunes
Na sequência da edição on line de um artigo sobre Manuel Simões Julião, o historiador Armando Luís de Carvalho Homem exortou-nos a recolher dados sobre a banda sonora do filme "As Pupilas do Senhor Reitor" (1935), película que conteria os fundamentos da variante de "Fado Hylario Moderno" interpretado por Manuel Julião em 1964 na Serenata do Centenário de Augusto Hilário.
A este propósito solicitámos uma informação à Cinemateca em Janeiro de 2006. A resposta chegou em 23/01/2006, pela mão de Ricardo Martins. Foi possível averiguar que nem todas as canções do filme de 1935 se acham inventariadas na base de dados da Cinemateca. Só é possível reportar:
-VIRA DA DESFOLHADA, letra de Fernanda de Castro, música de Cruz e Sousa;
-CANÇÃO DA CABREIRA, letra de autor desconhecido, música de Afonso Correia Leite;
-CANÇÃO D'AMOR, letra de autor desconhecido, música de Afonso Correia Leite.
Há neste mesmo filme pelo menos mais duas canções de autorias não apuradas:
-CANÇÃO AO DESAFIO??
-MARCHA PARA AS VINDIMAS??
Nada é possível adiantar, para já, quanto à inclusão de "Fado Hylario Moderno" na abertura da película e muito menos quem seja o intérprete. Mais se acrescenta que este filme chegou a ser comercializado em cassete vídeo pela Lusomundo e pela Videotrónica, estando essas edições fora do mercado.
As questões oportuna e amavelmente formuladas por Armando Luís de Carvalho Homem conduzem-nos necessariamente a alguns esclarecimentos. O Blog "guitarradecoimbra" não tem cessado de aumentar o número de ciberbaunatas, quer em Portugal, quer em comunidades estrangeiras como sejam o Brasil ou a Alemanha. Em 5/02/2006 o contador arrolava mais de 48.000 frequentadores. Alguns dos leitores do Blog, por certo mais interessados em aprofundar este ou aquele assunto, deixam-nos questões que gostariam de ver respondidas.
A este propósito convém esclarecer que, embora o Blog tenha vindo a funcionar como base de dados e arquivo documental, não é nem pode ser considerado um centro de investigação onde supostamente trabalham a tempo inteiro diversos investigadores. É um Blog criado por um antigo estudante da Universidade de Coimbra, a título de hobby. Como tal, não há centro documental, não há corpo de investigadores, não há remunerações nem subsídios. Existem pessoas dedicadas à causa da Canção de Coimbra - vista como género artístico e património que importa salvaguardar e divulgar - que vão dando a sua colaboração, sem continuidade regular e a título puramente amadorístico.
Excluindo duas situações de reforma profissional (Octávio Sérgio e Anjos de Carvalho), de minha parte o Blog é apenas um hobby, sujeito às contingências da profissão docente, dos filhos pequenos e dos afazeres familiares. Confrontados com tais contingências, o Blog não pode milagrosamente suprir em meia dúzia de meses (ainda não fez um ano de existência!) a lacuna de um Centro de Recursos da Canção de Coimbra que deveria ter sido criado aquando da realização do 1º Seminário/1978 na Escola Municipal do Chiado (1978-1990), quiçá no momento da fundação da Secção de Fado da Associação Académica de Coimbra (1980), ou em complemento natural do Museu Académico.
Não compete a um blog, por mais dinâmico que seja, colmatar as lacunas deixadas em aberto pela negligência das instituições conimbricences que hipocritamente sacodem a água do capote, fingindo um festival aqui, colando um cartaz ali. A cidade de Buenos Aires, considerada pelo hemisfério norte uma urbe de terceiro mundo, criou os mais impressionantes centros documentais de apoio e divulgação do Tango. Basta fazer amena passeata pela internet para vermos o quanto o Tango é levado a sério pelas instituições culturais argentinas. Ele são as monografias sobre a História do Tango, em castelhano, francês e inglês, ele são as recolhas iconográficas, ele são as transcrições musicais, ele são as impressionantes reedições de "frituras" (discos antigos), ele são as divulgações de letras cantadas e os recenseamentos biográficos. A seu tempo Coimbra pagará o preço da leviana negligência. E só o perceberá quando um qualquer oportunista munícipe de uma qualquer "Aguidares de Baixo" se lembrar de zelar por aquilo que lhe der fama e lucro propagandístico.
Se aos olhos dos leitores parecem simples algumas das interpelações formuladas, aos nossos são questões merecedoras de grande seriedade de abordagem, de molde a evitar a repetição de erros crassos ou a propalação de mais "estórias de encantar". Confrontados com tão escassos meios e falta de tempo útil para realizar as necessárias investigações de fundo que tais questões nos merecem, optamos por não editar quaisquer respostas de menor qualidade ou que possam comprometer o grau de exigência imposto a nós próprios. Os leitores do Blog compreenderão tais limitações. Mais vale assumir que não sabemos tudo, do que adoptar ares de vendilhões de banha da cobra. "Especialistas" de CC é coisa que não falta! Infelizmente não podemos dizer aos nossos leitores, "aguarde um pouco, vou ali à nossa base de dados ver o que há sobre esse assunto". Se a nossa ocupação a tempo inteiro fosse apenas esta, talvez um dia se pudesse dizer "temos base de dados". Tal como está, temos hobby!
A eventual elaboração de respostas a questões obedecerá aos seguintes critérios: a) clarificação de fraudes autorais que possam prejudicar autores, seus legítimos herdeiros, ou lançar a confusão sobre obras de autor entretanto caídas no domínio público; b) necessidade de salvaguarda de obras desconhecidas ou em risco de perda patrimonial; c) arrolamento de suportes materiais e mecanismos de divulgação; d) desocultamento de biografias.
As questões, além de endereçadas ao titular do Blog, devem ser pertinentes, não anónimas, e tendo por objecto a Canção de Coimbra. O sucesso das respostas dependerá muito da informação existente nos arquivos particulares dos colaboradores do Blog, podendo em determinadas situações alargar-se aos campos das Tradições Académicas de Coimbra e etnografia e folclore de Coimbra.
Nota: se a Cinemateca Portuguesa respondeu prontamente ao nosso pedido, da parte da Lusomundo Audiovisuais, a reacção foi exasperante e inconclusiva. Entre as confusões dos serviços informativos telefónicos, a mudança de nome, a alteração do endereço, a confusão com empresas de venda de bilhetes de cinema, o passar de chamadas entre secções, a remissão para o "nosso site" que não está acessível, tudo redundou no mais inqualificável fracasso. A edição de "As Pupilas do Senhor Reitor" em cassete vídeo pela Lusomundo deve ter ocorrido na década de 1990, a fazer fé noutros filmes saídos por esses anos (Camões, em 1991; Capas Negras, em 1993; Inês de Castro, em 1997).


Cantadores ambulantes, 1888 Posted by Picasa
Gravura de Manuel de Macedo (1846-1915), certamente delineada a partir de fotografia, cujo tema versa os cegos cantadores ambulantes da década de 1880. O conjunto é formado pelo cego tocador de rabeca, pelo cego e cantor tocador de viola de arame e pelo moço de pedir. A imagem publicada no "Álbum de Costumes Portugueses", Lisboa, David Corazzi, 1888, trazia um magnífico texto assinado pelo jornalista e homem de letras Júlio César Machado (1835-1890). Machado regista preciosas informações sobre as deambulações, comportamentos e repertórios dos multitudinários grupos de ceguinhos mendigos que calcorreavam o país com cantorias lamentosas. Machado não distingue poisos, citando circuitos urbanos e rurais, com paragem obrigatória na Nazaré. Os locais de exibição mais frequentes eram tabernas, feiras, arraiais, romarias e portas de senhoras respeitáveis que condoídas não fechavam os cordões às bolsas. A principal cantoria destes ceguinhos era o fado narrativo em décimas, cujos textos contavam os mais sanguinários dramas de faca e de alguidar.
Não se consegue perceber como é que esta espantosa crónica de Júlio César Machado escapou aos primeiros estudiosos do Fado, particularmente Ernesto Vieira, João Pinto de Carvalho e Alberto Pimentel. Em 1888 o jornalista Júlio César Machado informa que o Fado é conhecido em praticamente todo o país rural e urbano, mais não seja devido às frequentes deambulações/actuações dos cegos cantadores. Nos anos seguintes, os três conceituados nomes da cultura portuguesa supra-citados centralizam a questão da emergência e prática do Fado em Lisboa. Concedem que também se pratica em Coimbra, na comunidade estudantil, para tanto urdindo a fantasiosa patranha da transmigração operada pelos estudantes. Isto dito e escrito com toda a seriedade, já depois de Alexandre Herculano ter desmistificado o "Milagre de Ourique" enquanto fábula das origens do Reino de Portugal. O enorme atraso da etmomusicologia portuguesa de então ajudará a perceber que fossem ignorados (ou silenciados?) os reais mecanismos de circulação/divulgação como prostitutas, soldados, seminaristas, cegos cantadores ambulantes, companhias ambulantes de teatro, tunas rurais e urbanas, casas de edição de partituras, regentes de filarmónicas, tunas, corais e orquestras, damas burguesas que tinham piano de sala, professores de música dos liceus e seminários, estudantes liceais, e naturalmente estudantes da UC. Outro poderoso argumento documental que nos ajuda a desmistificar a peta do estudante de Coimbra que levou o Fado de Lisboa para Coimbra é a monumental edição do "Cancioneiro de Muzicas Populares", publicado no Porto, na década de 1890, pelo professor de música e executante de Guitarra do Porto César das Neves (1841-1920). Quase todos os fados ali transladados também eram conhecidos noutras localidades que não apenas Lisboa, conforme assinalam em fim de página os colaboradores da recolha. Por exemplo, o "Fado Robles" (=Artilheiro) foi composto no Quartel Militar de Évora e popularizado no Porto, pois o seu autor residiu vários anos naquela cidade, tendo mesmo tomado parte activa na Revolta do 31 de Janeiro. O "Fado Serenata do Hylario", presente nesse cancioneiro, não foi recolhido em Coimbra mas sim em Penafiel. O "Fado Póstumo do Hylario" era cantado em Braga por um rapaz cego. E se o "cancioneiro de César das Neves" se vendia aos coleccionadores em fascículos, o que dizer de duas outras colecções que vieram a lume com escassos anos de distância, de enorme sucesso, concretamente as séries de fados da Sassetti ("Cantos populares. 36 fados", Lisboa) e da casa Eduardo da Fonseca ("Cantos populares", Porto)? Só a 1ª série da casa Eduardo da Fonseca, com 12 fados, ao preço de 500 reis, atingiu pelo menos a 7ª edição antes de 1904. E não se diga que após tanto trabalho a harmonizar para piano todas essas partituras, elas se venderiam a quem não sabia ler música!
E mais se não diz sobre caminhos que não são seguramente os nossos. Vale a pena espreitar nesta litografia a viola de arame, cuja configuração tanto nos pode conduzir a modelos mais antigos da Viola Chuleira (=Braguesa=Ramaldeira), com a construções baratas da Viola Toeira.
AMNunes


Estudante Posted by Picasa
Desenho de autor não identificado, representando um aluno da UC, de acordo com informações relativas à década de 1850. Trabalho possivelmente inspirado em fotografia coeva, mostrando a Volta Branca Eclesiástica, a Batina clerical, calções pretos pelo joelho, meias altas e sapato raso, gorro pendente e capa. O pintor aposta no reforço visual de elementos considerados subversivos pela disciplina reitoral, como o bigode não aparado, o cigarro, a bainha da Batina alteada e a Capa algo esburacada. Numa das mãos sobressai a pasta cartonada a verde com os respectivos atilhos, cor da extinta Faculdade de Cânones. Este modelo de pasta com fitas, considerado símbolo dos quintanistas da UC não foi um costume inventado pelos estudantes. Pastas com este mesmo figurino, em tela revestida a seda bordada, ou em couro lavrado, eram regularmente utilizadas pelo menos desde o século XVII, a título de porta-documentos e arquivo de documentos, nas várias secretarias de Estado, na burocracia dos paços espiscopais, nos escritórios de casas senhorais, nas secções administrativas das câmaras municipais e nos serviços burocráticos reitorais dos seminários católicos e UC. O que os estudantes da UC fizeram foi aclimatar às suas vivências e necessidades simbólicas um modelo de pasta pré-existente, ao qual foram aplicadas as diversas cores oficiais das Faculdades. A litografia vinha acompanhada por um texto de Ramalho Ortigão, onde, para além do saboroso e mordaz palavreado, o cronista se mostrava estranhamente avesso às grandes transformações laicizantes operadas na Capa e Batina entre as décadas de 1860-1880.
Imagem: litografia editada no "Álbum de Costumes Portugueses", Lisboa, David Corazzi, 1888; 2ª edição pela Perspectivas & Realidades, Lisboa, 1987
AMNunes


Mestre Miguel Pimentel Posted by Picasa
Miguel de Braga Pimentel nasceu na Freguesia da Maia, Ilha de São Miguel, em 1940. Começou a aprender a arte da Viola da Terra aos 7 anos com seu pai Manuel Moniz Pimentel. Em 1964 ingressou nos quadros da Polícia de Segurança Pública. A partir de 1982 ministrou regularmente no Conservatório de Ponta Delgada cursos de Viola da Terra. Tem discos gravados com a cantora e estudiosa Maria Antónia Esteves, sendo de referir os LPs "Mangericão da Serra" (1984), "Canto do Prisioneiro" (1988) e o CD "Maria Antónia Esteves. Com este rosto ao vento" (2005). Fundou e actuou durante anos com a formação Grupo Micaelense de Violas da Terra. Além de tocador e estudioso da música tradicional regional, Miguel Pimentel tem-se dedicado à arte da violaria.
Aquando do último contacto telefónico, Miguel Pimentel informou-me que de quando em vez interpreta versões instrumentais de "baladas de Coimbra" na sua viola. Num desejável 1º encontro de tocadores de Viola Toeira (para quando?) teria todo o interesse trazer a Coimbra Miguel Pimentel, solicitando-lhe colaboração para acções de formação e fazendo-o gravar algumas dessas "baladas".
Eis um virtuoso cuja obra merece mais larga divulgação. Aliás, figurou nas recolhas de José Alberto Sardinha vazadas na antologia sonora do Jornal de Notícias (1997) e em 2005 num programa transmitido aos domingos de manhã pela RTP1 (coordenação de Manuel Rocha).
Imagem: fotografia com Miguel Pimentel e Emanuel Medeiros (violão) tirada no claustro do Museu Carlos Machado, Ponta Delgada, incorporada no livreto do Cd "Sons d'Outrora" (1997)
AMNunes


Sons d'Outrora Posted by Picasa
Verso do CD "Sons d'Outrora", Ponta Delgada, DISREGO, DRD-00-06, ano de 1997, contendo 20 peças instrumentais soladas na Viola da Terra por Mestre Miguel Pimentel, com acompanhamento de violão por Emanuel Medeiros.
Para quem efectivamente se interessa pela Música Tradicional Portuguesa e, no caso da História da Canção de Coimbra procura ir mais longe, cotejando aquele género artístico com diversas produções culturais, estamos confrontados com um disco do mais elevado quilate. Miguel Pimentel trabalha nesta recolha peças que na meninice escutou a seu pai (notável tocador micaelense presente nas recolhas de Artur Santos), acrescentando-lhe outras que recolheu na parte norte da Ilha de São Miguel (Maia). Executando simultaneamente melodia e harmonia, com recurso à afinação Ré/Si/Sol/Lá/Mi, Mestre Pimentel interpreta variações sobre modas tradicionais de dança popular como os bailes do Sapateia, Pézinho Velho, Chamarrita Valseada, Saudade, Bela Aurora e Tanchão. Mas também interpreta o Fado da Mouraria e o Fado da Bela Aurora (=Fado Corrido) com variações complexas, em nada inferiores aos desempenhos dos virtuosos da Guitarra de Fado. Quem quiser reconstituir uma imagem aproximada daquilo que se fazia em Coimbra na época de José Dória com a Viola Toeira deve passar obrigatoriamente por estes "sons d'outrora". O timbre da Viola da Terra é belíssimo e o intérprete domina as mais sofisticadas técnicas de digitação, laborando no essencial com a unha do polegar.
Agradecimento: uma palavra de apreço a Mestre Pimentel pela amável oferta de um exemplar do disco
AMNunes

sábado, fevereiro 04, 2006

Bloco de Notas 24

1987 ... Em 12 de Fevereiro, novamente espectáculo no Teatro S. Luís, a favor dos refugiados de Timor-Leste, com António Bernardino e Durval Moreirinhas. A 30 de Janeiro tinha actuado para o GSAL, com Berna, Machado Soares, Durval e António Sérgio (Sérgio Azevedo, agora), tendo-se seguido Vitorino e um grupo da Nicarágua.
23 de Fevereiro – Morreu José Afonso, às três horas da manhã. Embora este desfecho fosse esperado a qualquer instante, cobriu toda a gente de tristeza. O país está de luto. Pensamento positivo: perdeu-se o Homem; ficou a sua música e a poesia.
O funeral realizou-se em Setúbal, com dezenas de milhares de pessoas a acompanhá-lo. A minha emoção aumentou ao ver tanta gente condoída, olhos lacrimejantes, no derradeiro adeus a este lutador que, mesmo sabendo da sua trágica sorte, nunca deixou de lutar. Até sempre Zeca!
Há no bloco de notas referências a várias actuações. Não as vou enumerar, pois seria fastidioso.
Encontro agora uma nota dizendo que comecei a gravar um disco, no dia 2 de Abril, a pedido da Secretaria da Emigração. Gravámos seis números, das 19 às 22 horas, no estúdio de Jorge Costa Pinto, em Belém, Lisboa. Armando Marta gravou “Amigo”, de José Afonso; Arménio Santos, “Feiticeira” de Ângelo Araújo e “Minha Mãe”, de José Afonso; António Bernardino, “Balada Açoreana” de José Afonso e “Sou Barco” de Borges Coelho e Luís Cília, com um interessante arranjo em guitarra. O conjunto instrumental, constituído por mim e António Sérgio nas guitarras, e Durval Moreirinhas na viola, interpretou “Valsa de Outros Tempos” de Gonçalo e Artur Paredes. Realço aqui o acompanhamento inovador e arrojado da guitarra de acompanhamento, efectuado pelo meu filho António Sérgio. Muita gente vai ficar chocada, mas com o tempo aprenderão a sentir a beleza de tal arranjo.
Faço aqui um parêntesis para dizer que não encontrei no Bloco de notas referência aos outros seis números gravados, apenas a data de gravação, nem sequer uma nota sobre o facto de nunca o disco ter vindo a público. Neste Blog, esta parte já foi referida, Quanto aos números gravados, foram eles: António Bernardino, “Cantar de Emigração”, de Rosalia de Castro e José Niza; Armando Marta, “Canção de Fornos”, com música de Francisco Menano e letra popular, e “Marofa”, de sua autoria; Arménio Santos, “Trago a minha vida presa”. Os outros dois instrumentais foram “Bailados do Minho” de Antero da Veiga e “Sede” de Carlos Paredes.
Seguem-se actuações no Grémio Literário, em Lisboa; Faro no Teatro Lethes, com João Gomes à viola, além dos habituais; Gavião – Casa Branca, na casa da secretária do Reitor da Universidade de Lisboa, Meira Soares. Encontrava-se lá também o Ministro da Educação João de Deus Pinheiro, que cantou Fado de Lisboa, acompanhado por mim e pelo Durval.
Segue-se agora uma breve referência, sem data, a uma ida a França, com Arménio Santos, António Bernardino e Durval Moreirinhas.
Foram tantas as viagens a este país que até me esqueci de apontar pormenores.
A 27 de Abril, Luiz Goes, João Gomes e Durval Moreirinhas estiveram na minha casa em Almada, a ensaiar. Não refiro para quê. Talvez uma futura ida à Revigrés.
A 28 de Maio, novamente no Pátio Alfacinha, com a Secretária de Estado da Emigração, Manuela Aguiar, acompanhada por uns americanos. Foram comigo, António Sérgio à guitarra e Durval Moreirinhas à viola. Cantaram Armando Marta e António Bernardino. Fomos muito apreciados.
A 2 e 3 de Maio, sábado e domingo, fui a Coimbra ao Centenário da Associação Académica de Coimbra. No sábado de tarde houve reunião de todos os intervenientes da Canção Coimbrã, em que cada um tocou ou cantou qualquer coisa. À noite houve serenata na Via Latina. No dia seguinte tocou-se para o Reitor Rui Alarcão, Vice-Reitor Jorge Veiga e o embaixador de Cabo Verde. Acompanhei Jorge Cravo, juntamente com António Moreira, na canção “Saudades de Coimbra”.
A 4 de Maio das 21 às 24 horas, gravei, juntamente com Durval Moreirinhas e António Sérgio, cinco números com Frederico Vinagre: “Ansiedade”, “Fado Triste”, “Canção das Lágrimas”, “Minha Mãe” e “O Sol anda lá no Céu”.
Mais uma actuação numa Casa de Fados, a Tágide, com Machado Soares e Durval Moreirinhas. Encontrei lá Fernando Alvim e o meu companheiro de tropa, Torre do Valle.
Mais um ensaio com Luiz Goes, na sua casa, em Cascais. Agora já tenho a certeza que é para ir actuar à Revigrés, em Águeda.
De facto lá fomos a Águeda, no dia 12 de Maio, eu, João Gomes e Durval Moreirinhas para os acompanhamentos. A segunda parte do espectáculo foi preenchida com Amália Rodrigues. Encontrei lá o Horta e Silva que tocava viola com os irmãos Nazaré.
Luiz Goes cantou: ”Saudades de Coimbra”, “Fado dos Cegos”, “Fado da Despedida”, “Amélia”, “Serra d’Arga”, “Samaritana”, “Viagem de Acaso”, “Dissonâncias”, “É Preciso Acreditar” e “Cantiga para quem Sonha”. Tocámos “Valsa de Outros Tempos” e “Bailados do Minho”. Estavam 2000 pessoas na sala.
O disco “Ecos da Canção Coimbrã” que gravei com José Mesquita, saíu no princípio de Maio.
Em 1 e 2 de Junho, novamente em estúdio com Frederico Vinagre.
A 5 deste mesmo mês acabei a gravação para a Secretaria da Emigração.
A 7 de Junho parti para os Estados Unidos com António Sérgio à viola e Frederico Vinagre a cantar. Regressámos a 15. Fomos a Cambridge, New Bedford, Boston, etc. Encontrámos Rosa Mota num dos espectáculos em Boston.
A 28 de Junho fui ao Castelo de S. Jorge com José Amaral à guitarra e Carlos Figueiredo à viola. Actuámos na Sala Ogival. Estava lá Laborinho Lúcio que fez uma prelecção que deixou todo o pessoal encantado.
A mistura do disco para a Emigração começou a 3 de Julho. No dia seguinte fui a Castelo de Vide com Machado Soares e António Bernardino, a 10 à Mobil, em Lisboa, com Marta, Berna e Durval, 22 a Cascais com Carlos Figueiredo, 9 de Agosto Oliveira do Hospital e a partir de 14 de Agosto, a habitual tournée algarvia: Vila do Bispo, Tavira e Lagos.


Boston, Estados Unidos da América, em 1987: Octávio Sérgio, Frederico Vinagre, Rosa Mota e António Sérgio Posted by Picasa


A Viola Toeira Posted by Picasa
Exemplar fabricado em Coimbra nos inícios do século XX por Augusto Nunes dos Santos, vendido a um tocador popular de Arganil. Fotografia extraída de José Alberto Sardinha, "Viola Campaniça", 2001, pág. 150. Confirma-se uma vez mais a profusa venda de cordofones fabricados em Coimbra pelas feiras dos concelhos circunvizinhos, como Montemor, Arganil, Mortágua, Mealhada, Cantanhede, Penacova, Miranda. De reparar na pouco usual escala traçada (prolongamento de 4 trastos sobre a caixa, também fabricada por Raul Simões) e a insólita aplicação da chapa de guitarra com voluta floral grosseira. Tal pormenor suscita-nos ponderosas dúvidas. Será fabrico de origem? Ou trata-se de um acrescento feito localmente (em Arganil)? Os tambores das tarrachas parecem ser da 1ª metade do século XX. Estas dúvidas justificam-se. Nas ilhas do Faial, Pico e Graciosa, continuando o uso da Viola da Terra com pá de madeira, começaram a surgir nas décadas de 1940 e de 1950 aplicações de cabeça de guitarra para evitar desafinações nas tocatas dos ranchos folclóricos. Cheguei mesmo a ver uma dessas violas, reformada na década de 1950. O braço fora serrado logo abaixo da antiga pá, com aplicação da prótese (cabeça de guitarra).
Da mesma forma que acho a aplicação da cabeça de guitarra na Viola da Terra (com chapa e voluta de caracol) uma violenta violação estética, também não aprecio o encaixe da cabeça de guitarra na Viola Toeira. A última é um cordofone de estrema delicadeza e graciosidade, que tira grande parte do seu impacto visual da singular pá de madeira com cravelhas. Há na actualidade sistemas de afinação eficazes e modernos, perfeitamente aplicáveis sem necessidade de optar pelas cabeças de guitarra, ou ainda pior, de violão.
Esperemos que a Viola Toeira, um dos símbolos de Coimbra e da Beira Litoral, venha a merecer as devidas atenções em termos de salvaguarda. Pelo sim pelo não, sublinhemos que se a Guitarra de Coimbra tem sido ensinada no Conservatório de Coimbra e no Conservatório do Porto, a Viola da Terra integra o leque de opções dos alunos do Conservatório de Angra do Heroísmo e Ponta Delgada desde os alvores da década de 1980. Tendo este cordofone em Fernando Meireles o seu mais completo e fiável construtor, não se vê qualquer razão para o esquecimento a que tem sido votada esta viola regional. Além do mais, não vale a pena continuar a fingir que a História da Canção de Coimbra não passou por ela.
AMNunes


Viola Campaniça Posted by Picasa
"Viola Campaniça. O outro Alentejo", Vila Verde, Tradisom, 2001, eis mais uma execpcional e ímpar monografia assinada por José Alberto Sardinha, feita sair em colaboração com o seu inseparável editor José Moças. A investigação distribui-se por 206 páginas de textos, anotações, bibliografia, completando-se com 2 cds de recolhas ao vivo. Esta obra constitui uma espécie de corolário do LP "Viola Campaniça", Contradança, LP 86-02, ano de 1986, com 17 faixas sonoras. Os trabalhos de recolha e divulgação da Viola Campaniça originaram um importante movimento de salvaguarda deste cordofone tradicional que, ameaçado de extinção, não tem parado de conquistar apaixonados. Pena é que o referido LP tenha sido indecorosamente contrafeito por mercenário editor francês apostado em ganhar dinheiro fácil.
Agradeço a José Alberto Sardinha a amável oferta de um exemplar do seu livro. Quem nos dera que fizesse outrotanto pela Viola Toeira.
AMNunes


Guitarra de Peres de Vasconcelos Posted by Picasa
Guitarra Toeira de Coimbra, com escala de 17 trastos ligeiramente abaulada, voluta oval clássica, decoração austera, ilharga baixa (6 cms ao atadilho, 5 cms ao cepo), proveniente da oficina do violeiro Raul Simões. Cordofone tipicamente anos 20. Facto insólito, apresenta dois cavaletes.
Miguel A. Peres de Vasconcelos, antigo estudante da UC e executante de guitarra, demora um ilustre desconhecido. Após a conclusão do curso dedicou-se ao ensino liceal, tendo desempenhado o cargo de Reitor no Liceu de Viseu (inícios da década de 1930), Liceu de Lourenço Marques e Liceu de Guimarães (?).
No final da década de 1920 (ano de 1928) gravou discos para a editora Columbia, estando inventariados:
-Variações em Dó Sustenido Menor, de Peres de Vasconcelos. Solo de guitarra por P. de Vasconcelos, Columbia J 858 P 330;
-Variações em Lá Menor (referido como popular), Columbia J 858 P 229;
-Variações Sobre o Fado em Ré Menor, Columbia J 829 P 297;
-Variações em Fá Menor, Columbia J 829 P 298.
Em modo de comentário acrescentaria os seguintes dados: não deixou de constituir uma boa surpresa encontrar a guitarra de Peres de Vasconcelos depositada no Museu Académico; as primeiras duas composições, prensadas no primeiro dos discos indicados, eram conhecidas e tocadas por António Carvalhal, executante que as ensinou a José Maria Amaral; tive o ensejo de escutar as duas faixas do disco que pertenceu a António Carvalhal. Peres de Vasconcelos pareceu-me um executante acentuadamente arcaico, quando confrontado com outros tocadores da década de 1920; não está identificado o tocador de violão de cordas de aço que gravou com Peres de Vasconcelos.
Imagem: guitarra depositada no Museu Académico
Agradecimentos: Doutor Armando Luís de Carvalho Homem, Dr. Artur Ribeiro (Museu Académico), Dra. Mariberta Carvalhal, Dr. José Maria Amaral, José Moças (Tradisom)
AMNunes


Queima das Fitas em Lourenço Marques 1966Posted by Picasa
Exótico cartaz da Queima das Fitas promovida pela Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra em Lourenço Marques, no mês de Maio de 1966.
Desta cidade terá José Vitorino Santana trazido para o seio dos cultores portuenses da CC um tema muito pimba, intitulado "Fui Moço fui Rapaz", tema esse já gravado num disco de Tavares Fortuna, sem que até hoje tenha dele colhido notícias em recolhas junto de cultores activos em Coimbra.
Imagem: cartaz do Museu Académico
Agradecimento: Doutor Armando Luís de Carvalho Homem
AMNunes


Queima das Fitas em Lourenço Marques 1965 Posted by Picasa
Cartaz de publicidade à realização da Queima das Fitas pela Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra em Lourenço Marques, Moçambique, em 15, 23 e 25 de Maio de 1965. O cartaz, numa tiragem de 150 exemplares, anuncia um baile de gala, um rally, uma garraiada e uma Serenata Monumental nas escadarias dos Paços do Concelho. Vários foram os antigos estudantes que tomaram parte nestas serenatas, uns na década de 60, outros já entrados os anos 70, como António de Almeida Santos, Jorge Gouveia, António Bernardino, Gabriel de Castro, Alfredo Caseiro da Rocha e António José Roxo Leão. No caso de António Bernardino, a sua passagem por Moçambique ocorreu já depois de finais de 1969, pois nessa data estava no Quartel Militar de Santa Clara de Coimbra, tendo então gravado o LP "Flores Para Coimbra". Em 1961, António Brojo foi a Lourenço Marques em missão universitária, tendo gravado um ep com alguns dos antigos cultores ali residentes.
Imagem: cartaz da colecção do Museu Académico
AMNunes


"Fados com Açúcar" Posted by Picasa
Parece o título de uma telenovela mexicana de faca e de alguidar, mas não é! Como diria Isabel de Aragão a seu desconfiado esposo, "são saquetas de açúcar real senhor". Entre 21 de Maio de 2004 e 17 de Setembro de 2004 o jornal PÚBLICO editou às sextas-feiras uma luxuosa colecção de cds dedicada às celebrações dos "100 anos das primeiras gravações de discos de fado".
Até aqui nada de anormal que pudesse sobressaltar a morna historiografia. Cem anos não se celebram todos os dias. Daí a xaroposa doçura!
Pelo alinhamento anunciado em grandes parangonas publicitárias no título "O Fado do Público. Tudo isto existe, tudo isto é Público, tudo isto é Fado", em jornal PÚBLICO , de 21 de Maio de 2004, págs. 50-51, ficámos a saber que os cds nº 7 ("Fados e Baladas de Coimbra", edição a 2/07/2004) e nº 8 ("O Amigo Paredes", 9/07/2004) também integravam a colecção.
Estudada a proposta de alinhamento, ouvidos os discos, algumas perplexidades se nos assaltam. Confundido e não esclarecido, além de monumental golpe publicitário e de formidável proeza contemporânea portuguesa digna de suceder ao "Édito de Milão", perguntamos:
1 - Se em 2004 já se sabia de fonte segura que as primeiras gravações discográficas de Fado tinham ocorrido não em 1904 mas sim em 1902 no Brasil, quais os motivos que autorizaram a sustentação do embuste (e não vamos sequer perder tempo com as gravações em cilindro Edison feitas na década de 1890, pois essas são rolos e não discos!)?
2 - Se na década de 1990, a Heritage e a Tradisom já tinham lançado remasterizações de fados antigos, porque motivo só no cd 1 ("100 anos de Fado", de 21/05/2004), ocorrem algumas dessas gravações da década de 1920, num claro recuo histórico-sonoro?
3 - Se a colecção pretendia evocar primacialmente as composições antigas, como entender que das largas dezenas de fados oitocentistas impressos em fascículos de quiosque e cancioneiros, nenhum tenha sido dado a reconstituir a grupos organizados para o efeito? Se nada sabíamos dos fados primitivos oitocentistas, nada continuamos a saber. Bom, até nem será bem assim, pois o Rancho Folclórico do Porto gravou em Julho de 2000 um cd com significativa amostra de fados oitocentistas (Cf. "Fado do Porto recuperado pelo Rancho Folclórico do Porto", Porto, Fortes & Rangel, DCD 1051, ano de 2000). A comissão organizadora da colecção do Público desconhecia o referido disco, ou preferiu ignorá-lo?
4 - Não é de aceitar passiva e pacificamente a total e descarada omissão monocultural facultada pela amostragem proposta, quando o passado do Fado aponta de forma clara e inequívoca para o pluralismo de desempenhos. Por outras palavras, fenecem a esta colecção os Fados Coreográficos recolhidos e ainda hoje dançados pelos grupos folclóricos do Ribatejo, Estremadura, Beira Litoral e Açores; faltam os fados tocados pelos bandolins e acordeons; faltam os fados solados na Viola da Terra (Açores), na Viola Toeira (Coimbra) e na Viola Braguesa (Douro Litoral e Minho). Tais amostragens não são ficção: existem em recolhas musicais impressas e em recolhas sonoras de homens como Artur Santos e José alberto Sardinha.
5 - o cd nº 13 ("Fados do Porto", 13/08/2004), pretendendo centralizar a questão do Fado em Lisboa, comete uma autêntica falsificação da História ao negar a prática activa do Fado na cidade do Porto. Não é de todo verdade que o Fado não se tenha cultivado intensamente nas tascas, salões, cafés e restaurantes portuenses desde os alvores do século XIX. Não só se praticou, como se mantiveram em actividade artistas e formações com produções artísticas locais e inúmeros discos gravados. Se alguns fadistas oriundos do Porto se transferiram para Lisboa, muitos outros desenvolveram toda a sua actividade no Porto, mantendo contactos com a comunidade lisboeta. Compreende-se a necessidade ideológica de centralizar a questão do Fado em Lisboa. Ela é comparável ao insolúvel combate pelo impossível achamento da "verdadeira capital da chanfana". 2004 foi o ano da formulação larvar da candidatura patrimonial do Fado à Unesco. Mas uma candidatura não legitima fazer o mesmo que aqueles directores de ranchos folclóricos que, marcados pelo bairrismo exaltado, inventaram supostas abissais diferenças de viras e chulas entre a terra A e o local B. Por vezes, as invocadas diferenças eram apenas uma fala peculiar do mandador! Era o que acontecia na Mealhada, onde num povoado o mandador do Vira dava falas de "vira, vira" e noutro povoado se dizia "passa, passa".
6 - Muito dificilmente se poderá aceitar a inclusão da matéria do cd nº 7 ("Fados e Baladas de Coimbra", 2/07/2004) na referida colecção. Nenhuma das composições alinhadas ilustra cronologicamente o período oitocentista costumeiramente invocado como sendo o tempo das ligações entre Fado (de Lisboa) e Canção de Coimbra. As 12 faixas seleccionadas são todas cronologicamente posteriores a essa tão invocada ligação. Ora, se o objectivo da inclusão dessas faixas sonoras, como se disse, posteriores ao "tempo do fado", não serve para ilustrar a reclamada ligação umbilical, para que serve afinal o disco nº 7? Para reafirmar, uma vez mais, que quem diz a suposta "Estória do Chamado Fado de Coimbra" é o Fado de Lisboa? Por outro lado, se quisermos ser muito rigorosos, Coro dos Caídos, de José Afonso serve para documentar exactamente que movimento artístico neste disco? O único tema que pode servir de exemplificação a alguma proximidade entre os dois géneros artísticos é Fado Hylario Moderno, mais pela parte final em corrido menor, do que propriamente pela primeira parte. Os desenhos de Fernando Guerreiro mostram supostos estudantes em figurino de casas de fados, com guitarra de Lisboa. É a eterna sombra do filme "Capas Negras" com a fraude "Avril au Portugal", piedosamente tomada por tema universal da Canção de Coimbra. Aqui sim, estamos verdadeiramente confrontados com o tal espírito mexicano dos "fados com açúcar". Quanto ao cd nº 8 ("O Amigo Paredes", de 8/07/2004), mais aumentam as perplexidades. Em Coimbra jamais se chamaria o "Paredes" a Carlos Paredes, pois O PAREDES é Artur Paredes. Carlos Paredes numa colecção de fados? Mas Carlos Paredes nunca cultivou o Fado de Lisboa, como também não pretendeu confundir-se com a imagem do cultor da Canção de Coimbra tout court. Qual o critério? Integrou-se Carlos Paredes porque CP era um tocador de guitarra e a guitarra simboliza o Fado? Ou integrou-se CP porque os cultores do Fado se querem apropriar da herança de CP?
7 - Do pouco que me é dado conhecer da História da Canção de Coimbra (asseguro que não se trata de um brinde saído no pacote da farinha), ser-me-ia grato, razoável e avisado ver nesta colecção um cd intitulável "Amostra de Fados que se cantaram em Coimbra". Em 2004, data da preparação e comercialização deste projecto, já estava disponível uma lista de fados e de canções fadográficas que comprovadamente se cantaram em Coimbra. Além do arrolamento, era ainda possível disponibilizar a qualquer equipa de estudo/reconstituição fontes documentais (sonoras e impressas) com fados cantáveis e coreográficos. Os coordenadores do projecto não solicitaram este intercâmbio porque desconheciam pura e simplesmente a sua existência documental, ou porque estavam apostados em perpetuar unicamente a vulgata? A confirmar-se a 2ª hipótese, as consequências mediáticas de uma tal decisão são culturalmente gravíssimas. Vejamos, no plano da história comparada, tais atitudes irresponsáveis, correspondem à imposição da história branca dos EUA, com violento branquamento da ancestralidade da história dos povos índios anteriores a Colombo, à glorificação da gesta dos cowboys e ao triste confinamento dos índios em parques turísticos onde dançam com penachos aos domingos para os visitantes fotografarem!
Terminada esta espécie de novela adocicada, cujos folhetins agitaram jornais, deram origem a saquetas de açúcar e a canecas de louça distribuídas em pacotes de café Delta, a Canção de Coimbra viu-se respeitada na sua autonomia cultural e na sua individualidade artístico-patrimonial?
Como diria, Cunhal, "olhe que não, olhe que não..." . Quando a doçura é grande, o santo desconfia!
Post scriptum: agradeço ao Estimado Amigo e Ilustre Investigador Armando Luís de Carvalho Homem as oportunas palavras de corroboração a esta crónica que estava para sair havia pelo menos dois anos. Propositadamente não escrevi uma única palavra sobre os textos de Raul Vieira Nery, então publicados em fascículos ao longo dos vários discos. Entendendo que só tinha de me pronunciar, neste particular, em matéria de Canção de Coimbra, escrevi em finais de 2004 uma longa carta particular ao etnomusicólgo Dr. José Alberto Sardinha, carta essa onde expunha a minha indignação e profunda estranheza perante uma investigação que em 100 anos não se renovou, mais acrescentando que os invocados elos de ligação entre Fado e Canção de Coimbra jamais se comprovariam apenas com exemplificação de duas composições ("Fado de Coimbra" e "Fado dos Estudantes Açorianos!") estróficas. A verdade é que o monumental projecto foi do agrado de certos clercs, pois um Eduardo Prado Coelho não lhe poupou elogios. Em terra de cego quem tem olho é rei, lá diz o vulgo.
AMNunes

quinta-feira, fevereiro 02, 2006


O "Orfeon Académico de Coimbra", em 1917-18. Anúncio de dois espectáculos de beneficência em Lisboa. Era maestro, na altura, Elias d'Aguiar, com foto a meio da página (5). Vê-se ainda, com o nº 11, António Menano.
"Ilustração Portuguesa", II serie - Nº 636, de 29 de Abril de 1918.
Espólio de Joaquim Pinho. Posted by Picasa


"Rapazes, não canteis o Fado!". É assim que termina este artigo de Manuel da Silva Gaio, filho do célebre escritor viseense, Silva Gaio. Vale a pena uma leitura atenta deste artigo - uma exortação patriótica - escrito no ano de 1918, na véspera da malfadada batalha de La Lys (9 de Abril de 1918), nos finais da I Grande Guerra Mundial. Para este senhor o Fado estava muito mal visto!
Revista "Ilustração Portugueza", II serie - Nº 636, de 29 de Abril de 1918, uma edição semanal do jornal O Seculo.
Espólio de Joaquim Pinho.
























Artigo da revista "Passatempo", revista quinzenal ilustrada, de lisboa, com data de 25 de Abril de 1901 (I ANNO - Nº 9), escrito por E. de Aguilar e fotos de Evaristo Camões. Curiosamente, fala aqui do músico José Maurício, do qual o Coro dos Antigos Orfeonistas canta uma obra recentemente descoberta, "Aleluia", com transcrição de José Travassos Cortez.
Espólio de Joaquim Pinho. Posted by Picasa

quarta-feira, fevereiro 01, 2006


Guitarras de Afonso de Sousa Posted by Picasa
Aspecto do expositor do Museu Académico dedicado ao Afonso de Sousa. Não por acaso, enquanto o inquilino de baixo é Afonso de Sousa, o inquilino da prateleira superior é Artur Paredes.
Em 1º plano vemos a primitiva Guitarra Toeira de Coimbra regularmente utilizada por Afonso de Sousa nos tempos de estudante. É um cordofone proveniente da oficina de Raul Simões, vincadamente anos 20, com a ilharga danificada. Mais atrás figura a guitarra utilizada por Afonso de Sousa entre finais da décda de 30 e os anos 40, que em Novembro de 1989 fizemos depositar no Museu Académico. Representa um estádio intermédio de evolução entre a Guitarra Toeira e a Guitarra Paredes/Grácio. Proveniente da oficina de João Pedro Grácio, com data de 1937, apresenta ainda escala de 17 pontos. As principais modificações observam-se ao nível do tratamento da voluta e da ilharga. A voluta passou do oval clássico a lágrima em aresta agressiva, ainda afastada da fixação operada a partir de 1940. A ilharga sofreu alteamento bem visível, mostrando-se bastante próxima da altimetria que viria a popularizar-se na década de 1940. Esta 2ª guitarra de Afonso de Sousa constitui um documento organológico da maior importância para o estudo da evolução da Guitarra de Coimbra. Não podemos deixar de invocar o espanto do candidato a guitarrista Vergílio Ferreira, quando em Março de 1939 foi tocar violino com a TAUC à Casa das Beiras, Lisboa, na Quinzena dos Estudantes de Coimbra em Lisboa. Vergílio sentiu-se duplamente desvastado com a actuação de Artur Paredes/Carlos Paredes/Afonso de Sousa. De acordo com Vergílio, em Coimbra ninguém tocava guitarra daquela maneira, e além do mais, Artur Paredes dedilhava uma "guitarra enorme, os tampos à distância de um quilómetro".
Em 2006 corre o 1º centenário do nascimento de Afonso de Sousa, para sempre amado 2º guitarra de Artur Paredes.
AMNunes


Partitura de "Esperança", uma canção de Coimbra da autoria de Virgílio Caseiro. São três quadras, cada uma seguida do refrão. Peça simples mas bem conseguida, com uma harmonia fugindo do tradicional. Diz Virgílio Caseiro no livro "Novas Canções para Coimbra", que esta obra é "de perfeita consonância com a tradição composicional coimbrã". Posted by Picasa


Guitarra de Artur Paredes Posted by Picasa
Guitarra Toeira de Coimbra que pertenceu a Artur Paredes. De todos os cordofones da colecção do Museu Académico é sem margem para dúvidas o mais importante: a) trata-se de uma Guitarra Toeira de Coimbra fabricada na década de 1920, possivelmente por Raul Simões, com ilharga baixa, ornamentação austera, escala longa, voluta oval sem arestas, sistema de escoramento de tampo com 2 travessas, 17 pontos; b) foi com esta guitarra que Artur Paredes gravou as suas famosas variações, canções e rapsódias em 1927; c) foi com ela que Artur Paredes fez a gravações para a voz de Edmundo Bettencourt; d) foi com ela que Afonso de Sousa gravou as suas próprias peças instrumentais em 1929.
É a todos os títulos um instrumento fundante, revolucionário, mediante o qual Artur Paredes instaurou pioneiramente o ADN da Guitarra de Coimbra. Além dos factos notabilíssimos já referidos, acrescentemos os seguintes: o instrumento foi largamente restaurado e reconstruído em 1931 por Joaquim Grácio, confirmando cronologicamente aquilo que temos insistentemente escrito sobre o assunto quanto à parceria Artur Paredes/Joaquim Grácio nas décadas de 1930-1940; por iniciativa de Afonso de Sousa, Artur Paredes ofertou esta guitarra ao Museu Académico em 1960; estando a guitarra degradada, foi restaurada por Gilberto Grácio em 1996.
Imagem: Museu Académico
AMNunes

O Renascer da Canção de Coimbra
















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Por volta do ano de 1899 a Academia de Coimbra começou a alicerçar a Queima das Fitas com a realização do "Centenário da Sebenta". Tal tradição que animaria a cidade de Coimbra ano após ano, só viria a atingir alguma regularidade a partir de 1919, depois de ultrapassada a turbulência sócio-económica motivada em grande medida pela 1ª República e 1ª Grande Guerra.
É nesta fase das décadas de 20 e 30 e 50 que a Canção de Coimbra atravessa uma época "dourada". Segue-se novamente uma fase atribulada na década de 60 em que a Academia exige, por vezes de forma mais vincada, o respeito pelos valores que defende e que o Terreiro do Paço insiste em não reconhecer. O fado e a balada tornam-se instrumentos importantes nesta luta.
Em 17 de Abril de 1969, na cerimónia inaugural do Edifício das Matemáticas, o Presidente da República de então e a sua comitiva assistem aos violentos protestos académicos. Logo a seguir, dia 18 de Abril, há Assembleia Magna e a 22 de Abril de 1969 é decretado o "Luto Académico". Desde esse dia a Canção de Coimbra não voltou ao adro da Sé Velha com timbre das guitarras e com encanto da voz dos estudantes. Era o protesto possível.
Chegámos à Velha Academia em 1977. Pelas ruas da cidade não se ouvia a sua canção romântica e de revolta.
Tinha acontecido o 25 de Abri de 1974 e no nosso entendimento já não havia motivo para não cantarmos publicamente o que nos ia na alma. A guitarra estava na posse dos mais antigos, pois 10 anos de silêncio esbatem a tradição, mas a viola estava ali sempre à mão para acompanhar uma balada do Zeca ou do Adriano se necessário fosse.
O José António Coelho Nobre (Zé Tó) o Rui Figueiredo e o Vítor Baltasar não se faziam rogados para que depois de um petisco no "Poeta" , em Cernache, ou no "Zé Manel", da Adémia, fizessem ouvir uma balada. Também o Carlos Caiado e o Tó Pedroso (este já com guitarra) iam "arranhando" uns "fadunchos" à sombra dum copo cheio de juventude. Começámos a encontrar-nos no saudoso café Moçambique embalados pelo mesmo espírito académico e com a perfeita noção de que era necessário ir mais além, e fazer ressurgir a Canção de Coimbra. O João Moura, nosso colega da Faculdade de Farmácia, tinha comprado uma guitarra e depressa se associou ao restante grupo. Com o Xico Alte da Veiga, colega de curso do Zé Tó em Medicina, estavam reunidas as condições para a convocação de ensaios periódicos no 21 da Rua Lourenço A. Azevedo. Mais tarde haveríamos de ensaiar em casa do João Moura na quinta dos Sardões. Ressurgia, assim, a Canção de Coimbra junto dos estudantes depois de 10 ou 11 anos de luto académico.
Estávamos em Janeiro de 1978 e aparecia o 1.º convite para actuar em público, nas festas de S. João de Arcozelo da Serra em Junho desse ano.




24 de Junho de 1978 – ponte granítica sobre o Mondego em Arcozelo da Serra.
Da esquerda para a direita: Carlos Caiado, João Moura, Alte da Veiga, Zé Tó e de pé o Vítor Baltasar.

Foi uma noite inesquecível com o recinto das festas cheio de gente a aplaudir os estudantes de Coimbra.
Regressados a Coimbra, foram algumas janelas das nossas colegas a abrir-se ao som dos trinados das guitarras. Era a irreverência saudável dos saudosos 20 anos.
Avizinhava-se o novo ano lectivo 78/79. Foram muitos ensaios regulares, alguns dos quais em casa do saudoso amigo e mestre ímpar da guitarra, o Professor Pinho Brojo. Também por lá, o Dr. António Portugal evidenciava muita paciência ao mostrar como se deveria tocar e cantar. Seria injusto não realçar o papel importantíssimo que o Dr. Alfredo da Gória Correia teve na orientação e estímulo aos rapazes do novo grupo percursor da Canção de Coimbra. Lembramo-nos de algumas das noitadas de ensaio, com ele cheio de juventude, na " Real República Pyn-Guyns".
2 de Junho de 1979 - serenata – semana académica. Vítor Baltasar (canta), Carlos Caiado (de pé segura uma colher de pau), Zé Tó na viola, Tó Pedroso e João Moura na guitarra.
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Chegou o dia 2 de Junho de 1979, depois de um jantar no "Lampião" na Av. Fernão de Magalhães, subiram às pálidas pedras da Sé Velha os novos e os "velhos". Tivemos direito a escolta policial. O largo estava cheio, como cheios de comoção se viam os olhares de muitos estudantes e futricas. Depois de 11 anos, voltava a ouvir-se o fado na Sé. Foi o "Vira de Coimbra" por Vítor Baltasar (na imagem) a iniciar e "Adeus Minho Encantador" por Carlos Caiado, a confirmar que era mesmo a malta nova que ali estava cheia de vontade e emoção. Hoje são tenores dos Antigos Orfeonistas de Coimbra.
Cantaram ainda Camacho Vieira, Luíz Goes, Machado Soares, António Bernardino, Almeida Santos, Fernando Rolim e outros, acompanhados pelo grupo de guitarras de João Bagão, como ilustra a foto que se segue:

2 de Junho de 1979 - – semana académica – serenata. "Oh tirana, saudade…" cantou o Luíz Goes

Apesar de tudo não eram tempos pacíficos, havia quem não concordasse e se manifestasse (algo violentamente) contra esta serenata que estava a acontecer com direito a transmissão pela RTP e Rádio Renascença.
No ano seguinte ressurgia efectivamente a Queima das Fitas em Coimbra onde também participámos. Nessa altura já com o grupo do Henrique Ferrão em que cantou o Cravo e o Tó Nogueira. Com o nosso grupo, cantou o Zé Neves (actualmente também tenor dos ANTORF), Vítor Baltasar e Luís Cartarío.




1.ª Queima das Fitas 1980 – Sé Velha – Carlos Caiado, João Moura, Nuno Silva e Zé Tó. Canta Vítor Baltasar

Foram muitos os pormenores que rodearam estes anos dourados das nossas vidas e que um dia relataremos mais em pormenor se a memória e o bom senso o permitirem.
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Vitor Baltasar

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